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terça-feira, 28 de junho de 2011

REESCRITORES DA HISTÓRIA

Primeiro li a “Revolução dos Bichos”. Muitos anos depois foi a vez de 1984, ambos do escritor Eric Arthur Blair, mais conhecido pelo pseudônimo de George Orwell, escritor e jornalista inglês. Adorei seu jeito sarcástico de denunciar regimes totalitários, tão bem descritos no Revolução dos Bichos e 1984. À época em que os li, notei um padrão que se apresenta nos dois livros, sem, contudo, dar muita atenção ao fato: a necessidade dos déspotas em reescrever a história. Na Revolução dos Bichos, ao tomarem de assalto a fazenda, os bichos decretaram uma série de leis, todas em flagrante oposição ao comportamento dos humanos que ali viviam. A relação das leis era: a.) Qualquer coisa que ande sobre duas pernas é inimigo; b.) Qualquer coisa que ande sobre quatro pernas, ou tenha asas, é amigo; c.) Nenhum animal usará roupas; d.) Nenhum animal dormirá em cama; e.) Nenhum animal beberá álcool; f.) Nenhum animal matará outro animal; g.) Todos os animais são iguais. O porco, que se tornou o líder da revolta, aos poucos vai fazendo sutis modificações em algumas das leis, passando a ser: a.) Nenhum animal dormirá em cama com lençóis; b.) Nenhum animal beberá álcool em excesso; c.) Nenhum animal matará outro animal sem motivo; d.) Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros. Em 1984 Orwell mostra como uma sociedade dirigida por uma elite é capaz de reprimir quem se opõe a ela. A história é a de Winston Smith, de vida insignificante, que tem a missão de fazer a propaganda do regime através da modificação de documentos públicos, da história e da literatura para que o governo sempre esteja certo no que faz. Trago estes comentários à tona porque Orwell antecipou algo que ocorre em vários níveis da política nacional e da propaganda oficial. Exemplo disto é o slogan do governo do Dr. Hélio (“primeiro os que mais precisam”) e agora se descobre que primeiros foram os amigos do rei e da rainha. Quando o rei vem a público dar sua versão, reescreve a história (“nunca soube de nada”, “é golpe”, “é antecipação da disputa eleitoral”, etc.). E teve o desplante de dizer que não se devia esquecer que havia sido eleito duas vezes pela população e que tinha um mandato do povo para ficar no governo. Na sua nova versão de mandato, tal qual na Revolução dos bichos, o mandatário da Fazenda Sanasa se esqueceu que mandato era para ser honesto também. No momento em que se envolveu direta ou indiretamente com os desmandos, o seu mandato caiu por terra. E para confirmar a tese orwelliana, o mandatário a Fazenda Sanasa e habitante do Palácio dos Jequitibás, solta uma propaganda ilusionista, uma história cor-de-rosa da sua administração. O mesmo acontece com o PT e seus governos. O seguidor das diretrizes econômicas do anterior se torna o artífice da recuperação econômica. Quebra o sigilo de um cidadão inexpressivo, cai e volta como o articulador político da terceira versão PT no governo. O mensalão foi armação, corrupção passou a ser “recursos de campanha não contabilizados”, articulação política virou “balcão de negócios”, apoio do PMDB virou cargo na administração federal, sindicalista virou pelego. Orwell foi um profeta! No sentido de pré-feta: predisse! Marcos Inhauser

