Professor, pastor, teólogo e educador corporativo Textos escritos para a coluna semanal no Correio Popular, da cidade de Campinas e texto escritos depois de 2021, que tratam de temas nacionais, internacionais, sobre igreja e teologia
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quarta-feira, 2 de maio de 2012
MOEDA DE TROCA
A recente cachoeira de vídeos e áudios que tem vindo a público, revelando o lado fétido e nada ético da vida pública e política de altas autoridades da república e da polícia, revela também algumas coisas que merecem ser consideradas.
Sabe-se hoje que o Procurador Geral da República já sabia dos descaminhos do Senador Demóstenes há três anos e nada fez para que o mesmo fosse devidamente enquadrado. Pergunta-se hoje o que o levou a ficar três anos engavetando o assunto. Seria ele Procurador ou, como foi o antecessor, Engavetador Geral da República? Quais interesses ele defendia ou que temores tinha para que as coisas não fossem trazidas a público?
Outra pergunta que se faz é por que só agora a coisa veio a publico, na profusão de evidências, onde a cada dia nova revelação aparece, como se a cachoeira do esgoto fosse conta-gotas? Haveria alguma estranha relação entre os fatos hora revelados e o julgamento a ser feito pelo STJ sobre o mensalão? Haveria aqui alguma possível moeda de troca ou “presta atenção” à oposição? Seria algo do tipo: se vocês quiserem mexer fundo na lama do mensalão, nós temos uma cachoeira de fezes para jogar sobre vocês.
Causa-me estranheza que a CPI dos Corruptores, tantas vezes aventada e necessidade urgente nesta república de mal feitos, nunca tenha saído do papel e nem mesmo é aventada pelos políticos de plantão. Já se fez algo para punir um ou outro pego na corrupção, mas nada que tocasse no âmago da questão. Se há corruptos há corruptores. Que as construtoras são as grandes vilãs, todo mundo sabe e evidências já foram levantadas, todas devidamente arquivadas por sentenças judiciais, sob a legação de ilegalidade no levantamento das provas. Quem, em sã consciência, acredita que desta vez vão pegar os tubarões? Será que vão mexer fundo na coisa, pegando a construtora que mais contratos tem com o Governo Federal? Duvido e aposto que não. Providencialmente pegaram um lambari da construtora e o puseram em prisão, o Cavendish já saiu de cena, a Alckmin já disse que vai rever os contratos com a Delta, a própria Delta já abriu mão de algumas obras mais vistosas (Maracanã e Petrobrás). Assessores do Agnelo Queiroz já renunciaram para “ter tempo de preparar a defesa”, o Marconi Perilo nega de pés juntos que nada tem a ver com a coisa. Vai sobrar para quem?
O Demóstenes vai receber seu quinhão por ter batido forte no governo e agora recebe o troco. Os dois delegados da PF vão cair em desgraça, os deputados Lereia e o Protógenes vai receber seu quinhão de vingança, o Nercessian é figura insípida e não afeta o tabuleiro do jogo e vai sobrar até para o Tulio Maravilha.
Mas tubarão não vai cair nesta rede. É ano eleitoral e a moeda de troca vai rolar. Vai se fingir que se investiga, vai se fingir que se pune, cada partido vai receber seu quinhão das construtoras, laboratórios farmacêuticos e bancos e continuamos sendo o mesmo país que sempre fomos. E assim será financiada a campanha eleitoral. Quanto mais derem para os partidos, menos chances tem as construtoras, bancos, laboratórios de serem chamados a se explicar na CPI.
Marcos Inhauser
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A DECEPÇÃO FOI ELEITO
Nada que me surpreendesse. O resultado da “eleição” na câmara Municipal de Campinas era, para mim, o conto de um final previsível. Eu já disse aqui que o Pedro Serafim não entrou na história de graça. Ele tinha e tem seus objetivos. Seu sonho desde criancinha era um dia ser prefeito de Campinas e conseguiu, ainda que pela via indireta, mesmo porque, se fosse pela urna eu tenho minhas dúvidas de que seria eleito.
