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quarta-feira, 31 de julho de 2013

PROVIDENCIAL

Ainda seminarista, fui convidado para pregar em uma igreja na Vila Maria em São Paulo. Vivia numa pindaiúba de dar dó. Para lá fomos eu e um meu irmão, o Miltinho.
Tínhamos no bolso a passagem do ônibus para a ida e uns trocos a mais. Ele me perguntou como seria a volta e eu disse que, normalmente, as igrejas fazem uma pequena oferta que seria suficiente para comermos algo e para voltar.
Terminado o culto as pessoas vieram até nós, nos cumprimentaram e um a um foram embora e nada de alguém aparecer para entregar a esperada e necessária oferta. Fomos os últimos a sair, juntamente com um casal.
Já na rua, o mano me perguntou: “e agora? O que fazemos?”. O dinheiro que tínhamos não dava para comer algo e para voltar de ônibus. Disse isto a ele e ele me disse que estava morrendo de fome. Eu também estava. E quando chegássemos em casa não teríamos nada para comer. Naquela hora havia que tomar uma decisão: comer e voltar a pé para casa, em uma caminhada de uns 15 quilômetros ou pegar um ônibus e passar a noite com fome.
Conversamos, estudamos a situação e decidimos que iríamos comer algo e depois sair em caminhada até o centro da cidade. Sentamos em uma padaria, pedimos algo que os trocados podiam pagar e, terminada a “refeição”, criamos coragem para sair caminhando.
Mal havíamos saído da padaria, escutamos alguém nos chamar. Era a pessoa que me havia convidado para pregar que estava à nossa procura porque havia se esquecido de dar a oferta que o tesoureiro havia destinado.
Preocupadíssima, nos pediu mil perdões, sem saber que estávamos era gratos e surpresos com os fatos. Como ele tinha nos achado? Como sabia que podíamos ter parado em algum lugar para comer algo?
Um amigo que vive nos Estados Unidos, o Manelão, que me hospedava quando ia para as aulas do doutorado, me contou como sempre via a mão de Deus suprir suas necessidades, muitas vezes depois de vencer o prazo de pagar uma conta.  Ele, um dia, meio desesperado, pediu a Deus que Ele adiantasse a provisão para que viesse no dia que deveria pagar suas contas. Em lágrimas ele me confidenciou que desde aquele dia nunca mais havia atrasado uma conta.
Experiências de ver a mão de Deus suprindo cada necessidade, mesmo quando penso que nada mais ocorreriam. São muitas na minha vida e na vida de muitos que me contaram suas experiências de ser abençoados de maneira toda especial e inusitada.
Não gosto de transformar experiências pessoais em normas para outros. Esta eu vivi e o Manelão experienciou. De uma coisa tenho certeza: a providência de Deus vem quando necessitamos e da forma mais inesperada possível.

E Ele assim faz por pura graça, não por mérito que porventura tenhamos. Não é questão de fé. É questão de favor imerecido da parte de Deus.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 24 de julho de 2013

