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quarta-feira, 28 de outubro de 2020

A CELEBRAÇÃO DA DIFERENÇA

Se os seres humanos foram criados por Deus, concluímos que Ele nos fez diferentes por uma de duas razões: por capricho de Deus ou porque há um propósito. Quando Deus percebeu que não era bom o homem estar só, criou a companhia, que diferia em gênero: uma mulher. Para ser auxiliadora tinha que ser diferente. A ajuda vem da diferença. Quando duas pessoas iguais estão juntas, não podem se ajudar porque pensam e decidim de forma igual.

O mesmo se aplica à espiritualidade. Somos ajudados no crescimento espiritual quando convivemos com a diferença. Não é o cercar-se de gente igual que dá a certeza de estar certo. Há mais probabilidade de incorrer em erro quando cercado de gente igual do que quando de gente diferente.

Os iguais bajulam, porque dizem o que se gosta de ouvir, não criticam porque seria criticar-se, uma vez que pensam e agem igual. Quem se cerca de gente igual, ao invés de crescer, para no tempo e fica se deliciando com as verdades que crê e recusa as novas, porque envolvem o risco.

Por outro lado, se se cerca de gente com capacidade e a liberdade de questionar, perguntar, duvidar do que se crê, afirmar coisas diferentes, a convivência será caracterizada pela constante reflexão, análise e reposicionamento. Quando se revê pensamentos e os avalia criticamente à luz de posições divergentes, há amadurecimento. A maturidade não está na certeza e na repetição ad infinitum das verdades. Ser um poço de certezas é ser inseguro e de imaturo. O ignorante é o que mais sabe e Sócrates dizia que uma coisa sabia: que nada sabia.

O sábio não se conhece pela quantidade de certezas que tem, mas pela qualidade das perguntas que faz. O maduro não precisa dizer “quem manda sou eu”. Isto é sinal de imaturidade e ignorância. Obrigar que sua verdade seja a verdade de todos é um ato de estupro intelectual. Se, como afirma Foucault, a verdade é versão dos poderosos, ter que afirmar a própria autoridade é autoritarismo. Quem deste recurso necessita dá provas de insegurança e burrice.

Estas reflexões me levam ao ecumênico. Tenho visto gente na defensiva e no ataque ao ecumênico. Acusam-no de tudo pelo fato de colocar pessoas que pensam diferente para conversar e encontrar caminhos comuns. O ecumenismo é uma proposta para gente madura, sem medo do diferente, do novo, de avaliar-se e até reconhecer que está errado. O ecumênico é um risco para os donos da verdade, porque elas podem ser falsas. Os inseguros se lançam ao ataque difamatório. Donos da verdade e ditadores em suas comunidades, não tem maturidade para o diálogo, porque treinados no arbítrio. Pregam como verdade o que creem, sem dar chances de serem questionados ou criticados.

Estes se esquecem que Paulo diz que nos últimos tempos cercar-se-iam de mestres segundo as suas cobiças e que estariam rodeados de gente igual. Nada mais tentador e arriscado para a fé que cercar-se de iguais. No antigo Israel a diferença foi feita pelos profetas, que anunciavam o diferente, que quebravam o discurso dogmático e questionavam os sacerdotes e reis. Era o questionamento da verdade do poder (político dos reis e religioso dos sacerdotes), porque o poder, via de regra, necessita do diálogo e da diferença para ser verdadeiro. Necessita da parresía, o discurso da verdade, feito pelos que se opõem. Democracia sem oposição é o governo do demo.

 

Marcos Inhauser

 