Ele, na sua trajetória política, é uma decepção. Em 2010, quando da sua eleição para a presidência da Câmara já se alertava para o fato de que o ele era um dos parlamentares mais ausentes na Câmara. Quase não participava das comissões e nas sessões. Chegava atrasado e costumava sair antes de terminar as reuniões. Os vereadores foram questionados sobre os motivos que os levaram a votar nele e não responderam. Nos corredores muitos parlamentares admitiram que Serafim iria rever o valor dos salários dos vereadores.
Aqui está a segunda grande decepção: a forma como conduziu a discussão e aprovação do aumento salarial de 126%. À época eu escrevi: “A Câmara Municipal de Campinas, no melhor dos espíritos natalinos, decidiu dar-se um belo presente: aumento nos salários de 126%! ... Qual o índice usado para que eles aprovassem os 126%? E por que foi feito em uma aprovação às surdinas e de forma sorrateira?”. Na semana seguinte escrevi: “como acreditar no comandante em chefe da decisão que autoconcedeu-se o escandaloso aumento de 126%. O meu raciocínio é: a questão do aumento foi proposta, discutida, aceita e aprovada nos bastidores, bem assim a maneira sorrateira de aprovar. ... Causou-me espanto as afirmações do agora prefeito tampão, ... de que o aumento era para que houvesse independência do legislativo (... confissão de promiscuidade...). “
A terceira decepção é que, no mandato tampão queria governar juntamente com os vereadores, sugerindo o conluio do executivo com o legislativo, inconstitucional. Mais tarde disse que não conseguiu fazer grandes coisas no mandato tampão porque era temporário, ainda que tivesse todo o poder da caneta para fazer acontecer coisas. Se não soube se impor na autoridade de tampão, como acreditar que se imporá no mandato tampão-eleito? Temporário por temporário, os dois os são.
No dia da eleição, em entrevista, disse que daria um choque de gestão e que “controlaria a transparência das contas”. Ato falho? Para mim confissão de um estilo, porque já mostrou na Câmara como controla a informação quando do episódio do aumento salarial. O que a população espera e reclama é que a transparência das contas não seja controlada, mas feita de forma clara.
Não tenho dúvidas: Campinas continuará sem prefeito até dezembro. Até lá haverá muita campanha, muito acerto de bastidores e vereadores tentando limpar a barra que sujou nestes episódios todos. De minha parte não reelejo a nenhum deles!
Marcos Inhauser
quarta-feira, 18 de abril de 2012
Carta de Princípios da Criança Diabética
Há alguns anos presto serviço voluntário junto à ONG Pró-Diabéticos. Fundada em 2005, pela Sra. Claudia Filatro, mãe de uma criança com diabetes tipo1, a ONG Pró-Crianças e Jovens Diabéticos, sediada em Campinas/SP, e com filial em Guarujá/SP, conta com cerca de 30 voluntários, nasceu com a missão de prover amor, orientação e meios aos pacientes portadores de diabetes tipo 1, com prioridade para crianças e adolescentes de baixa renda, e seus familiares.
O Diabetes mellitus (DM) é um dos principais problemas de saúde pública mundial, tendo afetado no ano de 2011 cerca de 366 milhões de pessoas e com uma estimativa de 552 milhões de indivíduos afetados no ano de 2030 se medidas de prevenção não forem adotadas.
O Diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é o distúrbio metabólico mais frequente na infância e na adolescência e caracteriza-se pela deficiência absoluta da secreção de insulina, resultante da destruição autoimune das células beta do pâncreas.
Recentemente a ONG trabalhou dura e arduamente na elaboração da “Carta de Princípios dos Direitos da Criança e do Adolescente com diabetes tipo 1”. Esta é mais uma iniciativa inédita da ONG, cujo papel é defender os direitos, interesses e necessidades das crianças e adolescentes de baixa renda com diabetes tipo 1. A Carta visa garantir os direitos básicos dessa população e para isto precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional. A forma de se conseguir isto é através de Abaixo Assinado eletrônico com 50.000 assinaturas on line.
