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quinta-feira, 7 de março de 2013

UM SINALIZADOR

Para mim não é coincidência que um sinalizador lançado por um torcedor seja também o sinalizador de uma série de coisas relacionadas à violência social, política e policial que vivemos. O fato em si é o ápice de uma série de fatores que devem ser analisados e considerados.
A primeira sinalização é de que não há nenhum resultado fruto de uma única causa. Querer reduzira morte do jovem boliviano a um sinalizador disparado por alguém é tão estúpido quanto o indivíduo que usou o artefato.
A segunda é que há uma grave falha no sistema de vigilância e policiamento na entrada e comércio de armas e outros artefatos. Um sujeito qualquer (mesmo um adolescente, se se comprovar a história da autoacusação feita) pode comprar por R$ 20,00 um sinalizador na 25 de março.
A terceira é que é fácil atravessar as fronteiras do Brasil para o exterior e vice-versa, portando artefatos que podem ser usados para matar, como foi o caso.
A quarta é que é possível entrar em estádios com artefatos perigosos, dentro de uma mochila, seja ela de um brasileiro, seja de um boliviano (porque fogos de artifício também foram usados pela torcida de Oruro).
A quinta é que, mais uma vez, se sinaliza que as torcidas organizadas estão mais para máfia que para torcida. Sabe-se há bom tempo que há alto índice de sujeitos com passado nada recomendável, dirigindo estas agremiações.
A sexta é que, ao interior das torcidas, a ascensão social e de poder se dá pelo arrojo e destemor na prática de “atos de coragem”. Os novos passam por processos e ritos de iniciação e ganham status à medida que se mostram mais valentes. Isto ficou patente no discurso do adolescente que afirma ter sido ele que atirou o sinalizador para que fosse notado pelos colegas.
A sétima é que, na tentativa de dar uma resposta à pressão popular e internacional, a polícia, a esmo, selecionou um grupo e os prendeu, sem ter conseguido, até o presente momento, comprovar a real participação deles nos eventos trágicos. Um sinalizador não pode ser disparado por duas pessoas e há dois acusados de fazê-lo.
Uma sucessão de violências.
A luta contra a violência precisa mudar e renovar o tecido da vida política. Deve criar nova identidade política, controlada e assumida pelo próprio povo, pela organização dos marginalizados e pelos organismos das classes dominantes.
O aprendizado centrado na crueldade, na violência, na tortura, leva o torturado, o que sofreu a crueldade e a violência a ter um aprendizado que vai gerando na pessoa uma agressividade e violência que ele acaba aplicando no outro, tendo ou não uma voz de comando que o leve a agir. A violência gera a violência.
A fome é tão violência quanto a tortura, a falta de moradia é tão violenta quanto a prisão arbitrária, o sinalizador lançado contra um torcedor é tão violento quanto a prisão indiscriminada e aleatória de torcedores.
A violência é uma força que fere a vida e destrói a liberdade e a dignidades humanas. Ela restringe, controla e determina comportamentos de pessoas, grupos sociais e instituições políticas e culturais.
Tanto quanto em qualquer outro período da história, a violência nos machucou. Juntemos forças para mudar esta cultura.
 Marcos Inhauser