CÂNDIDO VAGGAREZA

O PT não tem sido muito feliz na composição dos seus quadros. Um partido que teve Delúbio, Zé Dirceu, Genoíno, José Mentor, João Paulo, Silvio Pereira, entre outros de menor expressão, tem agora uma figura emblemática: Cândido Vaccareza, que melhor seria identificado como Vaggareza.
Ele é um  ginecologista, filiado ao PT, eleito suplente de deputado estadual em São Paulo (1998). Reelegeu-se em 2002 e em 2006 elegeu-se deputado federal. Foi líder do partido de fevereiro de 2009 a 2012. Neste período protagonizou alguns episódios de fidelidade canina ao Lula e à Dilma.
Mas, desde que deixou a liderança, algo mudou nele. Indicado a fórceps como líder da comissão encarregada de apresentar proposta de reforma política, ele honrou seu nome: deu uma de vagareza.
No que pese o fato de que a Dilma, atabalhoada com as manifestações de rua, ter acelerado propostas e derrapado nas curvas da política, ela nunca deixou de afirmar que queria a reforma política para as eleições de 2014. O deputado, não lendo as manifestações contrárias à sua indicação pelo presidente da Câmara, nem atento aos anseios da sua bancada que queria outro deputado na condução dos trabalhos, insistiu em continuar. Sua renúncia foi pedida e ele se fez de ouvidos moucos.
Ele quer flexibilizar a utilização das redes sociais pelos candidatos. Para ele as “redes sociais são extensão do escritório. Só me aceita quem quer e só aceito quem eu quero. Portanto, está 100% liberado. Posso entrar na minha rede social e dizer que vou ser candidato e pedir que vote em mim. Não posso ser punido por isso”, alegou.
Também quer modificar dispositivo da Lei da Ficha Limpa que beneficiaria gestores reprovados pelos tribunais. Vaggareza afirmou que a proposta de lei complementar estava pronta e seria levada ao colégio de líderes. Depois de muitas críticas, deu uma recuada estratégica.
Algumas das propostas são: para a quitação eleitoral, o candidato precisará apenas comprovar que votou; havendo cassação, ocorrerá uma nova eleição para decidir quem assume a vaga; o político poderá dizer que é candidato a qualquer momento; poderá usar as redes sociais para fazer campanha.
O mais preocupante é que ele quer deixar a reforma política, tal como ocorreu em tantas outras oportunidades, para sabe Deus quando. Ao afirmar que não há tempo hábil para uma reforma, plebiscito, referendo ou consulta popular, ele dá marcha de vaggareza ao processo que as ruas pedem urgência.
A depender de um líder de comissão como ele, que não consegue se afinar com o seu partido, com os colegas, com a Dilma e com o povo, que reforma política pode vir?

Marcos Inhauser

quarta-feira, 17 de julho de 2013

ACUSAÇÕES LEVIANAS

Um amigo pastor, residente de em uma pequena cidade do interior paulista, muito dinâmico e carismático, em pouco tempo ganhou respeito e notoriedade. Como a cidade enfrentava sérios problemas de corrupção, especialmente na Câmara Municipal, convidado e instado por cidadãos e políticos, decidiu lançar-se candidato, crendo que poderia ter uma atuação ética e que contribuiria para uma mudança na política local.
Tão logo seu nome apareceu como candidato, começou a receber uma saraivada de críticas, especialmente de pessoas evangélicas e membros de sua própria igreja. Diziam que ele estava se vendendo, que tinha cedido à corrupção, que o que buscava era ficar rico, assim como os demais. Assustado com a reação pensou em abandonar, mas também pensou que seus atos, caso fosse eleito, mudariam a opinião dos seus detratores.
Foi eleito com expressiva votação, sendo o segundo mais votado na cidade. As críticas não diminuíram. Já no primeiro ano estourou um escândalo no qual ele não estava envolvido e isto estava fartamente demonstrado. As críticas se acentuaram, com pessoas dizendo que ele era muito esperto e por isto não o haviam flagrado. Tantas foram as críticas e denúncias infundadas que, mesmo tendo amplas chances de ser reeleito ou até mesmo concorrer para prefeito, desistiu da política.
Conheço outra pessoa, também pastor, que uma noite recebeu uma chamada telefônica de pessoa de sua relação, que lhe pedia/exigia que ele desse algumas informações, que o mesmo, naquele momento, estava impossibilitado de dar. Para sua surpresa, a pessoa começou a acusá-lo de coisas absurdas.
Ele confessava que a pessoa detratora nunca o havia ouvido pregar, nunca havia participado de sua comunidade e, talvez, nunca tivesse lido qualquer coisa que ele tivesse escrito. Mesmo assim se sentia no direito e em condições de emitir juízos severos sobre seu ministério e a coerência dele. Com lágrimas ele confidenciava: “como posso ser acusado por alguém que mal me conhece? E meus anos de ministério? E os frutos que já tive foram parar onde?”
A coisa não é nova. Em estudos que estamos fazendo em Atos dos Apóstolos, Paulo também foi vítima de acusações levianas. Tantas foram as críticas que ele escreveu algumas cartas à igreja de Corinto para se defender e defender seu ministério.
Ninguém há que seja inculpável. Paulo, escrevendo aos Gálatas disse “que se uma pessoa chegar a ser surpreendida em algum delito, os que são espirituais o corrijam com espírito de mansidão, olhando para si mesmos, para que também não sejam tentados.” O mesmo, escrevendo aos Corintos que o acusavam disse: “Aquele, pois, que pensa estar em pé, veja que não caia”.
Estas considerações me fazem recordar o saudoso Rev. Joás Dias de Araújo em uma frase que costumava repetir: “o ministério pastoral é um mistério”. A partir dela cunhei outra: “o pastorado é a arte de levar pancadas e distribuir sorrisos”.
Agostinho disse que a vocação é irresistível. Calvino disse que a vocação é eficaz. Jeremias disse: “Não ... falarei mais no seu nome; mas isso foi no meu coração como fogo ardente, encerrado nos meus ossos; e estou fatigado de sofrer, e não posso mais” (Jr 20:9).
Só a graça de Deus nos mantém no ministério.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 3 de julho de 2013