Com esta carta busca-se o direito de receber cuidados especiais de um Cuidador capacitado em diabetes tipo 1 que ajudará o paciente a receberem os cuidados especiais; que ajudará a criança a gerenciar em nível domiciliar o tratamento medicamentoso do paciente, assim como do plano alimentar de prescrito pelo médico ou de nutricionista; controlará as crises agudas e complicações, manterá registros glicêmicos, estímulo e/ou acompanhamento do paciente nas atividades físicas, visando sempre concentrar esforços no tratamento preventivo.
A ONG lança agora a campanha para as assinaturas sejam colhidas e que podem ser firmadas por pessoas físicas, jurídicas, associações de portadores de diabetes, e demais entidades de defesa dos direitos da criança.
A forma de aderir à campanha e deixar sua assinatura é acessando o site:: http://www.peticoesonline.com/peticao/carta-de-principios-dos-direitos-da-crianca-e-do-adolescente-com-diabetes-tipo-1/456.
Colhidas as assinaturas necessárias, o próximo passo será a entrega da Carta com as devidas assinaturas eletrônicas à Ministra dos Direitos Humanos Maria do Rosário Nunes, ao Ministro da Saúde Alexandre Padilha, Coordenador Nacional de Saúde da Criança e do Adolescente do Ministério da Saúde e ao CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), a fim de que sejam implementadas as ações necessárias que assegurem a efetivação dos direitos dessa população.
Marcos Inhauser
quinta-feira, 12 de abril de 2012
MEU TEMPLO É A COZINHA
Meu altar é o fogão.
Minha ceia é o arroz e feijão,
salada e mistura.
A mesa é a celebração da
comunhão.
Os vapores das panelas são o
incenso das minhas orações.
O cheiro é a antecipação do
paraíso.
A reunião é a adoração.
O barulho dos comensais é o canto
de louvor.
Não falo em metáforas, mas na
concretude dos fatos de entender que cada refeição é uma Eucaristia. Cada vez
que entro na cozinha eu o faço com reverência. Gosto de cozinhar e entendo que
fazê-lo é um ato de amor ao próximo. Cozinho não para mim, mas para os meus
familiares, os meus amigos. Esmero-me.
Cortar uma cebola ou um tomate é
um ato de celebrar ao Criador ao ver as texturas, a disposição das sementes, o
cheiro, o gosto. Colher a salsa e a cebolinha é um ato de usufruir do criado e
o prazer do sabor na comida. Mesmo folhas minúsculas, moídas, picadas, esmagadas,
trazem tempero e a delícia da criação ao prato preparado. Temperar uma carne,
um peixe, um frango é um ato de adoração ao Criador que nos deu a comida e a
sabedoria em prepará-las. Que mundo mais
sem graça seria se tudo viesse pronto, como fast food divino. Ele deixou a nós
a liberdade para temperar, acrescentar sabores, mudar formas, variar arranjos.
A cozinha requer uma estola
sacerdotal. O avental é a estola do sacerdote cozinheiro. E cozinheiro que se
preze tem seus instrumentos próprios: tem suas facas, sua chaira, sua pedra de
afiar, a colher de mexer. Não é qualquer faca, nem qualquer colher. Há hora certa
de entrar em cena. Dependendo do que se vai cortar ou mexer, lá vai o
instrumento certo. Há uma liturgia no ato de cozinhar.
Cada vez que preparo uma comida
posso dizer com toda propriedade e sem nenhuma blasfêmia que “isto é meu corpo
dado por vós”, “isto é meu sangue dado por vós”. Quem nunca saiu de uma cozinha
exausto e moído de canseira? Quem nunca cortou o dedo preparando a comida? Mais
que isto, posso dizer que é meu corpo e meu sangue porque o alimento ali
apresentado teve horas de trabalho, de vida consumida para trazê-lo e coloca-lo
à mesa. E cada vez que apresento o alimento na mesa da comunhão, propicio o
milagre da ressurreição: corpos famintos, esmaecidos pela canseira, tem seu
vigor renovado, sua vida ressuscitada.
