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quarta-feira, 30 de agosto de 2017

SUJEITO MEIA-BOCA

Comecei a prestar a atenção ao fato quando, em uma viagem, fui recebido no aeroporto e a pessoa que me esperava me disse que eu ficaria hospedado em um hotel recém-inaugurado. Lá chegando, percebi que o prédio era novo, mas que carecia de um bom acabamento na pintura, a recepção era pobre, a decoração de mau gosto. Quando entrei no quarto, as camas eram de metal, pobres, os colchões de espuma fina, o lençol, ainda que novo, era de terceira categoria, as toalhas mais pareciam lençóis recortados, o cobertor era puaia. Entrei no banheiro: a torneira era de plástico e rodava quando se tentava abrir ou fechar porque colocada de forma inapropriada. O chuveiro era dos mais baratos e jogava água para todo lado, menos onde devia molhar.
Conversando depois com o dono, percebi que ele era assim: meia-boca. O carro, a camisa, a calça, o sapato. Tudo nele era mal feito, torto, faltando botão, etc.
Em outra oportunidade, fui recebido na Rodoviária por um pastor. Ele pegou minhas malas, fomos ao estacionamento e o carro dele era um arremedo de alguma coisa que um dia tinha sido uma Belina. Abriu a tampa de trás no tranco. Colocou um cabo de vassoura para manter a tampa aberta. Para abrir a porta do motorista teve que colocar a mão e abrir por dentro. Eu pensei que aquele carro nunca tinha sido lavado. Ao andar parecia escola de samba: barulho por todo lado e o carro nas curvas rebolava. Perguntei como ele se sentia com um carro neste estado. Para surpresa minha, ele disse: este carro tá bom de mecânica, só tem umas coisinhas para acertar e vai ficar zero bala. Um ano depois, estava com o mesmo carro e sem ter acertado as coisinhas.
Em outra oportunidade, era uma S10. Estava aparentemente boa. A maçaneta da porta do passageiro estava quebrada. — Quando você vai arrumar isto? —Já fui ver. É barato. Três anos depois a coisa estava do mesmo jeito.
Estive em uma casa que tinha três aparelhos de televisão, um em cima do outro. Perguntei o porquê daquilo. A resposta: —Os de baixo estão queimados. —E por que você não descarta? —É o que pretendo fazer! Nunca fez.
Em uma casa que conheço, a caixa d’água fica no forro em cima do banheiro. A boia quebrou e vaza água. De preguiça de consertar, deixaram derramando. No máximo fechavam o registro até que água acabasse. Aí se lembravam de abrir e deixá-lo assim até que nova “inundação” ocorria. Havia goteira em cima da cama do casal quando isto acontecia. Mudaram a cama de lugar, mas nunca arrumaram a boia.
Estas pessoas meia-boca não pagam as coisas em dia, vivem com o nome sujo, trocam de operadora de celular cada vez que cortam a linha que estão usando. Não cozinham, mas vivem de comer “tranqueiras”: sanduiches, batata frita de saquinho, salgadinhos, frituras de bar de esquina. Um banquete é uma pizza pedida no delivery mais barato.
Há pessoas que não tem o cromossomo da coisa completa, terminada, da coisa limpa, arrumada. Elas se contentam com uma casa meia-boca, uma torneia pingando, uma porta sem maçaneta, uma janela que não fecha.
O pior é que algumas destas pessoas acham que tem a vocação para serem líderes, pastores ou ter seu próprio negócio ou se candidatarem para algum cargo. Não avançam nos negócios, não têm liderados, perdem a membresia das igrejas e acabam morando em casa construída com coisas roubadas.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