O QUE SOBE DESCE NA MESMA VELOCIDADE!

Já escrevi aqui mais de uma vez, sobre o sábio Cirilo. Negro, bóia fria, trabalhou com famílias alemãs na área de Indaiatuba e acabou aprendendo alemão. Sua maior virtude era a forma como via a vida e a julgava a partir de coisas corriqueiras.
Um dia, na porta da casa de sítio onde passávamos férias, ele me ensinou uma coisa que a levei por toda a vida: as coisas caem na mesma velocidade que sobem. Se subir muito rápido, a queda vai ser rápida também. Fui revisitado pelas lembranças do sábio nestes dias ao ler e sentir no bolso as consequências de um destes fenômenos.
Falo do Eike Batista, filho de Eliezer Batista da Silva, ex-presidente da Vale do Rio Doce (61-64; 79-86), ex-ministro de Minas e Energia. Depois de passar a infância no Brasil, foi morar na Suíça, Alemanha e Bélgica. Nunca terminou o curso de Engenharia Metalúrgica na Universidade Técnica de Aachen.
Com 18 anos, voltou ao Brasil e vendeu apólices de seguro de porta em porta.
No início dos 80, se dedicou ao comércio de ouro e diamantes. Fluente em cinco idiomas (português, alemão, inglês, francês e espanhol). Com 21 anos montou uma empresa de compra e venda de ouro e em um ano e meio, acumulou US$ 6 milhões. Aos 29 anos tornou-se o executivo da TVX Gold. De 1980 a 2000, criou US$ 20 bilhões com a operação de 8 minas de ouro no Brasil e Canadá e uma de prata no Chile. Entre 91 e 96, o valor da empresa triplicou. Em 2001, a TVX Gold foi vendida por 875 milhões de dólares canadenses.
Considerado o homem mais rico do Brasil, hoje amarga o fundo do poço. Eike está negociando com os bancos uma dívida de curto prazo de R$ 7,9 bilhões. A OGX (petróleo), MMX (minério), LLX (logística), OSX (estaleiro), MPX (energia) e CCX (carvão) precisam pagar ou renegociar R$ 7,9 bi até março de 2014. A LLX renovou com o Bradesco um empréstimo de quase R$ 590 milhões que venceu em abril.
As ações do grupo estão se esfarelando na Bolsa. No último ano caíram entre 24,6% (MPX) e 85% (OSX). Só na segunda-feira houve queda de 27%.
Vendeu sonhos e não entregou um centavo aos investidores: "São projetos de longa maturação, que exigem altos investimentos e não estão produzindo o que se imaginava" disse um analista.
A crise de confiança do grupo começou há um ano, quando um campo de petróleo da OGX frustrou as expectativas de produção. A partir daí, os investidores começaram a questionar a capacidade do empresário de "entregar".

Pelo jeito ele vai entregar uma manada de bezerros para a “vaca leiteira do governo”. E vamos virar sócios na dívida!!!.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 26 de junho de 2013