A “ZONA” AZUL

Não acredito que eu seja o único que anda irritado com a deterioração da zona azul na cidade de Campinas. Implantado em 1995, tinha o objetivo declarado de “democratizar a utilização do solo público e facilitar a acessibilidade da população à região central do município”.
A Emdec diz que há 1950 na região central e Guanabara, ao preço de R$ 2,70 pelo cartão da Zona Azul, o que é uma ficção. Quem quiser usar a Zona Azul terá enormes dificuldades para encontrar um posto credenciado que venda o cartão de estacionamento. Quando você acha um que deveria vender porque consta como credenciado, dizem que “não vendem mais porque não compensa”. Foi o que me informou a proprietária de um estabelecimento na Costa Aguiar e que se quisesse comprar teria que fazê-lo com o flanelinha que estava na rua. Perguntei se havia algum outro local credenciado e ela me informou ‘que ninguém mais quer vender porque a Emdec exige que eles comprem uma grande quantidade de cartões, que o investimento é alto e que o lucro é mínimo”. Disse ainda que correm o risco de serem ameaçados por alguns flanelinhas que não querem perder o lucro que tem vendendo a R$ 4,00 e até R$ 5,00 cada cartão. O mesmo aconteceu esta semana na Rua Lusitana e na semana passada na Regente Feijó.
Certa feita, ao estacionar na Avenida Aquidabã, quase cruzamento com a Francisco Glicério, o flanelinha veio me oferecer o cartão, perguntei o preço e, por ser bem mais caro, disse que iria comprar em um posto credenciado (naquele tempo ainda se achavam alguns). Ele ficou bravo e disse que não se responsabilizaria se algo acontecesse ao carro. Eu disse que tinha memória fotográfica e que iria denunciá-lo se algo ocorresse.
Outra feita, fui ao centro, achei uma vaga (raridade!), estacionei e sai em busca de um ponto credenciado e voltei uns 10 minutos depois com o cartão. Perdi tempo e dinheiro: paguei o cartão e ainda levei uma multa.
Outra feita, em frente à Casa de Saúde, estacionei, a mulher queria me vender um cartão pelo dobro do preço. Disse que não e fui a uma papelaria pegar um bloco de sulfite. Quando voltei tinha sido multado e, ao sair, uma pessoa me disse que a própria mulher chamou o amarelinho para me multar.
Quando achava postos credenciados, muitas vezes comprei o talão inteiro para que não mais me acontecesse o que havia ocorrido. No entanto, uma visita de outra cidade, vai ter que ir a um estacionamento e gemer com R$ 6,00 na primeira hora e mais acréscimos por hora adicional. Ainda é mais barato que a multa de R$ 53,20.
Acabo de chegar de Jales. Lá também tem Zona Azul. Só que há funcionários do próprio sistema que vendem os cartões e o preço é de R$ 1,00! Se em uma cidade menor conseguem ao preço de R$ 1,00 manter um funcionário em cada quadra, por que na cidade de Campinas a Zona Azul é esta “zona”?
Marcos Inhauser


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

QUASE 600 ANOS DEPOIS


A última vez que um papa renunciou ao papado foi em 1415, renúncia perpetrada por Gregório XII.  A alegada razão para a renúncia (problemas de saúde e incapacidade de atender às demandas do papado) são plausíveis. No entanto, aprendi que não se deve confiar nas explicações singulares aos fatos. Não há nada que aconteça por uma única causa. Acredito que há várias outras causas subjacentes, muitas das quais ficarão no campo das especulações, pois não acredito que um dia Bento XVI virá a público revelá-las.
De minha parte tenho também o direito de especular sobre as outras razões não explicitadas.
Sabemos que a igreja (seja católica, protestante, pentecostal ou neopentecostal) atravessa período de severa crise que se deve, em parte, à insistência em manter um discurso desatualizado e que não reponde às questões da humanidade no século XXI. Novas e angustiantes questões foram e estão sendo levantadas e a igreja não tem sabido responder, e no caso específico de Bento de XVI, preferiu voltar ao passado, reafirmando que se havia dito. O mesmo ocorre com os fundamentalistas e os puritanos (na Igreja presbiteriana). Depois de Aquino e Calvino, nada de novo se disse. Deve ter havido uma pressão muito forte da ala mais arejada da igreja para que ele cedesse em questões como uso de anticoncepcionais, da camisinha, do casamento dos clérigos, etc.
Outro elemento que, a meu ver, dever ter pesado é que a igreja romana é europeia. Está na Europa, vive a Europa, tem um papa germânico. Na Europa, desde o fim da Segunda Guerra Mundial avançou o secularismo e as igrejas perderam a vitalidade e a pujança. São bispos e papa europeu os que estão a dar as diretrizes para a igreja ao redor do mundo. Onde a igreja tem mostrado vitalidade? Na África, América Latina e Ásia. Qual a voz que estes povos têm no centro do poder romano? É um secretário aqui, outro nomeado ali, mas a igreja terceiro-mundista não apita na proporção do seu vigor e pujança. Acredito que Bento XVI sentia a pressão por voz e voto por parte de bispos africanos, asiáticos e latino-americanos.
Especulo ainda que Bento XVI nunca foi unanimidade na igreja. Uma coisa é o discurso formal, o rosário de elogios que bispos fazem. Outra, bem diferente, é o que vai na alma e no coração. Converso com muitos católicos, clérigos e leigos, e nunca percebi que a eleição de Bento XVI fosse consenso. Houve quem tivesse dito que tiveram que engolir a eleição “goela abaixo”. Por suas posições quanto à Teologia da Libertação, ele tinha sérios questionamentos por parte de latino-americanos. Questionado na sua eleição, no seu posicionamento teológico (essencialmente conceitual, tratando de temas que não são pertinentes à realidade de povos da África, Ásia e América Latina) e enfrentando a luta por espaço por parte de grupos que atuam no interior da Cúria, só lhe restou a renúncia.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

