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quarta-feira, 2 de março de 2016

MAIS MEDO QUE ESPERANÇA



Sabe-se que o medo é a mola propulsora da criatividade e que esta também é fruto da necessidade. Por outro lado, também é paralisante porque, diante dele, muitos paralisam e se deixam vencer pelo medo. O problema é a atitude assumida.
A esperança, por sua vez, é a mola motora para o futuro. Ela é a que provoca o dinamismo. Sem esperança morremos.
Estamos vivendo momentos em que o medo se mostra mais presente que a esperança. Penso na infinidade de pessoas que saem todos os dias para o trabalho com o medo estampado na face de que podem perder o emprego. Ontem, em um banco, um jovem à minha frente comentou que estava entrando em período de férias coletivas, ao que o outro disse: isto é pre-demissão. Foi a instalação do medo no outro.
Ainda agora falava com uma pessoa de RH que ficou um mês em casa, de férias, e deve voltar amanhã. Está sem dormir achando que vai perder o emprego e se o perder, não terá como pagar as contas.
No Brasil de hoje estamos com medo do desemprego, das contas, do zica, da dengue, da chikungunya, da impunidade, da corrupção, etc. Há também o medo dos investigados pela PF e Justiça. Há quem desça da van mascando chiclete, como para dizer que está tranquila, há o que desce dela sorrindo e há os que cobrem a cabeça para não serem vistos. Há os que se negam a fazer qualquer declaração e os que, a cada coisa que dizem, se enrolam ainda mais. É o medo a trapacear a verdade que acaba se manifestando nos atos falhos e nas meias verdades. Esperança de que, ao dizer meias verdades, se livre do que sobre os ombros lhe pesa. É o medo que faz apresentar novas versões a cada depoimento, que muda depoimentos e nega o que disse. Esperança de um habeas corpus que não se concretiza no STF.
A esperança anda meio anêmica. Parece que, se há luz no fim do túnel, o que se tem lá é uma vela e está ventando. A cada dia as novas notícias parecem ser dose de veneno para a esperança. Haja visto a troca do ministro da Justiça, na tentativa de aplacar as investidas da PF. Parece que a esperança tem sucumbido à maciça dose de medo, passada pelos prognósticos pessimistas dos economistas (os reis do chute), pelos desdobramentos da Lava Jato que a cada dia nos mostra que o câncer é maior. Parece uma cirurgia em que o médico abre a pessoa para ver o que tem lá dentro e descobre que o corpo todo foi tomado pelo câncer. Sobra alguém?
Mas se o medo é a mãe da criatividade e a esperança a mola propulsora para o amanhã, devemos ser criativos diante do medo e propor o amanhã da esperança. Não uma luta por causa dos R$ 0,30 na passagem do ônibus e nem pelo passe livre, mas pensar o amanhã, diferente dos ontens que tivemos. Este é o desafio da sociedade brasileira. Um amanhã cheio de justiça, com mecanismos reguladores que funcionam, com políticos que busquem o bem público e não a propina própria, que a diferença entre ricos e pobres seja diminuída, que a comida seja farta, que a mesa seja cheia, que se gaste mais com comida que com farmácia, etc.
No dizer de Isaías, o profeta: que as armas sejam transformadas em arados.
Marcos Inhauser


quarta-feira, 15 de julho de 2015

POLITEIA

Os nomes dados às operações da Polícia Federal indicam que há gente que lê e estuda dentro da corporação. Os mais variados nomes já foram usados e a mais recente, deflagrada ontem, Politeia, remete ao texto de Platão, a República, onde o filósofo tece comentários negativos à democracia. Dizem os entendidos que, influenciado por uma postura intelectualista de Sócrates, Platão a incorpora em seu pensamento, dando-lhe amplitude política. Em a República demonstra que não é possível pensar a política como prática qualquer e corriqueira, destituída de orientação cognitiva e de pressupostos epistemológicos.  Assim, toda ação política correta depende da visão dada por um saber relacionado à organização da cidade.
Para ele, a pólis é um organismo moral e uma comunidade ética, cuja finalidade é a realização da justiça e da virtude e não somente a conquista de objetivos como a segurança,  bem-estar,  produção de riquezas etc. Para isto, é necessário se fundar a pólis com uma elite intelectual, a qual, possuindo a sabedoria, norteará o funcionamento da vida política.
Se o que temos no Brasil é uma democracia, certamente não o é nos termos mencionados por Platão. O que temos está mais para corruptocracia. Vale citar SHAPIRO (Os fundamentos morais da política. Trad. de Fernando Santos. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 245): “Como existe o predomínio da democracia no mundo contemporâneo, qualquer investigação dos fundamentos morais da política tem, ... , que estar atenta ao papel desta na legitimação dos regimes políticos. O fato de que governos das mais diversas colorações ideológicas, ... , tentem se cobrir com o manto da democracia é uma prova a mais ... de que o compromisso com a democracia é um componente indispensável da legitimidade política [...] No mundo contemporâneo, ... , a aprovação à ideia de democracia é ... inegociável.”
Em outras palavras, há a necessidade inegociável de se chamar democracia aquilo que é corruptocracia.
Os eleitos não são os mais qualificados intelectualmente (os apedeutas eleitos nos mais variados níveis são prova disto), nem os mais bem preparados para a vida pública. Elegem-se os que têm visibilidade midiática, os que têm apelido jocoso, são filhos de políticos ou são conhecidos por atividade que nada ou pouco tem a ver com as habilidades para a vida política.
No sistema eleitoral brasileiro, onde a eleição é ganha com tempo de televisão e assessoria marqueteira, aliada ao fato de que os detentores de cargos eletivos dispõem de um caminhão de assessores ou contratados como comissionados, regiamente pagos com o erário, a renovação dos eternos políticos é tarefa hercúlea.
O financiamento das milionárias campanhas, se feitos com recursos próprios, só permite que ricos sejam eleitos. Se financiados pelo setor privado, o preço será cobrado, assim como se cobrará também o que foi gasto com recursos próprios.
Fala-se em reforma eleitoral e a Câmara está às voltas com ela. Do que se pode depreender naquilo que já foi votado e do que está por vir, as mudanças são cosméticas. Atacam-se alguns efeitos, mas não a causa: o custo das campanhas e a rigorosa fiscalização dos gastos e financiamentos. Pelo andar da carruagem, tudo indica que o poder fiscalizador da Justiça Eleitoral (que já era tênue e e-lento-ral) será ainda mais engessado pela redução dos prazos de investigação e sentenciamento. Acrescente-se a isto o fato de que há gente querendo que a destituição de prefeitos, vice, governadores, etc. só possa ser feito por órgão colegiado e não mais por sentença monocrática.
Ao que parece, ainda demoraremos algumas décadas para que a corruptocracia seja substituída pela democracia, pela eleição de agentes com sabedoria e não apelido, com conhecimento e não presença midiática, gente que não se orgulhe de não ter estudado e nem que afirme que ler dá sono.
Marcos Inhauser