COBRADO A FORCEPS, GASTO A RODO

Não vivemos uma democracia. O modelo político brasileiro é a impostocracia. Não temos o poder de decidir o quanto podemos e devemos contribuir, mas ele é tirado a fórceps de nossos holerites e bolsos. No Brasil não se paga impostos: eles são roubados de nós. A carga tributária excessiva e o retorno pífio de benefícios advindos do seu uso é gritante.
Os políticos brasileiros são verdadeiros gigolôs: vivem a extorquir o sangue dos que se entregam ao trabalho árduo, como se o povo fosse a prostituta que eles dominam e escravizam. Somos escravizados pelos políticos que, na ânsia de sempre ganhar mais sem trabalho, mas de ter à custa do trabalho alheio, produzem mecanismos de escravização. Eles se chamam Imposto Retido na Fonte, Antecipação de Receita, Cadastro de Proteção ao Crédito, Serasa, Lista Negra, Certidão Negativa de Débito, Alíquota, ICMS, ISSQN, IR, IBTI, IPTU, IPVA, e a miríade de tributos e taxas e outras formas de extorquir o suor do povo.
As recentes elevações de impostos, taxas, contribuições previdenciárias, a proposta de criação do bilionário Fundo Eleitoral, mais a existência do Fundo Partidário, a quantidade e assessores, viagens, auxílios e quejandas que os políticos recebem, formam a trama escravizadora que se sustenta com o que os gigolôs tiram da sociedade. Tal como nas estruturas de trabalho escravo, onde os trabalhadores mal recebem salário e vivem a dever para os patrões, porque precisam comer e se vestir, tornando-se eternos devedores, assim também a sociedade brasileira. Trabalhamos arduamente e o que recebemos mal dá para se ter uma vida confortável. Duvido que algum trabalhador médio brasileiro (a grande maioria) tenha parte do luxo ou conforto que os salários dos políticos têm. Para eles o luxo, para o povo o lixo!
Neste emaranhado de comodidades e asseclas, ficamos sabendo esta semana que, no Congresso e gabinetes de Brasília há a figura de um Fiscal do Café. O que eles têm de graça precisa ser testado e controlado por um Fiscal que ganha salário de executivo. Fiscal de Café em um país onde muitos nem café tomam porque não podem adquirir o pó para fazê-lo.
A indústria e o comércio brasileiro vive às voltas com tantas leis, portarias, decretos e regulamentações que obedecer a todos é certeza de que, em algum momento, um fiscal poderá multar, porque conflitantes. Esta parafernália fiscal é feita para autuar. Sempre há um ponto ou outro em que um fiscal pode pegar alguma coisa e lascar uma multa milionária. O empregado brasileiro é refém de uma justiça trabalhista anacrônica e parcial, inventando indenizações a cada nova sentença.
Os financiadores extraoficiais dos gigolôs têm a certeza da impunidade se tiver um amigo ministro no STJ, como aconteceu com a Abdelmassih, Cassiola e recentemente com os empresários dos ônibus no Rio de Janeiro. Flagrados, tiveram o Habeas Corpus concedido pelo amigo ministro. Padrinho de casamento da filha, aquele que não se sente impedido nem para emitir juízo sobre si mesmo. É a imparcialidade absoluta!
Talvez a atitude de gigolô dos políticos, em parte, se deva à prostituição de eleitores. Eles se vendem por uma dentadura, uma consulta médica, uma receita oftalmológica, um par de óculos. Prostituição a baixo custo que garante o luxo na capital.
A política brasileira é um lixo! Fazem do povo a boca do lixo para viverem na boca do luxo!

Marcos Inhauser

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

HENOTEÍSMO E MONOTEÍSMO

Segue texto do meu amigo e teólogo Paulo Rückert:
A dura lição do exílio na Babilônia provocou o amadurecimento teológico dos judeus. O confronto com os deuses dos dominadores ocasionou uma transição do Henoteísmo para o Monoteísmo.
O Henoteísmo afirma a adoração exclusiva de um Deus, que é superior aos demais deuses (2 Cr 2,5; Ex 15,11; Sl 82,1). Os outros povos têm os seus deuses, mas para os hebreus há somente um Deus, o verdadeiro. Os demais deuses foram subordinados a Iahweh (Sl 82), o Deus dos hebreus. “Celebrai o Deus dos deuses, porque o seu amor é para sempre!” (Sl 136,2).
No Sl 95,3 lemos: “Porque Iahweh é Deus grande, o grande rei sobre todos os deuses”. O hebreu reconhecia a existência dos deuses dos outros povos, mas declarava de modo enfático: Iahweh é superior a todos eles. Ele controla toda a realidade. Ele é o grande Rei (Sl 77,13; 96,4-5; 97,9; 136,2-3; 145,1).
O Sl 96 declara: “Pois Iahweh é grande, e muito louvável, mais temível que todos os deuses!” (v. 4). “Os deuses dos povos são todos vazios” (v. 5). Diante de Iahweh, os demais deuses são inexpressivos. Iahweh é o maior de todos (Sl 97,7; 115,4-8; 135,15-18; Is 40,18-19; 41,21-24).
“Graças te darei, de todo o coração; celebrar-te-ei perante os deuses” (Sl 138,1). Ao povo hebreu compete adorar somente um: Iahweh. Não há possibilidades para um sincretismo. Encontramos também declarações de henoteísmo em Ex 15,11; Dt 3,24; Sl 77,14.
Por sua vez, o Monoteísmo declara que só existe o único Deus verdadeiro com o qual todos os acontecimentos estão relacionados. Há um só Deus e os ídolos são nulos e inexistentes (Is 43,10; 44,6; Dt 32,39; 1 Rs 8,60; Sl 18,31; Zc 14,9). Vejamos o Sl 86,10: “pois tu és grande e fazes maravilhas, tu és Deus, tu és o único”. Vejamos também Is 45,21; Jr 10,6.
A partir da afirmação do Monoteísmo, o povo constatou que Deus continua com o controle dos acontecimentos. O propósito divino se realiza.
Mais tarde, Isaías formulou o monoteísmo absoluto (45,6.14-21), que é mais afirmativo do que o henoteísmo, pois declara a nulidade e a inexistência dos ídolos. O profeta Zacarias radicalizou o monoteísmo (Zc 14,9).
O monoteísmo ético significa que o único Deus compromete a pessoa a orientar a sua vida mediante princípios éticos. A fé e a ética estão interligadas.
 “A evolução intelectual e religiosa da antiga sociedade oriental tendia para o monoteísmo ético e transcendental. Apenas os judeus, no entanto, foram capazes de levar essa tendência a uma conclusão lógica e inequívoca” (William McNeill, História Universal, p. 59).
Portanto, o monoteísmo não se restringe a uma crença teórica e abstrata, contestada por Tiago (2,19). O monoteísmo ético implica um vínculo entre fé e compromisso. “A definição de monoteísmo ético por esse povo foi, portanto, uma das maiores e mais duradouras conquistas da antiga civilização oriental” (William McNeill, p. 64).
Não se trata de uma contemplação esotérica de um disco solar (como foi proposto pelo faraó Aquenáton), mas de um relacionamento pessoal com o Deus vivo, que se reflete nas relações e na conduta com a totalidade dos seres vivos. 