AMOR MAIOR

O evangelho de João traz uma palavra de Jesus que diz: “O meu mandamento é este: amem uns aos outros como eu amo vocês. Ninguém tem mais amor pelos seus amigos do que aquele que dá a sua vida por eles”.
Diante da tragédia de Santa Maria e dos inúmeros comentários e análises já feitos, pouco ou nada a mais tenho a acrescentar, reafirmando, no entanto, que não há efeito (tragédia) produzido por uma única causa. As muitas causas já foram levantadas (projeto inadequado, superlotação, material inflamável, falta de saídas de emergência, imprudência da banda, extintores que não funcionaram, etc.).
No que pese toda a tristeza que o fato gerou, há uma coisa que merece ser destacada como positiva: as várias pessoas que, mesmo tendo conseguido sair da boate, para lá voltaram para resgatar a outras pessoas e várias delas acabaram morrendo. Deram suas vidas por amor ao próximo. Há os que foram em busca de amigos e namoradas, há os que se atiraram para salvar quem pudesse, há os que não saíram, mas ajudaram outros a sair.
O caso do soldado que salvou quatorze pessoas e não conseguiu se salvar, o caso de um dos que, à marretadas, abriu buracos na parede e inalou os gases e acabou internado em estado grave, são dignos de nota e elogios.
Se é verdade que houve quem visasse só o lucro, permitiu a multidão que superlotou a casa e não permitiu a saída imediata do pessoal porque deviam mostrar a comanda paga, é verdade muito mais evidente que houve quem se sacrificasse para salvar vidas.
Outro aspecto altamente positivo foi a solidariedade mostrada, quando centenas, talvez milhares de pessoas se dispuseram, dentro das suas forças e habilidades, a ajudar no que podiam e era preciso. É o caso do pedreiro que se voluntariou a fechar os túmulos porque não havia gente suficiente para todos os caixões que deveriam ser sepultados. Gente que fez o café para quem estava no velório, gente que abraçou, acolheu, chorou junto com os que haviam perdido familiares e amigos. Gente abanando feridos e asfixiados em plena rua, gente carregando a outros, gente que ajudou pessoas caídas a se levantar para que não fossem pisoteados, como é o caso do músico da banda. Quem o ajudou não olhou se era ele o culpado ou não.
Em um país marcado pela corrupção, impunidade e mau caráter (como os casos candidatos à Câmara e Senado, enrolados até o pescoço em denúncias várias), onde mensaleiros julgados pela opinião pública e STF reafirmam suas inocências, o exemplo deixado pelos atos de heroísmo em Santa Maria, devem nos orgulhar e enaltecer os valores do amor, mesmo que seja ele sacrificial.
Eles mostraram que o que Jesus ensinou pode ser verdade não só na vida do Mestre, mas também na vida de seus discípulos.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

DEUS POLICIAL?