O QUE ENVERGONHA O PAÍS

A presidente Dilma “Soucheff” veio a público, depois de um longo silêncio ante a gravidade das manifestações públicas, dizer mais do mesmo e fazer propaganda do seu governo. Depois de dez dias, ela gastou dez minutos para dizer nada. E no meio do nada tentou dar uma lição de moral: “a violência envergonha o Brasil”.
Acrescento coisas que, sim, envergonham o Brasil.
Envergonha o Brasil, dona Dilma, um governo com 37 ministérios incompetentes e um Ministro da Pesca que entende tanto disto quanto eu de física quântica.
Envergonha a prática de construir a base parlamentar na base de alianças com partidos, entregando ministérios de “porta fechada”.
Envergonha o Brasil um ministro da Economia que até o final de 2012 dizia que o PIB seria de 3% ou mais e deu 0,9%.
Envergonha o Brasil a quantidade de deputados e senadores, pagos a peso de ouro e com aposentadorias nababescas, para fazer quase nada.
Envergonha o ter coisas para serem votadas há anos, como é o caso do novo pacto federativo, que uma vez mais, no que pese o prazo dado pelo STF, não será votado.
Envergonha a depredação do patrimônio público seja por privatizações questionáveis, seja pelas licitações viciadas.
Envergonha o país a quantidade de dinheiro jogado fora em obras iniciadas e abandonadas.
Envergonha o dinheiro gasto com propaganda de governos federal, estaduais e municipais.
Envergonha a quantidade de escolas em péssimas condições.
Envergonha o salário de merreca dos professores.
Envergonha a qualidade do atendimento na saúde, a falta de médicos e de infraestrutura nos hospitais.
Envergonha o processo de aposentadoria e os salários pagos aos aposentados.
Envergonha a iqualidade dos orçamentos e contratos feitos com as empreiteiras, que sempre recebem aditivos aumentando significativamente os custos finais.
Envergonha que as obras de infraestrutura viária da Copa nunca tenham saído do papel.
Envergonha o despreparo deste governo da Dilma, que vem a público fazer um segundo discurso, orientada por marqueteiros, vendendo o seu programa de governo e propondo uma Constituinte restrita, coisa que, no dia seguinte, teve que voltar atrás, dizendo que não disse o que disse e que entenderam errado o que disse.
Envergonha a falta de estratégia em lidar com as manifestações públicas e as demandas populares. Dizer que o povo quer que as “reformas sejam mais rápidas” (sic). Quando se está parado, qualquer velocidade será mais rápida. E o governo da Dilma está parado há 30 meses.
Envergonha o eterno retorno da “reforma política” sem que nunca se faça nada de concreto desde o tempo do FHC.
Envergonha a classe de partidos políticos que temos, muitos comprados para dar sustentação política (sic) ao governo.
Envergonha que o partido da presidente tenha tentado, por várias vezes e diversas maneiras, cercear a livre expressão, a liberdade de imprensa, a autonomia de investigação do ministério público.
Envergonha ter mensaleiros condenados sendo parlamentares e recebendo como tais.
Envergonha ter o Maluf, condenado aqui e fora do país, como aliado deste governo.
Eu me envergonho do (des)governo que temos!!

 Marcos Inhauser

quinta-feira, 20 de junho de 2013

NÃO UMA QUESTÃO DE CENTAVOS, MAS DE DIREITOS

Este é um país sui generis. Não há igual. Já contei aqui que em uma visita que fazia à Guatemala, a capital estava em pé de guerra com pneus queimando, barricadas e manifestações porque haviam subido o preço do ônibus em alguns poucos centavos (algo em torno de R$ 0,05). No Equador, onde vivi, um aumento de centavos na gasolina fazia o país parar.
Durante bom tempo fiquei a me perguntar por que os brasileiros são lenientes e coniventes com a enorme quantidade de fatos que vêm à tona a toda hora, dando conta de sobrepreços, propina, desvios de recursos. Por que não há uma revolta social de magnitude com esta corrupção toda?
Hoje tenho que dizer que me dou por satisfeito. E mais que satisfeito: uma manifestação sem a comandância dos focos de podridão que são os partidos e os sindicatos.
Ademais, a mobilização foi possível por causa da terrível incapacidade da Polícia Militar em lidar com manifestações. Depois de vinte anos sem ter que fazer frente à mobilização das massas, a PM (talvez por herança do período da ditadura ou por nunca ter se afastado dos métodos de outrora), achou que acabaria com a coisa com gases lacrimogênio e pimenta, com cassetete e truculência. Deu no que deu. Mais gente saiu à rua e tudo indica que o movimento crescerá.
A repercussão internacional e as manifestações de solidariedade havidas em várias partes do mundo, com a imprensa internacional reverberando os fatos aqui ocorridos, colocou o governo central em alerta de que a coisa está feia e pode piorar. Como o lulo-petismo quer a todo custo a reeleição da sua camarilha, um movimento destes pode botar água no chopp.
Por outro lado, se a cada denúncia há uma convulsão nacional, qual o grau de maturidade do povo brasileiro? A pessoa e a nação maduras se conhecem pelo equilíbrio em lidar com as emoções e em dosar as reações diante dos fatos desagradáveis ou trágicos. Reações desproporcionais, emocionalizadas, são evidência de imaturidade. Ao ter uma reação de espera, de cobrar explicações via meios comunicação, ao usar a rede social para manifestar sua indignação e irritação, ao assistir aos telejornais com vívido interesse, ao ler os jornais e analisar os fatos, a nação mostra maturidade. Maturidade está na manifestação pacífica e ordeira. Imaturidade está na ação de uns poucos radicais que usam do momento para extrapolar.
Gostaria de ver incluída na pauta destas reivindicações a indignação do brasileiro com a tentativa de golpe que o petismo está pretendendo dar no Ministério Público, ao impedi-lo de investigar, uma vez que, na história recente, os deputados e senadores levados à barra dos tribunais o foram por obra do MP.
Marcos Inhauser