quarta-feira, 2 de agosto de 2017

COM QUEM ANDAS?


Diz o ditado: “dize-me com quem andas e dir-te-ei quem és”. Sabedoria popular acumulada por séculos. Aplicada no dia-a-dia, nem sempre ela se aplica cabal e infalivelmente. Um exemplo disto é Jesus: andou com publicano, zelote, ladrão, esteve na casa de coletor de impostos odiado pelo povo, deixou-se lavar os pés por uma prostituta, teve um mentiroso em sua companhia. Nem por isto teve em sua vida uma destas características.

No entanto, se esta máxima popular for aplicada ao Temer, tenho a impressão de que a conclusão será outra. Ele está cercado de pessoas suspeitas, denunciadas por mais de um delator da Lava Jato (Padilha, Gedel, Jucá e Moreira Franco). Do seu círculo próximo de auxiliares, vários devem explicações à Justiça: Loures, Yunes, Filipelli. Do seu entorno político, o Marum, precisa explicar sua lealdade ao Eduardo Cunha, ao ponto de visitá-lo na cadeia em Curitiba, com viagem que ele cobrou da Câmara. O Perondi e o Vladimir Costa (aquele que tatuou Temer o ombro depois de ganhar cinco milhões em emendas parlamentares) são figuras histriônicas que se desacreditam cada vez que falam. O relator que apresentou a versão pró-Temer na CCJ, o Ackel, também foi agraciado com emendas parlamentares, assim como tantos outros, no festival de liberação que antecedeu a votação. Até o presidente da CCJ recebeu quinhentos mil para pagar dívida.

O presidente teve o apoio em sua campanha dos dez milhões da Odebrecht, acertados em reunião no Palácio do Jaburu, mesmo local da reunião com o Joesley, a quem agora ele chama de bandido e seus funcionários de capangas. Para se segurar no cargo, reúne-se com o Aécio, também no Palácio do Jaburu, outro enrolado com a delação da JBS e Furnas.

Dos seus ministros, Kassab, Bruno de Araújo, Aloisio Nunes, Marcos Antonio Pereira, Blairo Maggi e Helder Barbalho devem explicações às citações feitas pelos delatores. Os líderes André Moura e Aguinaldo Ribeiro não fogem à regra: estão sujos na Lava Jato.

Sobra quem? Esta é a pergunta que muitos se fazem.

Mas vamos adiante: um presidente que tem uma acusação com áudio gravado em que comete o crime de obstrução da Justiça e corrupção, que ouve de um cidadão que ele está corrompendo juiz e nada faz, pode governar um país? Merece credibilidade um presidente que compra votos de parlamentares abrindo as torneiras do erário para liberar emendas parlamentares, mesmo diante do rombo nas contas públicas? Tem autoridade um político que se sustenta no cargo pela compra de votos e chicanas regimentais, trocando peças na CCJ para que a votação lhe seja favorável?

Na América Latina vivemos dias ímpares: na Venezuela um presidente que se sustenta pela truculência, por histrionismos retórico e chicanas jurídicas para convocar uma constituinte a seu gosto e formato. No Brasil, um presidente que se sustenta com mudanças nos membros da CCJ, com compra de votos e Decreto Lei que agrada a bancada ruralista. Dois mandatos ilegítimos pelos atos praticados. Se na Venezuela há mortes nas manifestações, no Brasil há mortes pelo contingenciamento de verbas para a saúde. Se a Venezuela está falida, no Brasil estados estão falidos ou em estado pré-falimentar.

Neste momento parece que Venezuela e Brasil são nações gêmeas siamesas.

Marcos Inhauser