Sentar-se à mesa tem um quê de
sacramental. As inimizades não resistem a uma comida fraternal, a unidade é
fortalecida pelo fato de compartilhar da comida. A solidariedade é enriquecida
por ter que desfrutar da comida pensando que o outro também deve comer. Há o
milagre da multiplicação: quantas vezes você serviu uma janta ou almoço e achou
que a comida era pouca? E quantas vezes, apesar disto, sobrou um pouco no fundo
da panela?
Cada vez que juntos comemos,
esperamos a oportunidade de um novo comer, uma nova reunião, uma nova
Eucaristia. Cada almoço e jantar deve ser uma Eucaristia celebrada na
intimidade do lar, no convívio dos queridos e no convite dos que queremos nos
reconciliar.
Marcos Inhauser
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terça-feira, 3 de abril de 2012
A REFEIÇÃO RELIGIOSA
Não é
nenhuma coincidência que a celebração cúltica máxima nos tempos do Antigo
Testamente seja uma refeição e, de igual forma, no Novo Testamento. Todo o
calendário litúrgico da religião judaica estava e ainda está voltada para a
celebração anual da Páscoa. A esta celebração Jesus subiu a Jerusalém, assim
como muitos faziam em Israel para, no templo, participar da festa que conferia
identidade e integridade nacionais.
Todo judeu
devia, ao menos uma vez em sua vida, participar desta festa na cidade santa.
A
centralidade e importância desta refeição comunitária se devem ao fato de ter
sido ela instituída quando o povo ainda estava no Egito, em escravidão por mais
de quatro séculos, e que, depois de nove pragas, são orientados a matar um
cordeiro, vestir-se para viagem, sandália aos pés, porque iniciariam a
peregrinação para a liberdade, conhecida como Êxodo. O sentido de comunhão
estava evidente no fato de que todos da família, inclusive as crianças, deviam
participar. Se o cordeiro fosse muito para uma família, vizinhos deviam ser
convidados para que juntos dele comessem e assim desfrutassem da experiência do
convívio celebrativo da libertação.
A
celebração tinha ainda o caráter rememorativo e educativo, pois, quando os
filhos perguntassem por que celebravam a Páscoa, os pais deviam contar a
história da escravidão no Egito e como o povo foi libertado. Além de educar, também
tinha o objetivo de evitar que os judeus fizessem com outros povos o que o
Egito havia feito com eles.
Já no Novo
Testamento a centralidade da Eucaristia não é menor, nem diferente o seu
objetivo. Cabe ressaltar que Jesus não deixou para Sua igreja a Bíblia, nem o
templo, nem um manual de doutrina, nem rituais definidos e demarcados. A única
coisa que Ele deixou foi a Eucaristia ou Santa Ceia. Ressalte-se ainda que, no
Seu ministério e muito mais depois da Sua ressurreição, ele ceou com seus
amigos, inimigos e apóstolos.
Ele
instituiu a Ceia como forma de comunhão e celebração rememorativa, tal como se
devia fazer na Páscoa. “Fazei isto em memória de mim” e “porque todas as vezes
que comerdes este pão e beberdes deste cálice, anunciais a Sua morte até que
ele venha”. Memória do Seu sacrifício e morte libertadora, assim como na Páscoa
a morte do cordeiro era libertadora.
Há entre
católicos e protestantes divergências quanto ao significado da Eucaristia.
Mesmo entre os protestantes não há consenso, havendo os que a consideram
sacramento e os que a veem como memorial.
Pessoalmente,
seguindo a tradição anabatista, creio que a Eucaristia é compreendida pela
lavagem dos pés, pela refeição comunal e pela celebração recordatória do comer
do pão e beber do cálice e que, a participação nesta celebração é meio de graça
(aqui deixo de ser anabatista e sou calvinista). A Páscoa não é um fim de
semana prolongado para que se possa ir à praia ou viajar. É a celebração da
intervenção divina na história, sempre para nosso benefício e salvação.
Marcos
Inhauser
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quarta-feira, 28 de março de 2012
DOENÇAS: CASUALIDADE OU CASTIGO DIVINO?