No princípio acreditava em um Deus policial, que estava todo o tempo a me vigiar, atento a cada deslize que cometesse, a cada pecado que praticasse. Era um vigilante eterno, que não dormia nunca. Naquele tempo não havia câmeras nem radares a fotografar cada erro cometido e a mandar multas para casa, mas Ele era implacável: castigava de forma dura cada pecado.
Acreditava que Deus me punia cada vez que tropeçava. Se não fosse assim, por que Ele ficava me vigiando e me espreitando? Tinha a sensação de que, quando me "pegava com a mão na botija", Ele me gritava: "te peguei!". Tinha um sorriso de satisfação nos lábios, por ter-me flagrado.
Esta visão de Deus me levou a pensar que Ele tinha prazer em castigar seus filhos. Neste tempo eu usava versos bíblicos que falam da disciplina de Deus, do sofrimento, da privação, da provação. A vida espiritual era para mim o exercício do autocontrole para não tropeçar e para agüentar as conseqüências de haver tropeçado.
Cria neste Deus e ensinava isto a outros. Fazia ver e entender que a vontade de Deus é que sejamos santos, irrepreensíveis e que Ele, para nos levar a esta perfeição, nos castiga quando erramos para nos fazer sentir que o preço do pecado é maior que o preço da obediência.
Ensinava que a pessoa deve orar e ler a Bíblia todos os dias, dizimar, envolver-se nos trabalhos da igreja, que dura coisa é cair nas mãos do Deus vivo. A vida só teria significado quando a pessoa cumprisse com os requisitos da vontade de Deus. Quanto mais orasse, lesse a Bíblia, trabalhasse na igreja, mais satisfeito e feliz seria. Acreditava que devia acordar de madrugada para orar ou passar noites em vigília, porque Deus veria meu esforço e me recompensaria. Havia em mim a ideia de que poderia comprar os favores de Deus, "alcançar a graça" mediante minha dedicação e sofrimentos autoimpostos. Já que Ele se agradava em me vigiar e punir, talvez Ele também se agradasse em me ver autoflagelando.
Mas este tipo de espiritualidade era como um vício. Quando praticava tais atos, me sentia bem, mas depois de um tempo, sentia que faltava algo, que havia um vazio lá no fundo, um medo constante de não estar agradando a Deus. Lá ia eu a tomar outra dose de dedicação, oração, leitura bíblica, oferta na igreja, assistia a tantos cultos quanto possível. E isto não assegurava que não entraria de novo no "down", em uma espécie de ressaca espiritual.
Em um processo lento, gradual, dolorido porque destruía antigas convicções, fui percebendo que Deus não é policial, mas Pai/Mãe bondoso, um Deus da graça. Ele faz o que faz independentemente das circunstâncias, do que faço ou deixo de fazer. Ele não é mais Deus ou menos Deus em função da quantidade de horas que oro, da quantidade de textos bíblicos que leio ou sei de memória, do meu dízimo. Ele me abençoa porque é da Sua essência de um Deus de amor. Ele me amou quando eu era ainda um desgraçado pecador. Não foi, não é e nunca será por mérito. Ele é graça pura, ação incondicional, amor, dádiva sem que haja nada que o obrigue a isto, nem mesmo a minha consagração. Ele me ama como sou, graças a Deus!!!!!!!
Marcos Inhauser

