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quarta-feira, 5 de setembro de 2018

VIRANDO CINZAS


Todos ficamos estarrecidos com o incêndio do Museu Nacional e ainda mais indignados porque a tragédia havia sido anunciada por várias fontes. No que pesem os alertas dos responsáveis e de outras pessoas que se preocupavam com o Museu e tudo o que nele havia, encontraram ouvidos moucos. Tão moucos que nenhum ministro compareceu às cerimônias de comemoração dos duzentos anos do Museu. Deu no que deu: virou cinza!
Há algum tempo, os governantes brasileiros, nos níveis municipal, estadual e federal, seja no executivo, no legislativo ou no Judiciário, têm revelado a sua incúria e incapacidade de gerir a coisa pública. São especialistas em fabricar cinzas.
A Petrobras por pouco não virou cinza. Mas parte dela foi queimada pelos gestores corruptos, nomeados pelos partidos políticos para dar espaço à bandidagem e para encher as borras dos partidos. A Eletrobras foi levada à cinza pelos gestores indicados pelos políticos. Agora estão vendendo na bacia das almas as cinzas do que outrora fora a maior empresa de energia do Brasil. E a Eletronuclear não teve caminho diferente, ainda que as cinzas não estejam à venda.
O SUS virou cinza nas mãos dos últimos governos. O povo vai para o SUS, o político é badalado nos hospitais de primeira grandeza e manda a conta para que o erário pague. A Educação virou cinza nãos mãos de alguns professores sindicalistas, que mais sabem promover greve que dar boas e decentes aulas. A totalidade está no forno de cremação dos salários indignos e da falta de condições para uma boa educação.
O PIB previsto em prosa e verso para 2018 virou cinza. O Real está virando cinza na hora de fazer o câmbio. O Congresso Nacional, com tendências piromaníacas, ateia fogo no orçamento, aprovando medidas esdrúxulas, sem a devida provisão de recurso. O Executivo compra a impunidade do presidente a peso de ouro, dando milhões a parlamentares fisiológicos e contingenciando verbas de educação, investimentos, saúde, etc. O judiciário, o poder com os mais altos salários da República, se concede um aumento abusivo de quase 17%, mesmo sabendo da grave crise que o país atravessa. O Orçamento virou cinza!
O Temer ascendeu ao cargo todo chamuscado pelo processo. Todos o viam com graves queimaduras, mas ele insistia em dizer que estava tudo bem e que iria se recuperar e recuperar as finanças do Brasil, bem assim a taxa de emprego. O que se vê é um presidente qual frango em forno de padaria, girando para todo lado e se queimando por inteiro. Com as temperaturas mais elevadas pelas duas denúncias, virou cinza. Pela primeira vez temos um ex-presidente no exercício. Os seus asseclas estão virando cinza a cada delação premiada. Lá estão as cinzas do Padilha, Moreira Franco e outros. Com a aberração da cinza falante: o Marun, o rei das patacoadas.
A Reforma da previdência, mais uma vez, virou cinza. Assim também as reformas política e tributária.
Neste cenário tem a cinza que está na caixa em Curitiba e que insiste que está viva! Tem cinza prometendo armar o país, desfazer todas as privatizações, cortar a jornada de trabalho e manter o mesmo salário, etc. No forno das propostas eleitorais, há de tudo, mas, ao final, é cinza.
Somos o país da quarta-feira de Cinzas, dia de arrependimento pelas maluquices cometidas no período anterior. Não há arrependimento nas cinzas dos brasileiros. Mesmo condenado a dezena de anos, ainda afirmam que são inocentes e vítimas de perseguição política. A Festa dos Guardanapos foi montagem fotográfica da imprensa marrom!
Valha-me Deus!
Marcos Inhauser

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

ANABATISTAS E O SERMÃO DO MONTE

Na minha caminhada de teologia e igreja, percebi que muitos, como eu durante meus primeiros anos, têm pouca ou nenhuma informação sobre o movimento da Reforma Radical (Anabatistas) e suas contribuições para a teologia reformada.

Uma característica bastante forte na maioria dos grupos anabatistas (Menonitas, Irmandade e Quakers) é a forte ênfase na obediência aos princípios presentes no Sermão da Montanha e mais especialmente nas Bem-aventuranças. Fruto disto é o compromisso radical de vários grupos anabatistas com questões relacionadas à paz e ao ser pacificador. Há várias histórias sobre este compromisso radical.

