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quarta-feira, 26 de agosto de 2015

PASTOR, OVELHAS, LOBOS E TIGRES

Recebi este texto do Rev. Marcos Kopeska, amigo e colega de ministério, que edito para que caiba neste espaço.
“O profeta Jeremias, lá pelos idos do ano 600 a.C., alimentava uma esperança que reflete nosso anseio hoje: "...e dar-vos-ei pastores segundo o meu coração que vos apascentem com sabedoria e conhecimento." (Jr 3:15). Conta-se a fábula de um pastor que gostava muito de suas ovelhas. Elas não tinham presas, garras e nem chifres. Eram indefesas e o pastor prometeu defendê-las sempre. Jamais mataria uma ovelha para comer, por isso vivia de frutas e legumes e, se necessário fosse, passaria fome. Em razão da sua dieta era muito magro, por vezes debilitado, não obstante feliz com sua vocação. Nas cercanias moravam lobos que apreciavam churrasco de ovelha, por isso a atenção do pastor era intensa e incansável. O gostar de ovelhas, sob a ótica do pastor, tinha a ver com a lã da ovelha, mas sob a ótica dos lobos tinha a ver com churrasco.
Todo líder alega gostar de seus liderados, mas sob qual ótica? Pois bem, a notícia de que havia ovelhas por ali se espalhou e logo vieram hienas e cães morar com os lobos. O pastor impotente, com apenas um cajado, muniu as ovelhas de couraças, chifres e dentes de aço. As ovelhas, sem saberem lidar com o equipamento tornaram-se mais frágeis ainda e os churrascos mais frequentes. O pastor teve então a brilhante ideia: “Vou contratar tigres para cuidar do rebanho, mas precisam ser tigres vegetarianos.” Encontrou-os, contratou-os mas aos poucos eles foram degustando os restos de ovelha deixados e concluíram que carne de ovelha era mais palatável do que frutas e vegetais.
Os tigres fizeram um acordo com os lobos e hienas de que de dia cuidariam do rebanho, mas de noite comeriam juntos o churrasco de ovelha, ocasionalmente morta por causas “que fugissem ao seu controle”.
O pastor observando que os tigres estavam relapsos no cuidado, chamou-os para uma repreensão, mas ao longo da repreensão um tigre, sem dar muita atenção às palavras do pastor, perguntou: “Qual seria o gosto da carne de um pastor?” Outro respondeu: “Só provando para sabermos.” Entre a fala dos tigres, o pastor notou que entre os dentes de um dos tigres havia vestígios de lã. O pastor interrompeu a conversa, entendendo o que acontecia e propôs: “Vamos fazer um acordo...” A assim viveram felizes, num bom acordo de paz: pastor, lobos, hienas, cães e tigres. Vez ou outra comemoravam os avanços da paz com um churrasco de ovelha.
O pior é que parece ser este o padrão da relação “Igreja & Estado” a que chegamos em nossa Pátria mãe gentil. Alguns pregam que o cristianismo deve ser apolítico, mas aí os churrascos de ovelha serão mais frequentes e descarados. Outros creem que a igreja deva ser politiqueira, fazendo parte dos acordos em troca de favores. Ela se torna lobo ou hiena, menos ovelha. Creio que devamos promover ambientes cristãos de esclarecimento – apartidários - sobre temas relevantes que envolvam os próximos debates políticos da nação. Criar espaços onde as comunidades reflitam sobre corrupção, violência, modelo de família, assistencialismo, aborto, educação, ... Espaços onde nossos adolescentes conheçam uma nova consciência cidadã cristã. Espaços que levem o povo cristão às urnas, livres dos sutis enganos e das viciosas seduções da política partidária.  Ambiência de conscientização e reflexão, não de acordos.
Que Deus nos ajude a ter uma nação com pastores e ovelhas, mas sem churrascos após cada eleição.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