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

HIPERETOLOGIA


Aprendi esta palavra no seminário e nunca mais a vi, nem ouvi. Já busquei em dicionários e nada. Já estava achando que me ensinaram ou que aprendi errado.
Quando já estava desistindo, encontrei um artigo que trata da doutrina da vocação (eu sabia que se tratava desta doutrina). É um artigo de George Emanuel que cita Washington P. Emrich, onde ele diz, entre outras coisas, que a palavra vem “do verbo grego “uperetês” que quer dizer servir, fazer serviço pesado, remar, trabalhar e o substantivo que significa servo, assistente, oficial subalterno. Vem também do verbo hebraico “kara” que significa chamar alguém de maneira efetiva. Em Isaias 42:6 e Is. 48:12. O vocábulo correspondente na língua grega é kalein, kaleu, que significa chamar, convocar, convidar. O substantivo que surge é klesis que quer dizer chamado, vocação, convocação.  Os dois verbos juntos ligam dois conceitos, a saber: chamado e serviço.  Não é um chamado e um serviço qualquer. É o chamado de Deus para uma vida de reconciliação com Ele e de glorificação ao Seu nome por meio do serviço prestado ao próximo. Em outras palavras: vocação é chamada de Deus ao homem para que ele se torne parte do corpo de Cristo, que é a Igreja e, em segundo lugar, para que O sirva em todas as suas relações com o próximo.” (http://www.sentidounico.com.br/v4/files/files/64/Hiperetologia.pdf ).
Fui buscar a tal palavra porque recebi um artigo que fala do mercado de pastores que se estabeleceu entre as “emprejas” (igrejas que são verdadeiras empresas) Universal do Reino de Deus Renascer, Mundial do Poder de Deus e Internacional da Graça de Deus e Assembleia de Deus Vitória em Cristo.
Resumo aqui algumas coisas do artigo: “A disputa por gente qualificada provoca atualmente uma guerra. Valdemiro Santiago, da Mundial do Poder de Deus .. tira gente dos quadros da Universal e da Internacional da Graça de Deus. Ele oferece plano de saúde, aluguel da casa e salários maiores ... O teto salarial da Mundial é de R$ 15.000. Em alguns casos, ... aumenta a remuneração fixa, concedendo de 8% a 10% da arrecadação das ofertas ao pastor. A Renascer, de Estevam e Sonia Hernandes, paga entre R$ 1.500 e R$15.000 aos membros mais graduados. Para fazer parte da ... comunidade, é preciso passar por um processo seletivo. Profissional bom, com o dom da palavra e comprometimento com o ministério, precisa ser valorizado”, defende Malafaia, o único entre os grandes líderes a expor a receita de sua igreja: segundo ele, R$ 40 milhões em 2012.” 
Segundo Malafaia, “meus discípulos ganham entre R$ 4.000 e R$ 22.000. Também banco casa e escola para os filhos”. Mais recentemente, Malafaia estabeleceu que, caso alguém de sua equipe seja aceito em qualquer curso da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, ele financiaria integralmente os estudos.
Talvez a palavra hiperetologia esteja em desuso porque a doutrina da vocação se perdeu há muito. Ser pastor, “bispo” ou “apóstolo” é uma questão de mercado e não mais de vocação, de chamado, de experiência íntima com Deus que se manifesta no atendimento do rebanho, reconhecido por este como sendo vocacionado. Não é uma questão de salário, mas de consagração.
Ainda bem que ainda existem os verdadeiros vocacionados, que ministram ao rebanho por amor, com suor e lágrimas, gente que se vê recompensada pelo brilho nos olhos das pessoas cuidadas e pastoreadas.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

TUDO É GRAÇA!