quarta-feira, 12 de junho de 2013

RUTE

Estava saindo de Rio Preto quando o celular tocou. Passei para minha esposa atender porque estava dirigindo. Percebi que ela falava com alguém que, no momento, não estava reconhecendo e eu também estava curioso para saber quem era. Depois soubemos se tratar de um grande amigo.
À medida que a conversa se desenrolava, percebi tratar-se de uma notícia triste e o nome que se falava era Rute. Rodei meu banco de dados mental e só encontrei uma Rute. E era dela que estavam falando. Falecera na sexta-feira e o enterro seria no domingo à tarde e a pessoa, gentilmente nos avisava da morte, pois sabia do carinho que tínhamos por ela e ela por nós.
No momento em que comecei a juntar as peças da conversa que ouvia e me certificava de que se tratava da Rute, uma profunda tristeza foi invadindo meu coração. Era como se estivesse perdendo alguém muito importante na vida
Rute era uma pessoa especial no duplo sentido do termo. Era especial porque sempre (e este sempre tem valor absoluto), quando me via, abria um sorriso e vinha me abraçar. Queria saber estava bem. Eu, do meu jeito, brincava com ela e também me interessava em saber como ela estava.
Rute era especial porque, Deus, na Sua vontade e soberania, permitiu que ela tivesse algumas necessidades especiais, que lhe obrigaram a terapias e doses maciças de remédio. No que pese as suas características, ela sempre foi um estímulo para meu ministério. Quando ela vinha à igreja, sentia-me amado e apoiado.
A notícia da Rute me fez revisar meu passado como pastor. Conclui que em quase todas as igrejas pelas quais passei e pastoreei, Deus me deu uma pessoa especial para, de maneira sincera e honesta, me dar as boas-vindas, me abraçar e se interessar por mim. Também conclui que estas pessoas especiais tem o dom divino de serem honestas e transparentes. Elas, quando gostam de alguém, realmente gostam. E se não gostam, não fazem esforço nenhum para passar a gostar. Percebi também que, em todos os casos, quando ia para a igreja, tinha o desejo consciente de encontrar a estas pessoas para ser cumprimentado, abraçado. Era como se precisasse de uma injeção da graça para iniciar os trabalhos.
Encontrei também estas pessoas especiais em quase todas as igrejas que já visitei. Na Church of the Brethren, nos Estados Unidos, há um jovem negro que faz questão de cumprimentar cada um dos mais de quatro mil participantes da Conferência Anual. Ele dá a mão e diz: Deus te abençoe e te dê a paz. Às vezes ela volta à mesma pessoa algumas vezes e quando se diz que ele já havia cumprimentado, ele repete a sua benção.
A Rute me ajudou no ministério e fez falta no tempo em que se ausentou e fará falta com a sua partida. Por tudo o que foi para mim, obrigado Deus e Rute.
Marcos Inhauser


quarta-feira, 29 de maio de 2013

É IXTRANHO!