terça-feira, 21 de junho de 2011

ISTO VAI DAR ZICA

Há pouco tempo escrevi aqui sobre os dois países: Brasil e Brasília. Um beirando o inferno pelas precárias condições de educação, saúde e transporte, sufocado por pesados impostos, com bancos cobrando pelo ar que se respira nas agências. No outro, o paraíso. Trabalho de dois dias na semana, passagens aéreas gratuitas, um cardume de assessores pagos, verbas adicionais mil, e se suspeita que haja pagamentos para cada votação que favoreça a este ou aquele grupo. No paraíso não há Receita Federal, o Coaf não pega as transações milionárias e se consegue multiplicar por vinte o patrimônio, sem muito esforço. Ocorre que, no Brasil real e do real fictício, o populacho (assim visto pelos habitantes de Brasília) vem pouco a pouco tomando consciência de que as coisas estão insuportáveis. Estamos nos dando conta da quantidade de impostos e taxas embutidas e escondidas em cada coisa que compramos e isto vai minando o comportamento bovino que nos tem caracterizado e começamos a ficar mais ativos e, em alguns casos, agressivos com a exploração. Estes dias uma pessoa me contava que precisa abrir registro de autônomo. Ela foi à Prefeitura para saber o que deveria fazer e soube que terá que pagar uma taxa de mais de quinhentos reais nos três primeiros anos (quando se supõe que haja isenção de impostos) e depois disto passará a pagar 5% de tudo quanto faturar. A taxa é referente a um autônomo que tem ensino médio, porque, se teve a benção de ter um diploma universitário, a taxa mais que dobra. A pergunta que ele fez à funcionária é “o que recebo em troca por este pagamento?”. O silêncio foi esclarecedor. Ele deve pagar esta taxa e a PM não vai fazer nada, absolutamente nada. Uma outra amiga, da área médica com um consultório na região, teve no último ano três visitas de fiscais de saúde, que implicaram com uma geladeira mini que tinha para ter água e umas frutas para seu consumo, sob a legação de que a geladeira estava próxima à porta do banheiro. E dá-lhe multa. Quando a gente vai a um Posto de Saúde, uma escola mantida pela Prefeitura, uma chreche, percebe-se que a lei serve para os outros nunca para eles próprios. Nunca soube que um Posto de Saúde tenha sido multado pela Vigilância Sanitária do município, ou que uma escola municipal tenha sido interditada porque tem um refrigerador perto do banheiro. Pagamos impostos e pagamos escolas para nossos filhos porque o Estado não faz a sua parte. Pagamos planos médicos porque o sistema de saúde é um desastre. Pagamos pedágios (apesar do IPVA e a CIDE), pagamos segurança particular e guardas noturnos, no que pese pagarmos para ter a PM. A distância entre o Brasil e Brasília está criando um sentimento de insatisfação e irritação nos habitantes do Brasil real, que temo pelo pior. Não consigo ver mudanças significativas com a camarilha que habita Brasília, com passaportes e cidadania conferidos por votos comprados a peso de ouro via propaganda eleitoral e negociações de bastidores. Perdi a esperança na democracia representativa via voto obtido pela propaganda e marketing. Talvez a desobediência civil seja mais efetiva que o voto dos senhores de terno e gravata que se alimentam com o suor de um povo que vive no Brasil e não em Brasília. Marcos Inhauser

quarta-feira, 15 de junho de 2011

TEOLOGIA DA IMPERFEIÇÃO

Há dois consensos entre as religiões: o ser humano foi criado por Deus e ele é inerentemente imperfeito. Logo, Deus criou um ser imperfeito. Esta afirmação machuca, porque a religião não pode afirmar que Deus tenha feito algo menos que perfeito. A saída é introduzir o conceito do pecado, que “danificou” a obra perfeita de Deus. Calvino afirmou a corrupção total do ser humano pelo pecado, Aquino afirmava que restou no ser humano, depois da queda, algo de bom. Pelágio dizia que nascemos sem pecado, mas que o convívio social é o que nos corrompe. Armínio acreditava que o ser humano ficou com o livre arbítrio. São posições que tentam explicar o problema. A questão permanece: se somos imperfeitos, por que as religiões pregam a necessidade de uma vida perfeita, santa e santificada ou seja lá o que preguem, como essencial para agradar a Deus? Se somos imperfeitos, por que se acredita e prega que Deus só usa os bons, os certinhos, os ascéticos ou reclusos? Quando estudamos a vida espiritual dos modelos espirituais que as religiões difundem, se percebe, se se lê com um mínimo de espírito crítico, que há um processo de heroicização destes personagens, mostrando como tiveram vidas austeras, como se negaram aos prazeres, como se mortificaram, que tiveram períodos de santidade plena. A história destes “santos” é uma galeria de gente anulada. No entanto, quando se busca com mais cuidado algumas informações sobre estes “heróis da fé”, vamos perceber gente tão imperfeita como todos nós. No terreno bíblico se tem Abraão, pusilânime diante das pressões da esposa Sara; Jacó, o enganador; Moisés, desobediente e inseguro de sua liderança; Davi, adúltero e assassino; Salomão, megalomaníaco; Jonas, desobediente e omisso; Jeremias, lamentador; Pedro, emocionalmente instável e dissimulado; Paulo perseguidor da Igreja e com espinho na carne. No campo extrabíblico tem-se o Lutero com angústias quanto à sua fé, Aquino que chegou a duvidar da ressurreição de Jesus, Madre Tereza de Calcutá que pediu em 1953: "Por favor, reze por mim para que não estrague a obra d'Ele e que Nosso Senhor possa se mostrar ... pois há uma escuridão tão terrível dentro de mim, como se tudo estivesse morto ... tem sido assim mais ou menos desde que dei início à obra."; "tão profunda ânsia por Deus e ... repulsa ... vazio ... sem fé ... sem amor ... sem fervor. Salvar almas não atrai ... o céu não significa nada ... reze por mim para que eu continue sorrindo para Ele apesar de tudo." Em 1959 ela escreveu: "Se não houver Deus, não pode haver alma, se não houver alma então, Jesus, você também não é real." Isto me faz recordar a resposta de Deus a Paulo que insistia em pedir que sua fraqueza fosse tirada (o tal do espinho na carne): “o poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, mais me gloriarei nas fraquezas, para que sobre mim repouse o poder de Cristo.” (II Co 12:9) Deus, no exercício de sua soberania e poder, não precisa de coisas e pessoas certinhas para fazer sua obra. Isto o afirmou Paulo: “temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós.” (II Co 4:7) e o motivo é básico: se Ele só pode usar o que é santo e perfeito, a glória será dividida com o “parceiro na santidade e perfeição”, o ser humano. Se ele usa o fraco, o débil, o pecador, e o torna instrumento da sua graça, a glória é dEle. Marcos Inhauser