Há teologias e teologias.
Há quem a chame de doutrina, outros de regras.
Há quem entende de teologia e há quem pensa que entende.
A verdade é que, por pertencer a um campo de domínio geral (a religião), há muitos que se consideram teólogos, na mesma proporção em que há os que se julgam técnicos de futebol. Talvez se pudesse aplicar o ditado: “de teólogo e louco, todos temos um pouco”, ainda que, na minha experiência, tenho visto mais loucuras que teologias.
No campo da teologia, há dois grandes grupos: os teólogos conservadores que só fazem repetir o que alguns iluminados do passado disseram, acreditando que depois deles nada de novo se produziu e o que eles falaram é a nata da verdade. Tenho um amigo que foi fazer um curso de Mestrado e se matriculou em um curso de Teologia Contemporânea. O professor, PhT, começou a descrever o desenvolvimento teológico desde a patrística, chegou a Calvino e encerrou o curso. O meu amigo, indignado porque foi para um curso de teologia contemporânea, questionou o professor e este se saiu com esta pérola: “o último teólogo foi Calvino. Depois dele, só lixo”.
O outro grupo é dos que trazem “novidades”. Este se divide em dois: os que inventam novidades, sem embasamento e coerência (dente de ouro, cuspe santo, unção de Abraão, prosperidade, doença como castigo de Deus, maldição de família, G12, castigo hereditário, adoração ousada, etc.). O segundo subgrupo é dos que ousam fazer perguntas às formulações clássicas e reconhecidas e buscam novas compreensões para a fé. Neste contexto se pode mencionar a Teologia da Libertação, as Novas Cristologias, a Teologia Relacional, Teologia Feminina, Teologia Negra, Igreja Emergente, Ortodoxia Generosa, Teísmo Aberto, Teologia Quântica, etc.
Há outra forma de ver. Há duas grandes correntes de teologia: a da justiça retributiva e a da graça. A primeira tem uma multidão de seguidores. Acho que não exagero se digo que mais de 99% a seguem. A característica desta é que é sinergista: Deus faz a parte dEle e o ser humano tem que fazer a sua. Ouvi no final do ano um pregador se estender por 40 minutos pregando sobre o texto “pela graça sois salvos e isto não vem de vós, é dom de Deus” e ele enfatizava que a pessoa precisava acreditar, crer e aceitar. Era a incoerência absoluta e a negação do que o texto afirmava.
A outra afirma a graça de Deus, o favor imerecido. Não é o pagamento de algo que se faz ou se deixa de fazer, não é o agir de Deus constrangido por alguma circunstância, não é resposta à oração. É o agir motivado somente pelo amor de Deus. A primeira vê as dificuldades, os obstáculos, os períodos de trevas como sinais do castigo de Deus, em função de pecados conhecidos ou ocultos. A segunda vê em tudo a graça de Deus. No dizer de um cântico: “indo e vindo, trevas ou luz, tudo é graça, Deus me conduz”. Ainda que seja no vale da sombra da morte, a presença dEle se faz sentida e a graça se manifesta.
Não há poço que a graça não alcance, não há escuridão que a graça não ilumine, não há pecador que a graça não perdoe. Em Deus, tudo é graça!
Marcos Inhauser