O Rev. Kopeska, amigo e irmão por afeição, escreve coisas
que gosto: Aqui vai mais uma (com edições para caber aqui).
Epícuro, filósofo grego, tentou entender Deus a partir do
sofrimento humano: Deus, ou quer impedir
os males e não pode, ou pode e não quer, ou não quer nem pode, ou quer e pode.
Se quer e não pode, é impotente: o que é impossível em Deus. Se pode e não
quer, é invejoso: o que, do mesmo modo, é contrário a Deus. Se nem quer nem pode,
é invejoso e impotente: portanto nem sequer é Deus. Se pode e quer, que é a
única coisa compatível com Deus, donde provém então existência dos males? Por
que razão é que não os impede? A filosofia epicurista ... reflete ... o
egocentrismo infantil e utópico do ser humano em querer passar pela vida sem ...
ônus, perda ou pesar. Algo impossível para ... (humanos). Não somente Epícuro e
os amigos de Jó interpretaram a doença a partir da existência ou justiça de
Deus. Há um livro (“Teorias Sobre as
Doenças”) que traz a pesquisa
feita em 139 culturas, das quais 135 interpretam as enfermidades como castigo
divino. Trata-se da mistificação das doenças, as quais nossos antepassados
a julgavam como fenômeno "sobrenatural", ... além da compreensão do
mundo, superada, depois, pela teoria de que a doença é decorrente das
alterações ambientais ... que o homem vive. ... saúde e doença são estados de
um mesmo processo, ... Uma avó
ligou para a neta. O bisneto atendeu e ela perguntou por que ele estava em casa
e não no colégio. Ele respondeu: "Vó,
estou descansando no Senhor". Ele estava doente, mas por causa da
convicção religiosa, não podia admitir a doença, pois significava pecado na
vida. Enfermidades não são castigos divinos, reflexo da
falta de fé, sinais de pecados ou indicativos de negligência na comunhão com
Deus. São fatos inerentes da nossa humanidade ... Os que confiamos na soberania
de Deus ... cremos que as enfermidades podem ser instrumentos de Deus para a
sedimentação emocional e espiritual. Assim é o carvalho, usado por geólogos e
botânicos como medidor de catástrofes naturais. Quando querem saber o índice de
temporais e tempestades ocorridas numa determinada floresta, eles observam o
carvalho, que é a árvore que mais absorve as consequências de temporais. Quanto
mais tempestades ele enfrenta, mais forte fica. Suas raízes se aprofundam e o
caule se robustece, sendo quase impossível arrancar ou derrubar. Não é
necessário fazer análises para saber. Basta olhar. Para absorver as tempestades,
o carvalho assume aparência disforme, como se tivesse feito muita força, pode
ter aparência triste. A tempestade para o carvalho é desafio e não ameaça.
Assim somos nós. Devemos tirar proveito das situações contrárias à nossa vida e
ficar mais fortes. Com a aparência abatida, mas fortes! Raízes profundas! O
apóstolo Paulo escrevendo aos cristãos, na antessala do martírio em Roma,
anima-os: ... nos gloriemos nas próprias
tribulações, sabendo que a tribulação produz perseverança; e a perseverança,
experiência; e a experiência, esperança.
Marcos Inhauser e Marcos Kopeska
quarta-feira, 21 de março de 2012
ABENSUADO
Não errei na
grafia, não!
O que quero afirmar
é que a benção vem acompanhada de suor, a inspiração tem muito de transpiração,
o sucesso de dedicação. Não há atalhos para as coisas e os atalhos que nos são
oferecidos são fraudes.
Milhões
jogam todas as semanas na loteria, uns poucos acertam e os que levam a bolada,
via de regra, passam a viver um inferno. Ou perdem o que ganharam ou precisam
administrar os “amigos”. Chove na minha caixa postal e-mails me prometendo
ganhar mundos e fundos sem sair de casa e quando os olho com mais cuidado, vejo
que tenho que pagar e fico a pensar e concluir, a partir de experiências
anteriores e de outros que as viveram, que o único ganho garantido é de quem
recebe.