Uma delas é a relatada no Livro dos Mártires (Mundo Cristão, 2011). Um anabatista estava sendo perseguido por um soldado que o levaria preso e à morte por ser anabatista. Ao cruzar um rio congelado, o gelo se trincou com os passos do anabatista e o soldado, que veio no seu encalço, se afundou no rio gelado. O anabatista voltou, o ajudou a sair do rio e em seguida o soldado o levou preso e à morte. Obediência radical.

Outra história se deu nos Estados Unidos no período da colonização. Durante os anos imediatamente anteriores à Guerra de Independência, alguns da Irmandade se mudaram para uma área na Pennsylvania, chamada Morrison Cove. Ali, com outros colonizadores brancos, começaram a trabalhar na agricultura. Em novembro de 1777, os indígenas atacaram quem estava em Cove. Os da Irmandade não fugiram, nem lutaram contra eles. Cerca de 30 personas da Irmandade foram mortas. À medida que atacavam, os da Irmandade diziam em alemão Gottes Wille sei getham. (“a vontade de Deus seja feita”). Os indígenas se impressionaram com a maneira como suportavam o sofrimento, sem revidar. Muitos anos mais tarde, os antigos indígenas perguntaram se os “Gotswilthans” ainda viviam em Cove. Era a maneira como se lembravam da Irmandade.

Nestes dias, a Igreja da Irmandade da Nigéria deu mais um exemplo concreto de obediência radical. Grande parte das meninas raptadas em uma escola (mais de duzentas) pelo Boko Haran (grupo terrorista que se afirma muçulmano) pertencia à Irmandade. Agora, “no processo de reconstrução de suas vidas após os ataques dos terroristas do Boko Haram, irmãos e irmãs da Igreja da Irmandade na Nigéria (Ekklesiyar Yan’uwa a Nigeria) decidiram reconstruir também suas relações com seus vizinhos muçulmanos. Esse processo não se deu somente através do reestabelecimento do diálogo e da convivência pacífica, tão comuns antes do terror e da divisão imposta pelos terroristas. Eles incluíram em seu projeto a reconstrução de uma mesquita queimada pelo Boko Haram, impactando profundamente os líderes e a comunidade muçulmana local. Decididos a seguir o exemplo de Jesus em sua radicalidade, eles literalmente deram a outra face, não pagaram o mal com o mal, expressando a regra de ouro em sua forma mais concreta: "Portanto, tudo que quereis que os homens vos façam, fazei-o também a eles." (Mateus 7:12)” (dados fornecidos pelo Rev. Musa Mambula, um dos líderes da Igreja da Irmandade na Nigéria).

É também a aplicação concreta dos ensinamentos bíblicos: "Vede que ninguém pague a outro mal por mal. Antes, procurai sempre praticar o bem entre vós e para com todos." (1Ts 5:15) e “procurai a paz da cidade, para a qual fiz que fôsseis levados cativos, e orai por ela ao Senhor: porque na sua paz vós tereis paz." (Jr 29:7).

Como cristão não entendo como há quem apoie quem promove o armamento, a guerra, a violência, etc. Quem é cristão promove a paz!