quarta-feira, 8 de junho de 2011

BRASIL OU BRASÍLIA?

Confesso que ouvi com muita atenção e interesse o depoimento do ministro Antonio Palocci à nação brasileira, via televisão e li o que disse à Folha de São Paulo. Porque também trabalho no ramo de consultoria, estava interessado em aprender como melhorar a minha carteira. Até andei fazendo uns contatos, buscando quem me pudesse fornecer a lista dos clientes do ministro, porque cheguei à conclusão que poderia alavancar significativamente os meus ganhos se tivesse acesso a estes dados. Depois deste exercício de atenção e aprendizado, acho que perdi meu tempo. Ninguém sabe, ninguém viu, ninguém tem a tal lista. Os “esclarecimentos” foram de uma obviedade ingênua. Eu não esperava que ele viesse a público via Jornal Nacional afirmar que sonegou, que atropelou a lei, que agiu ilegalmente. Para dizer o que disse não precisava ficar em silêncio 20 dias nem usar a televisão. Terminada a maratona de paciência a que me impus tentando aprender com este gênio da economia, fiquei com a certeza de que temos dois países: Brasil e Brasília. No Brasil real, temos a carga absurda de impostos, com programas de computador a rastrear em tempo real as coisas que os habitantes fazem. A coisa anda tão avançada que a Receita Federal (é o que dizem) vai antecipar a Declaração de Renda do cidadão. Se você concordar, pague o que eles acham que você deve. Se não concordar, vai lá mostrar os documentos, aguentar a fila e correr o risco de acharem mais coisas, mesmo porque nesta área acham o que querem. Se não tiver dinheiro para pagar eles vão penhorar sua conta bancária e vão pegar o que é deles, não importa outros fatores. No outro país, Brasília, é o paraíso! Ganha-se polpudos salários trabalhando dois ou no máximo três dias por semana, com direito a mais de 60 dias de férias por ano, plano médico integral para ele e os familiares, aposentadoria após alguns poucos anos de trabalho, faltas abonadas sem nenhuma pergunta, viagens ao exterior com tudo pago, possibilidade de apresentar notas frias para combustível e despesas. Aliado a isto há a possibilidade de empregar um monte de parentes e aumentar o já polpudo salário, turbinado por verbas e gratificações. Neste paraíso a Receita é benevolente e em alguns casos inexistente. Não se conhece investigação sobre patrimônio de habitantes eleitos, no que pese evidências, rastros e pegadas deixadas pelo Renan Calheiros, Sarney, Jader Barbalho, entre outros. A Justiça é amiga: tem a impunidade com o belo nome de imunidade (um tipo de vacina jurídica que previne enfermidades com a lei e a Receita Federal). No paraíso Brasília não se pode falar mal do outro. Todos são cordiais, se chamando mutuamente de “excelência”, a imprensa deve ser censurada porque traz desconforto ao clima paradisíaco em que vivem. Tais quais religiosos em profunda comunhão uns com os outros, praticam o espírito de corpo, onde o ataque a um é o ataque a todos. Para a plateia externa encenam algum jogo conhecido como situação e oposição. Fechadas as cortinas do espetáculo, todos comem juntos nos mais caros restaurantes, onde alguns tem até cadeiras cativas. O visto de entrada neste país é o voto, conseguido sabe-se lá como. Outra forma é ser amigo de algum eleito ou, o mais seguro, ser parente de um eleito. Brasília tem filiais em muitas cidades, com embaixada nas Prefeituras Municipais e Câmaras. Exemplo e prova disto é a cidade de Campinas. Marcos Inhauser