A COBIÇA DO PODER

Há no imaginário popular a ideia de um grande juízo no fim dos tempos, quando todos deverão responder pelos seus atos, toda a verdade se estabelecerá e a justiça prevalecerá. Nesta corrente vem o ditado popular: “a justiça dos homens falha, mas a de Deus prevalecerá”.
Este conteúdo escatológico que se dá à plenificação da justiça se deve ao fato de que, como humanos, cometemos injustiças e ao assim proceder, atentamos para a concretude da paz, porque não há paz sem justiça.
Na análise do comportamento humano (e isto já foi feito uma infinidade de vezes), há os que reduzem as mazelas comportamentais e a causa das injustiças, atribuindo à cobiça, por entender ser ela a causa mater de todos os pecados. Ela está elencada no Decálogo Mosaico e pode-se resumir nela todos os demais pecados. A cobiça do poder, a cobiça da mulher alheia, a cobiça dos bens alheios.
O relato da criação e queda do ser humano relatado pela Bíblia coloca o pecado primeiro na categoria da cobiça de poder: seriam iguais a Deus. O projeto de se tornarem mais do que eram os levou a tropeçar e perder o paraíso.
No mundo moderno a cobiça pelo poder ainda vige livremente. Os super-heróis das revistas em quadrinhos e mais modernamente dos filmes de ação, são pessoas dotadas de poderes ilimitados para combater os que querem assumir o poder sobre todos. Poder foi o que satanás ofereceu a Jesus durante a tentação.
Nesta tentação caíram muitos. Desde a antiguidade até os dias modernos há uma sucessão de pessoas que quiseram ser ultra-poderosos: os Faraós, os reis persas, babilônicos, Salomão, Alexandre, Napoleão, Hitler, os Bush (pai e filho). Temos hoje o norte-coreano Kim Jong-Un que não pensa duas vezes para eliminar quem não se conforma totalmente aos seus desejos totalitários.
Há partidos que cobiçam o poder e estabelecem planos para ficar X anos no poder. Lá chegando, aumentam o sonho e se locupletam para que a permanência possa ser indefinida. Fazem esquemas, montam lavanderias, compram fidelidades para assegurar a reeleição, compram o silêncio dos cúmplices, contratam advogados a peso de ouro, compram a maioria no congresso, buscam a própria estabilidade econômico-financeira.
Nesta cobiça do poder e da perpetuação nele, não se envergonham de fazer coisas condenáveis e, quando flagrados, saem com a cara-de-pau afirmando que sempre se fez assim, que não são os únicos, que a PF deveria se preocupar com questões mais importantes. Para a mídia, fazem declarações de inocência absoluta. Mesmo diante de extratos bancários comprobatórios, negam, de pés juntos, que o dinheiro que está na conta em seu nome e que tem a sua assinatura, não é dele e nem a conta lhe pertence.
Por ser o poder algo tão tentador e aderente, se assemelha a uma tatuagem: marca e se remove só parcial e cirurgicamente. Daí porque, na história da humanidade, as renúncias são mínimas e aconteceram em situações limítrofes: saúde abalada ou credibilidade zero, que gera um desgoverno.
Estamos em uma situação quase-limítrofe: pode piorar ainda mais. Os que propugnam a renúncia o fazem por candura, sem a concreta esperança de que ela se dê. O Nixon renunciou porque não tinha alternativas. O Collor tentou renunciar diante da iminência da cassação. O Blatter fez uma renúncia branca. Tem gente que prefere morrer a renunciar: Vargas e Allende.
A eleição é tão constitucional quanto a renúncia ou o impeachment. O que não é constitucional é o uso da mentira para se eleger ou reeleger.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

MOISÉS E EDUARDO CUNHA

O legislativo entrou na pauta das preocupações e atenções do povo brasileiro. No mandato do Eduardo Cunha, um ex-membro da Igreja Sara Nossa Terra e atualmente vinculado à Assembleia de Deus, tem traços que me fazem lembrar o Moisés bíblico.
O Moisés viveu no fausto do palácio do Faraó. O Cunha participou do governo Collor e por ele indicado foi para a presidência da Telerj onde reduziu os investimentos da empresa para se ajustar ao projeto collorido de privatizar as estatais. Para tanto, criou uma comissão de licitação vinculada a seu gabinete. O TCU constatou irregularidades na contratação de servidores, que deu tratamento privilegiado a alguns fornecedores e falhou na licitação para a edição de catálogos telefônicos. À época, foi acusado de superfaturamento ao ter assinado aditivo de US$ 92 milhões em contrato da Telerj. Viveu nos palácios colloridos!
Moisés teve um delito em sua vida passada, antes de assumir a condição de salvador da nação: ele matou o soldado egípcio e por causa disto teve que fugir. O Cunha tem muitas coisas a explicar relativas ao seu passado.
O Moisés se apresentou ao Faraó e ao povo como salvador da nação escravizada. O Cunha também o fez, apresentando-se como candidato que traria a independência a um legislativo submisso à maioria governista. Dez pragas foram necessárias para que conseguisse realizar sua obra. O Cunha, com sua pauta-bomba, já semeou algumas pragas na economia brasileira.
O Moisés teve a perseguição do Faraó que queria prendê-lo. O Cunha tem a Procuradoria Geral da República e a Polícia Federal atrás dele. O Moisés teve o Mar Vermelho à frente, o Cunha tem o STF e um ministro de cara avermelhada pelos traços étnicos. O Moisés passou incólume, o Cunha tem fé de que também passará.
O Moisés subiu ao monte Sinai e de lá voltou com as leis para o povo. Não houve a participação popular e desceu com a chancela do divino nas tábuas que trouxe. O Cunha subiu na cadeira presidencial e do alto deste seu Sinai, anda legislando a seu bel-prazer, mais para infernizar a situação que para beneficiar o povo. Há nele um messianismo achando que salvará a nação. Só ele se sente chamado.
Quando o legislador se afasta do povo para legislar, o povo padece com as leis promulgadas. Ainda que os Dez Mandamentos tenham valores até hoje aceitos, a jurisprudência feita pelos sacerdotes autorizou o matar a pedradas quem não guardasse o sábado, desobedecesse ao pai, a mulher que adulterasse. A lei pode até ser boa, mas os jurisconsultos a deturpam.
Não foi o caso de Jesus. Ao promulgar as bem-aventuranças (código relacional a vigir no ambiente da graça e do Reino, codificadas nas bem-aventuranças), Ele o fez com o povo à Sua volta. Subiu à montanha, mas não o fez no isolamento e sim na companhia de uma multidão. Não legislou em causa própria, mas rompeu com a lógica da justiça retributiva, muito usada pelo Cunha: fez, leva o troco.
O Moisés tem o testemunho que foi o homem mais manso que houve na face da terra. O Cunha tem o testemunho de ser violento, ameaçador e vingativo. O Moisés, ainda que tivesse sonhado com isto, não entrou na terra prometida. O Cunha, ainda que sonhe, não chegará à cadeira presidencial.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