Marcos Inhauser

quarta-feira, 22 de agosto de 2018

MEMÓRIAS DE LITURGIAS LIBERTÁRIAS


... E o verbo se fez Liturgia e habitou entre nós, peregrinos, cheio de cantos, gestos, cores, cheiros, saberes e sabores...
E vimos, em momentos efêmeros e cheios de eternidade, a glória de QUEM tem um nome indizível, impronunciável...
Nesse “pleroma extático”, arriscamos fazer preces, divinamente humanizadas, através de nosso mantra ": Pai Nosso, de infinito carinho Maternal...”.   Propusemo-nos a inventar celebrações que nos trouxessem à terra o Deus da beleza celestial.  Fizemos coro com o Rubão: “Amo, na liturgia, tudo aquilo que saiu das mãos dos artistas. Mas quando ouço as explicações dos teólogos e mestres, o encanto quebra e eu desejo que eles tivessem falado em latim, para que eu não tivesse entendido (...) Deixe que Beleza, sem palavras ou catecismos, evangelize o mundo. Deus é beleza.”
Há uma história da liturgia contextualizada, (en)cantada sob a inspiração dos versos e os reversos da vida, desde a paixão de “Aleijadinho” até o trenzinho tupiniquim de Villa Lobos! Em toda a sua plenitude! Vivenciando Paixão, Morte e Ressurreição de um povo “maltrapilho e maltratado “!
Houve um tempo em que se celebrou esta liturgia libertária! Houve um santuário devocional! Não nos moldes dos soturnos templos, erguidos para tentar enclausurar o Criador. Palpitava na alma de irmãos e irmãs a oração atribuída a Spinoza: “Para de ir a esses templos lúgubres, obscuros e frios que tu mesmo construíste e que acreditas ser a minha casa. Minha casa está nas montanhas, nos bosques, nos rios, nos lagos, nas praias. Aí é onde Eu vivo e aí onde expresso meu amor por ti".
Alguém há de perguntar: quem eram, quem foram e quem são os peregrinos e peregrinas que para lá faziam suas santas romarias? Seremos todos nós que diremos: “São gente refugiada de comunidades regidas por Leis de Segurança Paroquial. Pastores, pastoras, seminaristas, leigos e leigas que procuravam alternativas devocionais diante daqueles manuais prescritos por técnicos da fé. São pretos, pobres e profissionais da vida que ali se identificavam com a presença da Grande Face Onipresente do Espírito!”
Ecos de Caetano Veloso:
“A tua presença envolve meu tronco, meus braços e minhas pernas
A tua presença é branca, verde, vermelha, azul e amarela
A tua presença é negra (...)
A tua presença transborda pelas portas e pelas janelas (...) “
A nossa Liturgia começava quando, como líderes paroquiais, esperávamos, ansiosamente, cada reunião deste Corpo Místico, macro-ecumênico, que se reunia em torno da mesa, da celebração e da liberdade. Nunca foi tão atual o credo wesleyano: “O mundo é nossa Paróquia“, ao qual poderíamos acrescentar: “O mundo é nossa Paróquia Litúrgica”!
Infere-se que essa expectativa “pré Reino de Deus”, verdadeiro e caipiríssimo, “aperitivo do Reino”, trazia-nos o cheiro primaveril de novos tempos. Expectativa que nos segredava a certeza de novos tempos.
Assimilamos no corpo e na alma, a festa de foliões latino-americanos, homenageando Atahualpa Yupanky, bem como os nossos da nossa estirpe “T”: Tião, Tom, Tonico e Tinoco. Aprendemos a gozar as delícias inspiradas num cancioneiro-de-vida cuja "Satisfação" era ter um Cristo com o rosto de povo, de amor radical, universal, incondicional!
Descartamos o cartesianismo eclesiástico e seus dogmas excludentes, para corajosa e graciosamente, incluir as razões de um “coração feito pele morena”.  E sob as arrebatadoras utopias apocalípticas, tivemos visões “do aqui e agora”. Revelações que nos livraram e ainda continuam livrando-nos, mesmo que temporariamente, de um cenário carregado e intoxicado pelas retas doutrinas de nossas paróquias, quase sempre neuróticas.
Libertamos liturgicamente, como bem “kerigmatizou e didatequetizou” o poeta, profeta e trovador ZÉ-das-palavras-LIMAdas, “ a pele, os pelos e os poros desta paixão". Em vez de continuarmos cantando as "Quatro Leis Espirituais", começamos a cantar a Espiritualidade de um Jesus nascido neste "chão-menino-chão-preto-chão-do-coração”.
Nesta virtual Catedral do Místico e Mesclado Corpo de Cristo redescobrimos novos sacramentos...
-          O sacramento da viola
-          O sacramento do pandeiro
-          O sacramento do chimarrão
-          O sacramento da saudosa maloca
E é sobre estas coisas sacrossantíssimas que na sequência, cantaremos, sempre sob a batuta do brincalhão Arcanjo Gabriel e seus Blue Caps...
Texto do meu amigo Carlos Alberto Rodrigues Alves, poeta, violeiro, teólogo e corajoso, que me deu a autorização para editar e aqui publicar.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