Lembrei da frase do Zagalo, no seu peculiar jeito de falar, ao ouvir as lambanças ocorridas com a Caixa e o Bolsa Família: “é ixtranho, muito ixtranho.”
É estranho que um banco do porte da Caixa, que administra o Bolsa Família, que tem impacto sobre milhões de pessoas, decida fazer o depósito antecipado da parcela mensal. Que me perdoem os ingênuos, nunca vi banco favorecer a vida de ninguém, muito menos dar dinheiro antes da hora.
É estranho que o depósito tenha sido feito sem notificação aos interessados e sem que se prevesse a comoção que isto poderia causar.
É estranho que se diga que foi boato o fato de que beneficiários tenham acessado na sexta o seu extrato e tenham visto o depósito antecipado e não tenham acreditado em um “presente da Dilma”, pois certamente estavam acreditando que no dia determinado, uma nova parcela seria depositada. Lógica simplista de quem vive das migalhas do governo.
É estranho que uma ministra do governo tenha atribuído à oposição a onda de boatos, sem ter em mãos a mais mínima informação, sendo obrigada a desdizer o que disse, alegando que o que disse não queria dizer o que foi dito.
É estranho que o vice-presidente da Caixa tenha vindo a público dizer que havia determinado a antecipação das parcelas para fazer frente à onda de saques que houve, como forma de aliviar a tensão social que o fato gerou. Mais tarde veio com a história de que, quando determinou a antecipação, ele não tinha a informação de que ela já havia sido feita.
É estranho que o presidente da Caixa venha a público afirmar que não era do seu conhecimento a antecipação das parcelas e que, por isto, demorou uma semana para trazer explicações, uma vez que precisava levantar todas as informações necessárias para o esclarecimento.
É estranho que dois bilhões de reais (que é o total conhecido do Bolsa Família) seja antecipado, sem que o vice-presidente e o presidente da Caixa tomassem conhecimento do fato inusitado.
É estranho, muito estranho, que a razão para tal antecipação seja a atualização do sistema feita entre março e abril deste ano e que, de acordo com Hereda, a Caixa identificou 700 mil a 1 milhão de beneficiários portadores de mais de um Número de Identificação Social (NIS). Com a atualização, essas pessoas passaram a ter apenas o número mais antigo do NIS, o que poderia gerar confusão na hora do pagamento, segundo o presidente.
É estranho que ele não tenha explicado se a duplicidade do NIS implica e duplicidade de pagamentos. Se assim for, dizer que o Bolsa Família seria cortado não é boato. Por outro lado, como pode um banco que administra estas contas permitir que no mínimo 700 mil inscrições tenham sido feitas em duplicata?
É estranho que a presidente Dilma tenha dito que era “desumano e criminoso” o que estava acontecendo e que, agora, se sabe, foi gente do seu governo que aprontou a lambança.

É ixtranho, muito ixtranho.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 22 de maio de 2013

NÃO UM ZÉ: O ZÉ


Eu o conheci há mais de 30 anos. Estávamos em um encontro e um dos preletores faltou. Foi quando ele disse que tinha um texto que poderia ser lido. Nunca me esqueço: O Primeiro De(s)maio, um trocadilho sobre as condições do trabalho e o dia primeiro de maio, dia do Trabalhador.
Depois disto nos encontramos incontáveis vezes, seja em reuniões, conferências, seminários ou tomando um chopp. Cada vez que eu o ouvia falar e compartilhar suas ideias minha admiração por ele crescia.
Por duas vezes eu tive a honra de apresenta-lo como conferencista. Falei o que pensava dele: uma cabeça brilhante, um poeta, um artista das palavras e dos conceitos, hábil no uso das metáforas, etc.
Certa feita eu o convidei para falar sobre a história do pensamento humano (não podia dizer que era história da filosofia porque o auditório religioso era extremamente conservador). No caminho para o salão encontramos uma senhora e eu o apresentei como Doutor José. Ela mal tinha se afastado ele me deu uma bronca: “Marcão, não quero mais que você me apresente do jeito que você faz. Quando você for me apresentar, diga que sou o Zé. Nada mais.” “Mas Zé...” tentei retrucar e ele foi enfático: “Só Zé. Nada mais. Entendido?”
Eu já tinha preparado o discurso de apresentação. Ia dizer que era autor do livro Corpoética, Cosquinhas no Umbigo da Filosofia, Papo de Boteco e outras coisas mais. Fiquei mudo. Fiz o que ele me pediu: “aqui está o Zé”.
O grupo cantou um hino que dizia: “é mui certo que a gente tropeça, por isso Senhor, eu preciso de ti./Bem sei que nas preces eu posso buscar-te / Jamais dessa bênção na vida eu descri, / Contudo, é possível que eu dela me aparte / Por isso Senhor eu preciso de ti.”
Ele começou dizendo: “este sou eu. Já tropecei, já me apartei. Peço a vocês para não acreditarem no que vou dizer, mas que examinem e só aceitem aquilo que entenderem ser certo.”
Começou com os pré-socráticos e veio desfilando até o existencialismo. Eu estava abismado porque o auditório, que eu tinha certeza teria resistências, estava participando, fazendo perguntas, etc.
No período da tarde veio o segundo preletor. Começou dizendo que queria fazer algumas observações sobre o que o Zé havia dito, porque podia dar lugar a interpretações heréticas. E começou a desfilar um rosário de certezas e jactância.
Uma hora de palestra do segundo orador, o presidente do grupo veio até mim e perguntou: “Não dá para fazer este cara calar e colocar o Zé no lugar dele?”
Perguntei ao Zé, depois, porque não queria que o apresentasse da forma como queria. Ele me disse duas coisas que me marcaram: “primeiro que você exagera. E quando você exagera as pessoas ficam esperando a fala de um gênio. E eu não o sou. Dizendo que sou o Zé, qualquer coisa que vier depois disto é lucro.”
Não vou dar o nome completo dele para não levar outra bronca. Mas quem quiser saber quem é, me escreva que eu conto. Isto o Zé não pode me proibir....... E o faço como gratidão pelo muito que com ele aprendi e tenho aprendido. 
Marcos Inhauser