JOVEM, CRISTÃO, XIITA!

Em conversa com alguns colegas pastores temos levantado e trabalhado a questão de uma geração que tem se mostrado conservadora e agressiva. As conversas iniciaram-se a partir da pergunta: como é que os grupos terroristas islâmicos conseguem arregimentar jovens, grande parte deles instruídos e vivendo em países com alto grau de desenvolvimento? A pergunta decorrente foi: como é que movimentos radicais, dentro do cristianismo, têm conseguido arregimentar jovens?
Esta pergunta, se bem me lembro nasceu com a notícia de que a Universal havia formado um pelotão de jovens denominado “Guardiões do Altar”, os quais, entre outros cânticos tem este: “Eu não temo a Batalha / Nem o contra ataque do mal / Eu não temo a tempestade / Fui selado para vencer / Eu já me armei com o escudo da fé / E o capacete da salvação / Não temerei vou enfrentar / Eu correrei pra conquistar/ E saltarei pra celebrar / Gritarei e as muralhas cairão”. O espírito beligerante é claro. O fundamentalismo extravasa pelos poros.
O jovem Dylann Storm Roof, de 21 anos, se achou no direito de entrar em uma igreja negra e matar nove pessoas que participavam de um culto em uma igreja em Charleston. Na sua justificativa, afirmou que queria uma guerra civil com tendências supremacistas dos brancos. Em seguida, várias igrejas negras foram incendiadas.
Há outro tipo de violência dos jovens que ocorre, com mais frequência na internet, em locais onde está aberta a troca de opiniões e se pode fazer comentários. Invariavelmente, as colocações feitas são de cunho agressivo, ofensivo, violento. Há enorme dificuldade em aceitar que alguém possa ter posição diferente, mesmo que seja superficial. Em um destes sites “evangélicos” li comentários dignos de briga entre torcedores de times rivais, inclusive com o uso de palavrões. Alguns amigos me confidenciaram que tinham a ideia romântica de que poderiam fazer alguma diferença postando algumas observações críticas ou ponderações sobre o que outros haviam escrito. Desistiram. Um deles, de tradição ortodoxa, o que mais levou foi pedrada de outros ortodoxos.
Guga Chacra, que escreve para vários jornais e revistas e comenta temas internacionais na Globo, em seu blog no Estado afirma: “Comentários islamofóbicos, antisemitas e antiárabes ou que coloquem um povo ou uma religião como superiores não serão publicados. Tampouco ataques entre leitores ou contra o blogueiro. Pessoas que insistirem em ataques pessoais não terão mais seus comentários publicados. ... O blog está aberto a discussões educadas e com pontos de vista diferentes.” Pelo visto ele também já foi vítima de muitas pedradas.
A recente turbulência na Câmara Municipal de Campinas sobre a questão do ensino sobre gêneros nas escolas é prova desta virulência. Todos queriam falar, ninguém estava disposto a ouvir. Ofensas mil, acordo nenhum. Não houve diálogo, mas diátribe.
Dia destes um amigo teólogo, com doutorado na área, me perguntou se eu estava acompanhando os ataques dos fundamentalistas à “ingênua teologia da missão integral”. Disse que não. Ele me informou que os fundamentalistas estão atacando o conceito de missão integral (o evangelho todo para o homem todo) como tergiversação dos ensinos bíblicos. Preferem esquartejar o ser humano em “corpo, alma e espírito. Talvez façam isto pela falta de outro inimigo, porque a teologia da libertação já não vige como antes e a teologia relacional muito pouco adentrou no Brasil.
Assustadoramente, em pleno século XXI, estamos vendo o ressurgir de ideias de supremacia racial, de discriminação religiosa, de violência assassina contra a diferença.
Marcos Inhauser