PARADOXO SOCIAL


O mundo ficou pendurado nas notícias que saíam sobre a situação dos 12 garotos e do técnico que ficaram presos em uma caverna nas Filipinas.
Há algumas considerações que quero fazer quanto a esta situação. Um grupo de amigos, praticantes do futebol, depois da partida, decidem celebrar o aniversário de um deles (celebração da vida), entrando na caverna, coisa que já haviam feito antes sem problemas. Era uma celebração. Entraram pelo túnel de acesso, cheio de umidade e foram surpreendidos por algo inesperado: chuvas que inundaram e os obrigaram a ficar presos no seio da terra.
O mundo orou, rezou e torceu pela salvação das crianças. Todos se empenharam no resgate, muitos voluntários, mergulhadores ou não, se envolveram no trabalho. O mundo esteve pendente das notícias e do resgate de todos. À medida que iam sendo retirados, como que por fórceps, o mundo exultava com a vida salva.
Juntamente com isto, no Brasil, recebíamos notícias que também convulsionavam a sociedade. Elas davam conta das balar perdidas e das crianças mortas por elas. Por serem crianças, mais comoção havia. Parece que há um apelo emocional mais forte quando se trata da morte das crianças. Ontem recebi a notícia da morte de uma sobrinha de 10 anos, baleada por bala perdida, e que me foi comunicado pelo tio, inconsolável.
Em meio a estes fatos, assisti, ainda que parcialmente, o debate público promovido pelo Supremo Tribunal Federal, sobre a possível legalização do aborto. Meus dois neurônios, sincronizados (talvez por vez primeira), me perguntavam: não é este o mesmo pessoal que torcia pelo resgate dos meninos nas Filipinas, que clamou pela cessação da violência das mortes de crianças? Como podem estar, agora, defendendo a morte de crianças no útero de uma mãe?
Os meninos na caverna tiveram uma parafernália para que fossem salvos. Até um submarino de pequeno porte foi construído, para que a o resgate fosse levado a contento. Muito dinheiro foi gasto para a infraestrutura que permitiu a salvação de todo o grupo. Semana de hospital para a recuperação de todos.
Imagine o escândalo que teria sido se alguém tivesse vindo a público sugerir que se jogasse veneno no local onde os meninos estavam, para evitar que não sofressem com a demora no resgate. Imagine que alvoroço teria sido se alguém sugerisse que se introduzisse um aspirador/triturador, para que os meninos morressem. Imagine quanta celeuma teria acontecido se alguém, sob pretexto de que os pais não têm condições econômicas ou afetivas para recebê-los de volta, sugerisse o “aborto” deles no útero da terra.
Se para os meninos que estavam no útero da terra a salvação era questão de honra nacional e mesmo internacional, por que a vida de infantes no útero da mãe pode ser disposta a bel prazer delas, sob o argumento de que devem ter a autonomia sobre seus corpos? Se o argumento da viabilidade econômica da mãe e dos pais pesa na defesa do aborto, por que não foi usado na questão dos meninos?
Meus dois neurônios deram um curto-circuito. A ética da morte de crianças é circunstancial? A vida de filipinos vale mais que a vida de infantes brasileiros? Mas eles tinham mais de dez anos de vida, podem argumentar. Mas qual a diferença na qualidade essencial da vida entre um feto e uma criança de dez ou onze anos?
Confesso que não consigo entender. Se alguém consegue explicar que o faça.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 8 de agosto de 2018

TÔ COM SAUDADE DELE


Viajando, parei em um posto de gasolina para tomar um café. Era bem cedo e ali estávamos vários para tomar o café da manhã. A pessoa que me atendeu estava fazendo o meu com leite quando uma outra atendente, bem mais jovem, dela se acercou e perguntou se ela tinha visto ultimamente um senhor que costumava passar com regularidade.
A que estava me atendendo, pediu mais detalhes sobre quem ela estava falando. A mais jovem disse que era o “senhorzinho” que a chamava de “minha linda” e que, quando ia embora, sempre dizia; “ainda caso com você”. A mais velha disse que há algum tempo não o via. A outra perguntou: “será que ele está enfermo?”. Pode ser, mas também pode ser que tenha morrido. Ele era já bastante idoso.
Olhei para a mais nova e percebi que seus olhos marejaram. Ela se emocionou. “Não pode ser, ele era tão alegre”. A outra, mais velha respondeu que mesmo as pessoas mais alegres também morrem.
Senti que a mais jovem estava bastante emocionada com a possibilidade de que o “senhorzinho” tivesse morrido. “Eu sabia que ele dizia que ia casar comigo e que isto era brincadeira dele, mas aquilo me fazia muito bem. Saber que havia alguém que me dava atenção, me elogiava, e que fazia questão que eu o servisse.”
Ela deu tempo. Respirou fundo. E volitou a falar: “sinto falta dele, sinto falta dele dizendo minha linda e sair dizendo que um dia iria se casar comigo”. Dito isto, ela entrou na cozinha. Não duvido que tenha ido ao banheiro curtir suas lágrimas e sentimentos.
Eu fiquei ali parado pensando no que havia ouvido e visto. Imaginei que, talvez, houvesse quem o tivesse ouvido dizendo “minha linda” para a jovem, ou “ainda me caso com você” e tenha dito: “velho safado”.
Saí dali com lágrimas nos olhos. Cheguei ao meu destino com a coisa rodando na minha cabeça e refletindo no poder que a atenção tem de dar sentido à vida das pessoas, o como o elogio pode criar vínculos inimagináveis. Mais tarde, quando conversava com uma pessoa que tem problemas de relacionamento com sua equipe, contei a ele o que tinha presenciado. Senti que a coisa bateu forte nele. Acostumado a ser um sujeito extremamente racional e frio, vi seus olhos, tal qual os da jovem, marejarem.
Vivemos dias em que pouco tempo temos para prestar atenção nas pessoas, não nos arriscamos a elogiar quem nos serve, a dizer “minha linda”. Fomos criados para estar em relação com os outros, para amar o próximo como se fôssemos nós mesmos, para dar alegria ao outro. Acho que uma das missões mais sublimes da vida é plantar sorrisos na face das pessoas com as quais nos relacionamos.
Podemos fazer isto sorrindo, elogiando ou brincando. O humor é uma das formas mais sublimes que o ser humano tem para tornar a vida mais alegre, leve e prazerosa. Rir, sorrir, fazer sorrir e rir são o exercício do divino em nós. Na Idade Média se discutia e se digladiava sobre o tema do riso em Jesus. Havia os que defendiam que Ele, sim, riu, e outros diziam que, por ser o Filho de Deus, nunca teria sorrido.
Eu, de minha parte, acho que Deus dá gargalhadas com algumas coisas que fazemos ou dizemos e que ele está no meio dos que se reúnem e dão boas risadas. Acho que, quando o “senhorzinho” brincava com a jovem, Deus dava seus sorrisos.
Marcos Inhauser