Quem ainda
não recebeu uma carta ou e-mail do tipo corrente? Você conhece alguém que já
ganhou dinheiro com isto a não ser quem iniciou a corrente?
Já li a
biografia de muita gente que se tornou famosa por “a” ou por “b”. Pegue-se o
exemplo de Thomas Edison que fez mais de dez mil experiências até que conseguisse
inventar a lâmpada, que durava não mais de 48 horas. Ele teria afirmado que “Não errei dez mil vezes, apenas descobri dez mil coisas que
não funcionam.” Li também a história de Ernest Henry Shackelton, definido como
o maior líder que a humanidade conheceu. Tentou chegar ao polo sul e nunca
conseguiu chegar lá, mas deixou lições preciosas sobre a obstinação,
persistência e lealdade aos comandados.
Neste contexto preocupa-me a maciça e
massiva pregação religiosa que tem assolado as televisões e templos que abrigam
empreendimentos religiosos. Trata-se da pregação que diz que a pessoa pode se
tornar rica, próspera, do dia para noite, bastando para tanto obedecer a Deus
(obediência nas ofertas e dízimos!). Inúmeros são os relatos de gente que
aparece dando seu “testemunho” de como foram abençoados porque deram o dízimo
ou ofertaram generosamente. Já se questionou a autenticidade de tais
testemunhos, visto que se sabe hoje que vários deles são pagos, de gente que
ganha uns trocados para falar o que interessa ao dono do programa.
Esta semana surgiu a notícia de que a Uniesp (União
das Instituições Educacionais do Estado de São Paulo) firmou convênios com
igrejas comprometendo-se a pagar dízimo pela indicação e matricula de fiéis em
seus cursos universitários. Haja criatividade! Aposto que ofereceram à
Uniesp que receberiam de volta dez vezes mais do que dizimariam! Os
espertalhões por trás de tal negociata querem o bem$ão sem suar a camisa. Usam
o nome de Deus para o seu enriquecimento.
Eu, orientado pelo sábio Cirino (boia fria, negro, dos meus
tempos de infância que me ensinou algumas lições preciosas) vou botar minhas
barbas de molho. Acredito que o que comemos deve vir do suor do rosto. Querer a
benção sem suar é comer do suor dos outros, que vão trabalhar mais do que devem
e precisam para sustentar a opulência de espertalhões travestidos de
sacerdotes, pastores, bispos e apóstolos.
Marcos Inhauser
quarta-feira, 14 de março de 2012
AMOR TERCEIRIZADO
Ela tinha certa capacidade
financeira. Dona de um próspero negócio e metida a madame, frequentava uma das
igrejas que pastoreei. Cada vez que tínhamos algum evento na igreja, fosse ele
hospedando alguma reunião ou congresso, ou mesmo para angariar fundos para
alguma instituição social, as mulheres e homens da igreja se cotizavam para ajudar.
Uma vez era um churrasco beneficente, outra um jantar para angariar fundos, ou
uma simples confraternização entre membros da igreja. Todos se cotizavam e se
dispunham, menos a madame. Ela vinha para mim e dizia: arruma alguém para fazer
em meu lugar que eu pago.
Um dia eu estava meio
atravessado e disse a ela que não queria gente que pagasse a outros para amar
no lugar dela. Ou ela viria ou então não precisávamos do seu amor terceirizado.
Ela nunca mais apareceu na igreja.
No tempo em que estive indo
quase diariamente à casa de repouso para visitar meu sogro e depois meu pai,
revi esta cena muitas vezes. Vi nestas casas gente que ali foi colocada pelos
filhos que nunca voltaram para fazer uma visita ao pai ou mãe. Era gente que
acreditava que pagando a mensalidade já cumpriam com sua missão. Ouvia história
de um homem que foi colocado, pagaram três meses adiantados e nunca mais deram
o ar da graça, nem para pagar o restante, nem para levar o pai a outro local.
Um deles me contou que tinha seis “tranqueiras na família” e que só uma
sobrinha era quem tinha algum cuidado com ele.