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

RECOMEÇAR: A GRAÇA DE DEUS

Escrevi certa feita que deve ser chato ser Deus porque nada é novo ou diferente para Ele, nada pode maravilhá-Lo. Ele sabe de tudo, criou tudo.
Mas há outro elemento que tem me inquietado. Porque é Deus, não pode nem pôde recomeçar algo. Ele faz tudo tão certo que não há necessidade de refazer. Não precisa aprender com os erros porque, segundo definição, é impossível que erre.
Fiquei me imaginando no lugar de Deus e não gostei. Uma vida certinha, sempre fazendo tudo tão correto, certo e perfeito me cheirou algo meio cansativo, monótono, sem sentido.
Ficar a vida toda sem a possibilidade de recomeçar, sem a possibilidade de melhorar o que se fez imperfeito na primeira, de dar um toque especial.
O fato de fazer tudo certo já na primeira vez não exige que a vida tenha recomeços. Recomeçar é característica dos seres humanos e animais. A necessidade de recomeçar, de ter a esperança de que na próxima vez será melhor, é coisa tipicamente humana. Deus não precisa disto. Deus não tem esperança porque só espera quem não tem as condições de realizar o que espera que aconteça.
Deus não tem a limitação do tempo. Os entendidos e definidores de como Deus é dizem que Ele é um ser a-temporal, não sujeito às condições do tempo. Por isto o definem como eterno, sem princípio nem fim de dias. Não teve começo e não terá fim. Deus não se rege pelos meses, estações, luas, anos, séculos ou milênios.
Isto é coisa do “andar de baixo”. Nós precisamos de uma noite para descansar (Deus não descansa, ainda que a Bíblia diga que Ele descansou e mais tarde Jesus contradiz isto dizendo que Ele e o Pai trabalham até agora). Precisamos de uma noite para renovar forças e esperanças. O salmista, afirmando algo que todos gostamos de acreditar, diz: “o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã”.
Os dias terminam com a entrada da noite e isto é recomeço. A noite termina com a entrada do dia e isto é recomeço.
Recomeçamos com as trocas das luas, com a entrada das estações, com a mudança dos meses, com a entrada de um ano novo. Precisamos destes recomeços porque vivemos de esperança. E esperamos que amanhã seja melhor, que o próximo verão seja melhor, que no próximo Natal toda a família esteja reunida, que no próximo ano seja promovido ou ganhe mais, etc e tal.
A vantagem de ser humano é esta capacidade de recomeçar, de aprender com os erros e acertos da vida. A beleza da vida é a esperança, coisa típica e maravilhosamente humana. Quem não espera, morre.
E esperar contra toda a esperança foi a grande obra de Abraão, o pai da fé. E esperar dias melhores. Não houvesse esta esperança o mundo seria muito mais violento, um verdadeiro caos. Amadurecemos porque podemos recomeçar. Crescemos porque podemos avaliar e corrigir. E podemos corrigir infinitas vezes. Porque podemos recomeçar, Jesus ensinou que devemos perdoar ao próximo setenta vezes sete. Porque podemos recomeçar, os anabatistas são contra a pena de morte, porque ela retira a capacidade de se arrepender e recomeçar.
A benção de recomeçar é graça de Deus!
Marcos Inhauser

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

ALGUNS DIAS DEPOIS DO NATAL

Contrariamente à crença popular e de muitos “religiosos”, os magos não visitaram Jesus na estrebaria. O fato de que Herodes tenha pedido para matar as crianças com menos de três anos de idade é um indicativo de que, na conversa que teve com os magos, eles lhe disseram que o nascimento ocorrera há algum tempo.
No entanto, a história dos magos nos traz algumas lições para os dias subsequentes ao advento. A primeira é que eles estavam atentos aos sinais da presença de Deus na história. Perceberam que algo ocorrera e que isto tenha grande significado para eles e para a humanidade. Uma luz no céu entre tantas outras, foi suficiente para reconhecerem o sinal da ação de Deus. Esta mesma vigilância e atenção aos sinais da ação de Deus na história devem estar presentes nas nossas vidas. Como bem disse Karl Barth, o cristão dever ter em uma das mãos a Bíblia e na outra o jornal. Ler a Bíblia sem buscar no palco da história os atos de Deus é perder parte da revelação. G. Ernest Wright disse que a Bíblia, mais que Palavra de Deus, é a coleção dos “Atos de Deus”. Oscar Cullmann também chamou a atenção para a história como palco das ações divinas.
A segunda coisa a ser notada é que, apesar de estarem atentos para os sinais de Deus na história, eles foram ao palácio real na esperança de lá encontrar o Rei nascido. Ledo engano. Confundiram as bolas. Tiveram que corrigir a rota e ir ao local humilde onde Jesus morava. Na história da cristandade há uma infinita coleção de exemplos de pessoas que buscaram, ensinaram ou levaram outros a buscar Jesus não na manjedoura, não na casa simples, não no povoado humilde de Nazaré, mas na opulência dos palácios, das catedrais, dos “shows da fé”, das grandes concentrações, “Diante do Trono”, na boca das estrelas televisivas de um evangelho transformado em “gospel”, mais mercado que sacríficio, serviço e humildade.
A terceira lição que eles nos dão é que saíram de seus lugares, de suas casas, de seus povoados para ir adorar ao recém-nascido. Não há verdadeira adoração quando não há a disposição de se mover, de sair de onde se está, para, em companhia de outros (eram três), em comunhão, adorar ao Emanuel.
A quarta lição é que levaram do que de melhor tinham para ofertar. A excrecência apresentada nos templos da prosperidade trabalha o dar para receber, em uma negociata com o divino. Quando se dá, obriga-se Deus a retribuir na proporção do dado. Não se vê isto nos magos. Deram. Simplesmente deram. E deram com gratidão.
A quinta lição é que nem todos tem a verdadeira intenção de adorar ao Rei, mesmo que assim expressem. Herodes demonstrou desejo de também adorá-lo. Os magos foram alertados para a intenção perniciosa do rei. Ele queria reinar absoluto, sem conceder qualquer privilégio ao recém-nascido. Quando há pessoas que se apresentam em adoração e querem brilhar mais que o adorado, que trazem nas fachadas dos seus templos enormes fotos pessoais, que buscam estar na mídia para aparecer mais que o Rei, estão, como Herodes, mandando matar crianças menores de três anos para que seus brilhos não sejam apagados.
Marcos Inhauser