quinta-feira, 2 de agosto de 2018

HÁ CEM ANOS ABENÇOANDO


Seu nome é José Zancul.
Eu o conheci em 1978 e desde então tenho desfrutado da sua amizade e do seu carinho para comigo, minha esposa e filhos. Eu e a Suely conhecemos em todo o nosso tempo de ministério poucas pessoas que, como o sr. José Zancul, fosse benção como ele foi e é. Nunca o ouvimos pedindo a Deus uma benção, mas sempre o vimos sendo benção na vida dos outros. Ele tem o dom de ser especial na vida das pessoas. Com ele aprendi muitas lições, mas a mais significativa delas já escrevi aqui: O “Princípio Zancul”, que reproduzo de forma reduzida.
Presbítero, aposentado do Banco do Brasil, é um homem singular, de simplicidade ímpar e de obediência invejável à Palavra de Deus. A generosidade não vi ainda em outra pessoa.
Certo dia estava quando um conhecido pedinte e alcoólatra do bairro se aproximou e nos saudou pelo nome. Eu sabia que vinha pedir dinheiro e eu já havia decidido que não daria para que ele não gastasse em bebida, pois entendia que estaria contribuindo para o seu vício.
Ele se dirigiu ao seu Zancul e pediu um dinheiro para comer um sanduíche. Para surpresa minha, ele colocou a mão no bolso e tirou o dinheiro e perguntou se aquilo era suficiente para comprar um sanduíche. O bêbado disse que sim e se foi agradecendo e pedindo a benção de Deus sobre o doador.
Fiquei surpreso e irritado. Do alto de minha convicção e como pastor dele, coloquei minha posição e minha recusa em dar dinheiro aquele homem. Mais surpreso fiquei ao ver a resposta do seu Zancul: “ele me pediu dinheiro para comer e eu dei dinheiro para comer. Não me cabe julgar se ele vai comer ou não, cabe dar a quem está com fome e a mim assim declarou. Se eu não der, estou julgando. Se eu julgar fico com o juízo. Se eu dou, fico com a benção. Se ele comer o sanduíche, a minha benção se estenderá a ele. Se ele gastar em bebida, ele fica com o juízo de Deus por ter mentido, mas ainda assim a benção é minha. Não se esqueça, pastor, que Jesus ensinou que Ele esteve com fome e não lhe demos de comer, teve sede e não lhe demos de beber, esteve preso e não o visitamos, nu e não o vestimos. Não sei como e nem por que, mas cada vez que vejo uma pessoa assim na minha frente, vem a mim a pergunta: será que é Jesus Cristo me pedindo?”. Sai dali de cabeça baixa, entendo haver muita sabedoria naquela simplicidade generosa. Aprendi ainda que nem sempre coloquei em prática, para demérito meu. Nas vezes em que o “princípio Zancul” foi aplicado por mim, meus filhos e minha esposa, tivemos a certeza de que ele tinha razão: a benção foi nossa em ajudar.
Uma pessoa com esta índole é presente de Deus para as nossas é concretude da graça de Deus.
Obrigado “seu Zancul” por tê-lo conhecido e desfrutar do seu convívio e ainda ser abençoado com sua lucidez, carinho e brilho nos olhos quando me vê a mim e à Suely.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 25 de julho de 2018