É mais fácil terceirizar que
sentar-se ao lado e ouvir a mesma história quatro ou cinco vezes em uma hora de
convivência. É mais fácil saber que há alguém para cuidar e que se paga para
fazer isto.
É verdade que há situações
em que a situação de saúde da pessoa exige cuidados especiais e locais
apropriados. No entanto, isto não exime os familiares de visitar, se fazer
presente, ouvir as histórias.
Há gente que não demonstra
amor nas relações pessoais, mas contribui com organizações que representam
causas nobres, e estas então amam por elas e assim se sentem isentas de culpa.
Apesar de ser nosso dever
contribuir para estas organizações que se propõem a aliviar miséria e
sofrimentos humanos, estamos cometendo grave erro se acreditamos que estas
contribuições nos livram de nossas responsabilidades pessoais de demonstrar
amor ao próximo.
Um filho ou filha, que
recebeu dos pais os cuidados na infância, que noites mal dormidas por eles
foram por causa do cuidado que deram em momentos de enfermidade, não tem o
direito de se ausentar ou mesmo de pagar para que outros amem no seu lugar.
O mesmo se pode dizer de
pais que contratam babás para amar em seus lugares, ou mandam para a escolinhas
para que lá sejam abraçadas e reconhecidas.
O amor ao próximo é
intransferível. Não há como passar procuração. É uma responsabilidade
individual, intransferível, inalienável. Amar é altamente recompensador e tem a
capacidade de dar significado à vida.
Marcos Inhauser
quarta-feira, 7 de março de 2012
A VOZ FEMININA CALADA PELA INQUISIÇÃO
Não é
de hoje que conheço e admiro o trabalho de pesquisa histórica que a professora
Rute Salviano Almeida desenvolve, recuperando vozes femininas caladas pela
Igreja. Ela traz a público mais um trabalho de sua lavra e pesquisa.
Lança amanhã
seu livro “Uma voz feminina calada pela Inquisição”, no qual apresenta o
contexto do final da Idade Média, o papel feminino e a vida das beguinas,
mulheres que se dedicaram ao cuidado dos menos favorecidos, tornando-se mestras
da vida e artesãs da alma.
A
personagem central de seu livro é Margarida Porete, beguina itinerante que foi
a primeira mulher queimada pela Inquisição francesa, em 1310. Ela ousou
escrever e divulgar suas ideias na língua do povo, quando a permitida era
somente o latim, considerada língua sacra. O livro apresenta o Tribunal da
Inquisição, com textos da época, bulas condenatórias e o processo que levou
Margarida à morte.
Como
em seu primeiro livro “Uma voz feminina na Reforma”, a escritora destaca o
silêncio das mulheres na História e o alto preço pago pela ousadia de falar,
pois o discurso público da mulher equivalia a uma perversão no cenário da Idade
Média.
No
livro são apresentadas as mulheres como mães, esposas e “escravas da moda”,
mostrando como o sexo feminino sempre sofreu em nome da beleza. As mulheres
medievais depilavam os cabelos da testa com cal, devido à moda do penteado
alto, no qual tinham que mostrar uma testa exageradamente grande.
Na
conclusão, a autora reflete sobre as diferenças e semelhanças entre aquela
época e a atual. Mais que isto, há que considerar-se que no meio religioso
(tanto cristão, como muçulmano e judeu) a mulher continua calada. Poucos são os
espaços em que ela pode expressar o que sente e pensa. Ao negar-lhe o acesso ao
sacerdócio e à ordenação pastoral, calam suas vozes, mesmo quando elas
representam, em média, 67% de todas as igrejas cristãs e religiões.
Na Idade
Média, apesar de enfrentar pestes, inundações, guerras e crer que Deus era juiz
vingativo e cruel, não queriam ser afastadas da fé, pois ela lhe dava segurança
em meio à vida cheia de temores. Nesta pós-modernidade, por seu turno, acha-se
vergonhoso crer nas doutrinas, preferindo “desconstruir” dogmas. Ao fazer isso,
não conseguem colocar nada no lugar e acabam vivendo perdendo a esperança. Talvez
isto explique a falta de empolgação, de brilho nos olhos da nossa geração, gente
disposta a levar às últimas consequências seus ideais.