NÃO VI......

Já tinha me acontecido outras vezes. E mais uma agora. A primeira foi na final da Copa do Mundo em 2002. Estava em Lousiville em uma reunião de umas seis mil pessoas e no dia anterior eu disse que quem quisesse assistir ao Brasil ser campeão (como de fato foi) que fosse ao meu quarto do hotel que ali veria o jogo. Havia uma TV a cabo com mais de 150 canais, sendo uns 20 só para esporte. Na hora agá, rodo da esquerda para a direita, para cima e para baixo e não havia um só canal transmitindo a final da Copa do Mundo. Nos canais de esporte tinha até reprise de beisebol e nada de futebol. Subi nas tamancas e fui falar com a gerência e nada.
Em 2009 foi a vez de uma final do Campeonato Brasileiro. Estava na República Dominicana. Neste tempo já havia internet e achei que veria na televisão (transmitem até jogo de segunda divisão do futebol mexicano!) ou na internet. Fiquei a ver navios.
Agora outra vez. Estava na China, tinha três assinaturas de TV a cabo a meu dispor, mais internet. Esta começou a apresentar problemas já que cheguei, porque o governo chinês “monitora” (censura) o acesso a sites fora do país. Tinha acesso a um VPN e achei que o problema estava resolvido. Que nada!
Nos canais de esporte tinha de tudo, menos o jogo do Mundial de Clubes. Quando o Corinthians jogou contra o Al Ahly só consegui ouvir uma rádio pela internet e mesmo assim, a cada pouco cortava a ligação e eu ficava a imaginar o que estaria acontecendo.
Para a final, nada de novo. Sem transmissão, sem acesso à net. Tentei alguns sites e recebia a mensagem de que as imagens não podiam ser vistas fora do Brasil.
Sai de Beijing duas horas antes de começar a final e cheguei a Nova York umas 10 horas depois de terminado. Foi buscar acesso à internet e o único que consegui ler foi que o Curinga tinha vencido por um a zero. Nada mais! Não deu para saber quem marcou, como marcou, etc. Na segunda vez que consegui alguma coisa, li que o Cassio tinha sido eleito o melhor jogador do torneio. Imaginei que o Corinthians tinha passado sufoco para que o goleiro fosse o herói do jogo.
Na viagem de volta, o avião só tinha corintiano e uma são-paulina. Todos a rigor, com camisetas, bonés, faixas, etc. Era mano prá todo lado. Quando vi aquela gente toda, imaginei que o voo seria uma zona. Que nada. Silêncio.
Ao tocar o solo em Cumbica, houve uma explosão e o hino corintiano foi cantado com emoção. Para contrariar a fama de que corintiano é malandro, pela primeira vez em minha vida (e olha que já viajei um bocado), ouvi anunciar que um óculos de sol (de marca) havia sido encontrado no banheiro do avião e que o dono o procurasse junto aos comissários de voo.
Até uma camisa com o problemático logo verde da Fifa e autografada por todos os jogadores eu vi. Sinal dos tempos?
Marcos Inhauser