A BENÇÃO DO SILÊNCIO


Há uma benção no silêncio!
Há sabedoria no silêncio!
Não me refiro ao silêncio do ficar sem falar, sem conversar, mas no silêncio do escutar.
Vivemos tempos de muitos ruídos, tempos de muita distração, tempos de foco em tudo e todos. O tempo todo estamos atentando para algo ou escutando algo. No trânsito, para as placas e os radares mil que os colocam em lugares traiçoeiros. Ao andar na rua, prestamos atenção a quem nos acompanha, quem anda atrás de nós, com medo de estarmos sendo seguidos e roubados. Entramos em casa e a primeira coisa que muitos de nós fazemos é ligar a televisão. Há quem durma de televisão ligada, porque o silêncio da noite incomoda. Onde estamos nos fazemos acompanhar do celular e a toda hora o olhamos para saber se alguém deixou recado, curtiu o que postamos ou se há alguma bomba no noticiário.
Vamos aos barzinhos e lá, não bastasse o barulho das conversas, precisa haver alguém tocando algo (muitas vezes de mal gosto e desafinado) ou há um “som ambiente”, maldita música que atrapalha a conversa, porque somos obrigados a gritar para sermos ouvidos.
Parece que não gostamos do silêncio. Ele nos incomoda. Ficar em silêncio e ouvir o silêncio (sim: ouvir o silêncio) é algo aterrador. Será mesmo?
Lembro-me da infância quando, por muitas vezes ia dormir na casa da minha tia, no sítio. Desde pequeno tive problemas para dormir sonos regulares. Muitas vezes, por demorar para dormir, ficava a ouvir o coaxar dos sapos ou o coral de grilos. Lembro-me que, muitas vezes em que estive a “ouvir o silêncio”, ficava prestando atenção nos sons, se eram da natureza ou produzidos. Aprendi a encontrar paz ao ouvir só o que a natureza produz de sons: vento, farfalhar das folhas, o canto dos pássaros, o piar das corujas, etc.
Também me assustei com o silêncio absoluto. Por pouco tempo morei em São Paulo, bem no centro de um quarteirão, cercado de prédios ao redor. À noite não se escutava nada, absolutamente nada. Foi quando fiquei com medo de escutar o sangue correndo pelo corpo. Nunca mais quis ter esta experiência. O silêncio absoluto me assustou.
Só no silêncio temos a oportunidade de olhar para nós, de prestar atenção em nós mesmos. Só no silêncio temos a oportunidade de olhar para dentro e descobrir quem somos. No silêncio estabelecemos uma conversa com o nosso “eu mais interior” e o eu que mostramos à sociedade. No silêncio estabelecemos um diálogo existencial: o nosso eu (o “eu mesmo”) critica o “eu social” porque o vê como ator que se ajusta à peça em que deve atuar. O “eu social” critica o “eu interior” dizendo que é intolerante, inflexível, imoral, inconsequente, e outra quantidade de palavras começadas com “in...”
No silêncio nos descobrimos, nos damos a conhecer a nós mesmos. Sem o silêncio, sem o diálogo interior que ele propicia, a identidade se perde no turbilhão dos modismos, somos o que os outros querem que sejamos.
Não sou médico nem psicólogo, mas acho que a avalanche de depressões que estamos vendo se deve a esta falta de tempo para ficar em silêncio. A depressão é o grito do corpo e da alma pedindo tempo para dialogar consigo mesmo. Lamentavelmente é um diálogo perturbado pelas exigências, pelo constante ouvir gente dizendo “levante a cabeça”, “você precisa reagir”, etc.
Preciso do meu tempo de silêncio. Eu o tenho com certa regularidade, ainda que o faça ouvindo música, o que tem o condão de me empurrar para dentro de mim mesmo. A música a sós é um solavanco que me derruba dentro de mim mesmo.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 18 de julho de 2018