Se a
Idade Média foi uma época de temores, hoje o sofrimento é a pobreza, violência,
corrupção e desemprego. A fé continua a ser o único esteio da humanidade; se
dava esperança ao homem medieval, continua a dar ao homem de hoje.
Uma pessoa que dedicou a vida a recuperar a voz das
mulheres silenciadas, merece o apoio até dos homens. O livro pode ser encontrado no site da Hagnos (www.hagnos.com.br)
Marcos
Inhauser
terça-feira, 28 de fevereiro de 2012
HÁ FUNCIONÁRIO E FUNCIONÁRIO
Quando da internação do meu pai no PS São José,
escrevi dois textos. Em uma destas vezes recebi um e-mail de um funcionário do PS,
que segue abaixo, com algumas edições:
“Provavelmente o senhor não se lembra de mim,
mas fiz Raio-X do senhor Milton quando ele estava internado no São Jose. Meu
nome é Wagner, sou técnico de Raio-X no PS há 11 anos. Muitas coisas já
presenciei naquele local, histórias tristes e alegres, de perda e dor, de superação
e humanidade.
Tenho orgulho do meu trabalho naquele local. Inúmeras
vezes, depois de um plantão exaustivo, saí de lá jurando que na primeira oportunidade
pediria transferência, mas até hoje, sempre que uma vaga em outro lugar aparece,
acabo dispensando e continuo no bom e insano PS São Jose. Não estamos
acostumados com elogios e reconhecimentos. Geralmente levamos apenas pedradas
como o senhor mesmo presenciou enquanto cuidava do seu pai. Quantos xingamentos,
quantas escarradas no rosto já levei naqueles plantões! Não estou falando no
sentido figurado, mas literal. Já fui pra casa levando o DNA de pacientes
nervosos, drogados, exaltados, que não se contentaram em ofender...rsrsrsrs. Não
tem jeito.
Aquele lugar realmente nos mostra que temos uma
missão a cumprir, que precisamos estar ali, mesmo que for para passar por essas
agruras.
Quando vemos uma criança chegando toda roxa sem
ar e depois saindo de lá sorrindo, bem de saúde, não tem dinheiro que
pague”.
Há aqui algumas coisas. A primeira é o senso de
dever para com o próximo que o Wagner tem (e muitos outros). Já escrevi aqui
sobre “Um Exército de Anjas” para falar de quem trabalha no Cândido Ferreira e “Mario
Gatti da Graça” para reconhecer o cuidado que meu pai ali teve quando foi
operado.
A segunda é que este pessoal trabalha sem
recursos e há os que colocam dinheiro e equipamentos pessoais para poder
atender à população.
A terceira é que os profissionais de saúde estão
expostos à violência. Ela tem duas fontes: os que chegam alterados pelo álcool ou
pela droga e os que, achando-se com algum direito superior aos demais, ofendem,
xingam e agridem. São comportamentos insanos, como relata o Wagner.
Quarto é que causa revolta ver profissionais
dedicados lutando com a falta de recursos e o dotô e quadrilha levando os
milhões que o Ministério Público está dizendo que levou. Vi gente virando
plantão para poder ganhar uns trocados a mais e porque não havia profissionais
suficientes. Outros, sem nada fazer além das tramoias, levam malas do nosso
dinheiro.
Quinto: o governo central, no ensejo de pagar os
juros para os agiotas internacionais, decidiu fazer cortes no orçamento. Não
cortaram verbas do Senado ou Congresso, nem das emendas parlamentares. Mas da
Saúde. E o ministro tem a cara de pau de vir a público dizendo que os cortes
não vão representar queda na qualidade do atendimento. São 5,5 bilhões a menos.
Pensando bem, acho que o Ministro não mentiu: é
impossível piorar o atendimento médico público. Se algo funciona é pelo denodo
de funcionários como o Wagner e outros que conheço.
Marcos Inhauser
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