quarta-feira, 13 de março de 2019

A RETÓRICA E A PARRESIA


Michel Foucault, em uma de suas últimas aulas (01/08/94), fez comentários sobre o exercício da retórica e a parresia (que é o falar a verdade, sem esconder nada). Para ele, “na retórica não há vínculo entre aquele que fala e o que ele diz, mas a retórica tem por efeito estabelecer um vínculo obrigatório entre a coisa dita e aquele ou aqueles a quem ela é endereçada ... está no exato oposto da parresia”.
A parresia, por sua vez” estabelece entre aquele que fala e o que diz um vínculo forte, necessário, constitutivo, ... (que) se abre sob a forma de risco ... entre aquele que fala e aquele a quem ele se endereça. ... aquele a quem ele se endereça sempre pode não acolher o que lhe é dito. Ele pode (sentir-se) ofendido, pode rejeitar o que lhe dizem e pode, finalmente, punir ou vingar-se daquele que lhe disse a verdade”. É o falar sem dissimular.
Voltei a ler estes textos do Foucault em função de coisas acontecidas no passado recente e no presente da política brasileira. Não posso esperar de Foucault uma digressão sobre o significado e as consequências das Fake News, mesmo porque, nada data em deu suas últimas aulas, tal conceito ainda não havia sido elaborado. No que pese a isto, não posso desconsiderar que o termo é mais novo, mas o uso de meias verdade ou mentiras propositais sempre fizeram parte da política. Parece-me que a palavra “demagogia” está muito próxima ao conceito de retórica de Foucault, e é irmã gêmea de Fake News.
No anedotário político brasileiro há inúmeros exemplos de demagogia. Conta-se que Ademar de Barros subia ao palanque e, antes de começar a falar, tirava do bolso um sanduíche de mortadela, para que as pessoas o considerassem uma pessoa do povo. Também se conta que, quando suava em seus discursos, tirava do bolso um lenço e, propositalmente, caía um terço que ele o apanhava no chão e, com toda a reverência, o beijava e o recolocava no bolso. Assim fazia para mostrar que era católico fervoroso. Jânio Quadros afirmava que a Coca-Cola era um veneno e que iria fechar a fábrica e proibir o comercio do refrigerante. Nunca o fez e se sabia que era bravata eleitoreira.
A onda de Fake News, propiciada pela proliferação das redes sociais, onde pessoas reais, perfis falsos e robôs disseminam notícias e inverdades, é algo que está entre o demagógico e a retórica no sentido proposto por Foucault: sem nenhuma relação entre o que “envia as mensagens” e o que “recebe as mensagens”, sem conexão com a verdade dos fatos. Um paradoxo da problemática é que quem condena as Fake News, se vale delas para conseguir seus propósitos, haja visto os recentes episódios, tanto na política brasileira como na estado-unidense.
Exemplo claro desta retórica dissimuladora são os discursos do autocrata Maduro, diagnosticando como ataque do imperialismo ianque o que se sabe é incompetência do falastrão.
Tenho para comigo que os falastrões e Instagramers poliativos (para usar um neologismo para me referir às novas formas de falastrões midiáticos) são mais tendentes a ser retóricos e demagógicos, quando não fabricantes e disseminadores de inverdades ou meia verdades. Exemplo disto foi a controvérsia com o Bebiano, se falou ou não com o pai, quando este estava no hospital e mais recentemente a da jornalista do Estadão.
A parresia tem um preço e parece que os políticos não têm disposição de pagar. Quem paga o pato é o povo que engole meias verdade como verdade final.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 21 de março de 2018

A VERDADE LIBERTA


A máxima proferida por Jesus de que "conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" é essencial para os dias que estamos vivendo. Diferentemente do que dizem intérpretes afoitos e pregadores mal alfabetizados, o texto se refere a qualquer verdade e não somente à verdade do Evangelho.
Esta diferenciação se faz necessária e importante porque a mentira escraviza. Uma mentira produz a segunda mentira, gerando um círculo vicioso e de escravidão em que o restabelecimento da verdade é a única forma de romper a escravidão.
Qualquer verdade é libertadora. Por mais difícil e cara que a verdade seja, o preço dela é menor que o preço da mentira.
Quem viveu em cidades pequenas antes do advento da internet, quem viveu em círculos fechados, tinha que lidar constantemente com os boatos e as fofocas. As fofocas eram o prato diário das conversas e haviam pessoas especializadas em criar e difundir fofocas. Até nome tinham: fofoqueiras ou candinhas.
No mais das vezes, estas pessoas ficavam à espreita de vizinhos ou conhecidos e interpretavam malevolamente qualquer sinal que viam: podia ser um carro que parasse na frente da casa, o horário que chegava ou que saia, quem visitava, quando compravam alguma coisa e o caminhão vinha entregar, a reforma que faziam, ou a filha que estava engordando.
Muitas vezes, reputações ilibadas eram atiradas na lama de onde era quase impossível sair. Muitas destas pessoas mudaram de cidade para salvar-se do estigma que sobre elas as fofocas colocaram.
Os tempos mudaram. As candinhas modernas estão à espreita nas redes sociais e na internet. Tal como nas pequenas cidades, não há a preocupação de se verificar a veracidade das informações repassadas e cada qual aumenta a sua versão, coloca o seu tempero e acrescenta fatos e dados à invencione.
Exemplos modernos de fofoca existem aos milhares. O FBI está investigando o uso destas fofocas para influenciar a eleição presidencial, gerando notícias falsas dirigidas à opositora na eleição e facilitando a eleição do Trump.
Sabe-se hoje que as duas ou três últimas eleições presidenciais brasileiras também tiveram este expediente. Busca-se acabar com as fake news nas próximas eleições. Tarefa inglória e impossível. O máximo vai se conseguir minimizar os prejuízos, nunca erradicar a fofoca.
O exemplo mais gritante é a recente onda de notícias relacionadas à morte e às atividades e vida particular da vereadora Marielle. Há pessoas que parecem justificar o assassinato alegando fraudulentamente que a assassinada teria ligações com o narcotráfico, ou que teria sido engravidada aos 16 anos, ou que teria sido esposa de um traficante. Levando a lógica às últimas consequências, qualquer mulher grávida aos 16 ou que tenha se casado com alguém posteriormente considerado bandido, pode ser morta porque o seu assassinato está justificado.
No universo das fofocas virtuais o que assusta é que um ex-coronel, hoje deputado e uma atual desembargadora tenham publicado notícias mentirosas. É verdade que vieram a público se desculpar da insensatez de veicular o que não haviam checado. É inadmissível que pessoas com estes cargos cometam tais equívocos. Recebo todos os dias uma quantidade de e-mails, links de vídeos, propostas de pauta de agenda para publicação que não me dão segurança de que sejam verdade. Já recebi sobre a renúncia do Temer, sobre a morte do Lula, sobre a vinculação do tráfico na biografia de várias pessoas. Ainda que as pessoas que me enviaram tenham sido por mim ou por outras pessoas alertadas para a disseminação de notícias falsas, parece que fazem ouvidos moucos e, no afã de serem curtidos, continuam a espalhar fofocas.
Mais do que nunca é necessário que a verdade seja estabelecida. Estamos vivendo em uma sociedade recheada pela mentira, disseminada pelos incautos com pessoas feridas ou tombadas pelas calúnias. Há poucos dias um pai foi inocentado da acusação de abuso sexual pelas próprias filhas que supostamente, teriam sido abusadas. Elas alegavam que foram pressionadas e forçadas pela mãe a denunciar o pai. 
Emblemático na história noticiosa brasileira são os casos da Escola Base e do ex-deputado que se sentiu destruído pelas inverdades e escreveu um livro sobre o assassinato de reputações. 
Credibilidade é coisa rara na sociedade atual. O que vale é receber curtidas e visualizações nas redes sociais, não importa como obtê-las. Ainda que os mecanismos de busca, os provedores, os sites de relacionamento e as redes sociais estejam buscando diminuir o número de notícias falsas, não podemos deixar de dizer que cada um deve assumir um compromisso com a verdade.
Se há violência armada, há violência verbalizada e fofocada. A verdade pede espaço neste universo.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