MÉDIO E MEDÍOCRE


Arrumei uma baita confusão quando, em um treinamento corporativo, disse que a palavra “médio” é uma contração de “medíocre”. Falei a coisa sem ter refletido com profundidade sobre o que eu havia dito.
Assustado com a reação, tive que pesquisar e, vi que não estava totalmente fora da razão. A busca pelo significado de medíocre mostra que ela é emprega para se referir a algo que está na média, se comparado a dois outros elementos. É algo que não bom ou ruim, horrível ou maravilhoso. É o que não se destaca, que passa desapercebido, que não chama a atenção.
Uma pessoa medíocre é aquela que não tem opinião própria, que repete o que ouviu, que fala obviedades, que é papagaio repetindo frases feitas. São as que adoram frases do senso comum e que as proferem como se estivessem dizendo maravilhas filosóficas.
Mas há também um outro sentido que se dá à palavra medíocre: aquele que está abaixo da média, que é sofrível, que é ruim. Um ator medíocre é o que estraga a cena onde atua. O médio não estraga nem a enriquece. O médio não cheira e não fede. O medíocre fede.
No treinamento em que tal fato ocorreu, ao passar o tempo com os que participavam, percebi que os que se chocaram com a afirmação de que médio é uma forma abreviada de dizer medíocre, eram os medíocres da turma. Eram tão abaixo da média no conhecimento do vernáculo, que não percebiam que as palavras podem ter nuances de significado, dependendo do contexto em que são empregadas.
Como colunista há quase 20 anos, tive experiências várias com meus leitores. Duas delas são paradigmáticas para exemplificar o que acabo de dizer. Quando da intervenção militar dos Estados Unidos no Afeganistão, escrevi várias colunas criticando a ação do império em terras de pobreza extrema, para acabar com um grupelho. Ao criticar os EUA, houve quem entendesse que eu apoiava o Talibã e me mandava e-mails me criticando e me “espinafrando”. Um dos argumentos que a pessoa bradava era que eu, como cristão, não poderia, nunca, apoiar um grupo muçulmano e terrorista. Tentei explicar que o criticar a um não significava apoiar o outro. Mas os neurônios do meu crítico não permitiam ver isto. Mediocridade pura!
Outro exemplo foi uma coluna que escrevi por ocasião do Natal, sob o título “Ele errou no dia e hora”. Nela eu fazia uma crítica ao modelo midiático das igrejas neopentecostais e imaginava o que seria uma produção midiática para o nascimento de Jesus, tipo Big Brother. Também afirmava que se poderia arrecadar milhões com os direitos autorais sobre as transmissões e fotos do evento. Dizia que, se o nascimento de Jesus fosse hoje, o impacto midiático seria estrondoso.
Não deu outra. Muitos me escreveram me criticando. Alguns publicamente outros, mais comedidos e éticos, me escreveram em privado. A um deles, pela forma decente com que tratou o assunto e me criticou, escrevi mostrando que havia usado uma figura de linguagem que é a ironia, que ela existe nos textos bíblicos e dei alguns exemplos de ironia em textos da Bíblia. O interlocutor me disse que nunca havia ouvido falar disto, mas que iria estudar o assunto. Nunca mais voltou a me escrever.
Nestes dois exemplos eu vejo o medíocre (o primeiro, por estar abaixo da média), o medíocre mediano (perdão pela redundância – o segundo no primeiro momento) e o mediano ascendente (que está disposto a aprender e sair da mediocridade).
Marcos Inhauser

quarta-feira, 11 de julho de 2018

ASSASSINARAM A ESPERANÇA


Os recentes eventos judiciários tiveram o condão de matar a esperança de que alguma coisa séria possa acontecer neste país. Não bastassem as trapalhadas do executivo e sua equipe de trapalhões (Temer, Padilha, Marum e Moreira Franco), do Legislativo comandados pelos investigados Maia e Eunício, tivemos o presente de ver o judiciário envolvido em um festival de sandices e trapalhadas.
Tenho para comigo que a capacidade de nos envergonhar é contagiosa. Não bastasse o Liberador Geral da União com seus inúmeros Habeas Corpus concedidos, no que pese os atos cometidos pelos meliantes, no que pese a tese da plausibilidade levantada encampada por outros ministros garantistas, no que pese a decisão tomada algumas vezes pelo pleno do STF de que se pode prender quando há sentença transitado em julgado em segunda instância, há os que não a acatam e, em decisão monocrática, se rebelam contra a decisão colegiada. Liberam quem, por atos analisados, com o direito à defesa e ao contraditório, são condenados. Mas, usando de estratagemas e selecionando quem deve julgar, são liberados. Nem tornozeleiras precisam usar!
O recente evento com o petista, ex-afiliado ao partido por quase duas décadas, ex-assessor de Tarso Genro, Dirceu e outros mais, indicado para o cargo pela Dilma, o agora desembargador Favreto, contrariando a lógica e a hierarquia, libera um condenado. Não há como não ver no episódio malandragem e manipulação. Os fatos e a “coincidência” do plantão com a entrada de pedido de libertação, mais os trâmites que o fato provocou, só mostra que o judiciário também é hábil em fazer trapalhadas. Mas não vejo que isto seja privilégio dos petistas. Basta prestar atenção ao envio do caso Alckmin para o TSE, da absolvição do Aécio por falta de provas (o que também vale para a Gleisi e Paulo Bernardo), ao arquivamento de processos pela demora nas investigações envolvendo o Daniel Vilela e seu pai, o ex-senador Maguito Vilela (ambos do MDB).
Mais que isto, mostra como há gente empenhada em fazer do judiciário instrumento político. Quem mais perdeu nestes fatos foi a credibilidade, porque revelou setores que não conhecem a imparcialidade e a impessoalidade. A figura espúria desde a ótica do direito constitucional e eleitoral do “pré-candidato” foi usada para fundamentar “fatos novos”. Ao aceitar o inexistente para fundamentar uma decisão, abre-se a brecha para que outras invenções sejam usadas. A atuação deste “magistrado” merece investigação, ainda que, por causa do espírito de corpo que permeia o judiciário, não tenho esperanças de que algo possa acontecer.
Na minha visão o fato teve o seu parto na tese da “plausibilidade” defendida por outro magistrado que atuou nas lides petistas: Dias Toffoli. Penso ainda que o direito brasileiro, com sua penca de recursos possíveis, com todos os embargos, com a facilidade de se impetrar mandatos mil, de solicitar Habeas Corpus preventivo, vem se revelar como pernicioso para a condenação e efetiva aplicação da pena. Haja visto o que aconteceu com o Maluf: o tempo de tramitação e o cumprimento da pena em domicílio. Outros mais, que confessaram seus crimes, estão também no aconchego de seus lares, desfrutando de suas mordomias.
Se alguma esperança havia, gerada pelo julgamento do Mensalão e das várias sentenças prolatadas e cumpridas pela Lava Jato, a minha esperança foi assassinada. Instala-se em mim a consciência de que vivemos profunda crise institucional, ética e moral. E o pior: às portas de uma eleição insossa.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 4 de julho de 2018