quarta-feira, 15 de maio de 2013

PODER DIVINO?

Mal tinha enviado para a redação a coluna na semana passada, na qual fazia algumas reflexões sobre o poder, entre elas a de que “nada mais terrorista que o poder exercido em nome de Deus” e surge a notícia de que o “pastor” Marcos Pereira estava sendo preso por ter, supostamente, abusado sexualmente de fiéis da sua igreja. Segundo as notícias veiculadas, ele promovia cultos de exorcismo e dizia a algumas fiéis que o demônio só sairia delas se mantivessem relações com um homem santo, no caso, o próprio “pastor.”

O argumento, ao menos para mim, não é novo. Nos idos anos 80 ouvi de mais de uma testemunha, de uma profetisa na cidade de Jaú que revelava o tal “mandamento da carne”, onde fulano deveria transar com cicrana, porque esta era a vontade de Deus. A mesma coisa ouvi depois como prática em outros círculos “proféticos”, dando-me a sensação de ser algo usual em determinados círculos.
Já mencionei aqui há algum tempo (Desequilíbrio de Poder) que estudos feitos sobre os casos de violência sexual sempre mostram uma relação desigual de poder, onde os abusadores, no exercício de sua autoridade, impõe suas vontades sobre as partes mais fracas. Também afirmava que, no campo do religioso, esta desigualdade do poder se estabelece quando o religioso se apresenta como revestido de “autoridade espiritual”, o que facilita a investida sobre a presa de sua sanha sexual. Uma “cantada” de um religioso é mais efetiva que a de um cidadão normal. Há nisto a mística de estar se relacionando com o sagrado, com alguém mais próximo de Deus, uma elevação espiritual pelo sacrifício da entrega do corpo, de orgasmo mais pleno porque feito com a santidade. Há o caso (sem o mesmo destaque na mídia) de pastor que Deus revelou que as mulheres dos membros da Diretoria da Igreja deveriam ser acessíveis e acabou sendo flagrado no escritório pastoral com uma delas.
Neste contexto fica mais fácil entender como pais e familiares próximos são os maiores violadores das crianças e como a pedofilia ganhou níveis epidêmicos no seio da religião. Atendi certa feita uma pessoa que foi abusada pelo pai evangélico que usava o mandamento do “honra teu pai” e o texto “filhos, em tudo obedecei vossos pais, porque isto é justo” como forma de obrigar a família a ceder aos seus impulsos.
Há que lembrar-se que o agora acusado teve seus momentos de glória midiática quando apareceu no Fantástico, que lhe deu longos minutos de reportagem, apresentando-o como recuperador de viciados, negociador de rebeliões e salvador de pessoas condenadas à morte pelo tráfico. Talvez por causa disto, ele tenha conseguido as verbas públicas milionárias para seu “trabalho”.
Marcos Inhauser