CONHECEREIS A VERDADE

Minha coluna sobre a “Controvérsia sobre a verdade”, escrita há três semanas, me rendeu vários e-mails de crítica e pedidos de melhor posicionamento sobre o assunto. Minha impressão é que houve eleitores que confundiram a provocação à reflexão com uma posição teológica pessoal. Terminava minha coluna com este parágrafo: “Quem afirma que Jesus é a verdade e que ele, sendo a verdade, liberta, tem em si, no bojo desta afirmação, questionamentos sérios. Se a verdade é ele, conhecer a ele é ser liberto. Mas qual dos Jesus devemos conhecer? O descrito nos evangelhos sinóticos ou na teologia joanina? Ou o Jesus das pregações paulinas? Ou o Jesus da tradição eclesiástica? O Jesus da leitura teológica, instrumentalizada com aparato crítico e exegese nas línguas originais, ou o Jesus da leitura simplista? Qual deles é a verdade?”
Afirmar que Jesus é a verdade traz questionamentos. Ei-los: se Jesus é a verdade, ele é a verdade sobre qual assunto, evento, afirmação ou relação? Dizer que ele é a verdade no sentido de que é a verdade sobre tudo é negar a essência do ser verdade. Não existe uma verdade única que sirva para todos os assuntos. Toda verdade é relativa a um tema em particular e se Jesus é a verdade, devemos definir sobre qual assunto ele é a verdade. Há uma área específica sobre a qual ele é a verdade e isto não está definido pelos que afirmam dogmaticamente ser ele a verdade. Quando ele fala que é “o caminho, a verdade e a vida” estava afirmando a especificidade deste ser verdade: “ninguém vem ao Pai senão por mim”. No entanto, ao afirmar “conhecereis a verdade e ela vos libertará”, sobre qual tema estava se referindo?
Perceba-se que ele afirma “verdade” e não “verdades”. A singularidade é fundamental. Sobre qualquer assunto há uma verdade. Em tese, não pode haver mais de uma verdade sobre um mesmo assunto. Ocorre que, um mesmo assunto comporta mais de uma verdade, cada qual se referindo a um aspecto específico do assunto, a uma fatia do salame. Exemplifico: a afirmação de que “o Brasil vive uma crise” é uma verdade. “A crise brasileira é política”: também é verdade, mas não é toda a verdade, porque ela também é fiscal, moral, ética, social, etc. Assim, há uma verdade para cada área que se considere.
Se conhecer a verdade liberta, conhecer a Jesus liberta do quê? Muitos afirmarão que ele liberta do pecado, mas concordarão que quem o conhece, continua pecando. Outros dirão que ele liberta da escravidão do pecado, mas a vida diária mostra que ainda somos escravos do pecado, porque há áreas da vida nas quais pecamos e que, por mais esforço que se faça, não conseguimos deixar de pecar. Outros afirmam que ele é a verdade sobre Deus, uma coisa impossível visto ser Deus incognoscível na sua plenitude, sendo, portanto, impossível conhece-lo por uma única afirmação verdadeira. Nós o conhecemos parcialmente por uma somatória de verdades.

Para se ter melhor compreensão deste conceito de verdade que o evangelho de João traz, temos que nos aprofundar na teologia joanina e esquecer textos fora deste universo de pensamento. Buscar respaldo em teologias outras, mesmo que bíblicas (paulina, petrina, jesuânica, apolina, sinótica, etc.) é buscar nas afirmações da Dilma toda a verdade sobre Eduardo Cunha.
Marcos Inhauser