TENHO MEDO


TENHO MEDO
Medo todos o temos. Alguns com mais intensidade, outros menores. O problema não é tê-los, mas se deixar dominar por eles. Pior ainda é não reconhecer que eles existem.
Para não incorrer neste erro, quero nomear alguns que tenho e que moldam meu comportamento quando aparecem.
Tenho medo de quem tem explicação para tudo. Se você não está se sentindo bem, lá vem elas com a explicação de que você comeu isto ou aquilo. Se você tem uma diarreia, são prontas em escolher algo que possa ter feito mal. Se tem uma dor de cabeça, culpam do ar poluído ao travesseiro. Elas têm uma obsessão por explicações!
Tenho medo de quem tem respostas simplistas. Os maiores problemas e os mais complexos elas o resolvem com uma única decisão. Fastia-me e me dá medo quem vem com a conversa: "se eu fosse o presidente da república iria resolver o problema da corrupção em uma semana", "se fosse meu filho daria um jeito nele na hora", "garanto para você que resolvo isto no vá".
Tenho medo de quem fala muito. Fala sobre o que sabe e o que não sabe. O importante é falar. Cansam com sua verborragia. Um causo puxo outro causo e te alugam por horas.
Tenho medo de quem me ensina a fazer coisas sem que eu lhes tenha pedido. A frase "sabe o que você deve fazer” ou sua variante “eu, no seu lugar faria isto” me deixam aterrorizado. Eu não pedi a opinião, não vejo nelas competência para sair dando lições e lá vem elas me ditando o que devo fazer. O pior é quando, ao nos encontrarmos mais tarde, vem me cobrar se fiz ou não o que me ensinou. 
Tenho medo de quem dá receitas de remédio. Tenho medo de ter tosse, porque já ouvi todo o tipo de remédio, chá ou simpatia para parar de tossir. O pior é quando, no auge do desejo de ajudar, fazem a gororoba e te forçam a tomar a meleca que fizeram para "cortar a tosse".
Tenho medo de quem fica explicando Deus. “O que Deus quer te ensinar é ...”, “a vontade de Deus para a sua vida é ....", ‘Deus fez isto porque Ele quer ...”. As variantes são muitas, todas blasfemas.
Tenho medo de quem, mal me conhecendo, me elogiam.
Tenho medo de quem, me conhecendo muito, me criticam nas coisas que sabe que faço com sinceridade.
Tenho medo de quem fala mal do outros para mim, porque serei o próximo de quem elas falarão mal.
Tenho medo de quem vem com o discurso: “Deus me falou”, “o Senhor me orientou”, “ouvi a voz de Deus me dizendo”.
Tenho medo de quem dá ordens a Deus.
Tenho medo de ficar perto de políticos, porque posso perder algo.
Tenho medo de resultado de laboratório porque podem dizer que estou pior do que penso que estou.
Tenho medo dos autodidatas porque aprenderam sem ter que confrontar o que que aprenderam e por isto acham que são donos da verdade.
Tenho medo de quem começa suas frases com “na verdade”.
Tenho medo de comida típica.
Tenho medo de mim quando fico bravo.
Marcos Inhauser