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quarta-feira, 12 de junho de 2019

O COLEGIADO DOS DIFERENTES


Há os que, no fundo, criticam o fato de Ele ter escolhido doze, de cepas tão diferentes, comportamentos variados e visões de mundo incongruentes. Por que Ele escolheu do revolucionário (Judas, o Iscariote) ao meloso João, passando pelo odiado publicano, coletor de impostos?
Para a empreitada que tinha em mente não teria sido mais lógico e prudente escolher uma elite de estudiosos, oradores, teólogos e renomados religiosos? Não teria sido melhor começar seu ministério a partir da capital nacional e religiosa, Jerusalém? Não teria sido estratégico fazer aliança com os sacerdotes?
A opção periférica do ministério de Jesus é acessória ou é essencial? Ainda que os evangelhos mostrem enfoques diferentes sobre a obra e ministério de Jesus, todos concordam com sua origem a partir de uma família simples, morando em lugares sem expressão, iniciando o seu ministério com alguns também sem expressão social, fazendo curas e milagres em lugares pequenos e sem capacidade de grande repercussão.
Estas considerações me vêm à mente por causa de uma plêiade de coisas. Vejo uma fascinação de certos líderes religioso pelo grandioso, pelo poder, pela exposição midiática, pelas construções faraônicas. A vitalidade de uma igreja se mede pela quantidade de horas de televisão que tem, pelos metros quadrados de construção, pela quantidade de gente reunida, pela arrecadação.
Parece que o exemplo que Jesus deixou da bacia e da toalha, lavando os pés aos discípulos, não tem lugar neste universo de pompa e circunstâncias. O amor ao próximo na sua necessidade deu lugar ao amor à estrela do momento. Gastam-se fortunas para ir ver o “cantor gospel do momento”, para produzir Marchas para Jesus. A vida cristã é feita de empolgação e nada de instrução. Vale o que se sente e não o que se pensa e crê.
Há quem creia que a igreja está bombando porque tem uma esposa do presidente que é membro de uma igreja batista, porque um dos deputados mais próximos é o Marcos Feliciano, o Silas Malafaia é amigo, que o presidente mencionou que deve haver um evangélico no STF, que a bancada evangélica é composta por mais de 90 deputados e senadores, que há chances de que o novo presidente seja evangélico, etc.
O cerne do evangelho que é amar a Deus e ao próximo como a si mesmo. Isto está, há muito, na berlinda da prática cristã. Busca-se a homogeneização das práticas “litúrgicas” (ainda que eu tenha meus pruridos em dizer que o que se faz é algo parecido à liturgia), uma busca acelerada por algo que seja “diferente” na concepção da “doutrina”. A máxima é a do surfista: o que importa é estar na crista da onda.
O recente episódio em que um pastor esfaqueou o outro por desavenças quanto a posições bíblicas divergentes, no que pese ser um ato isolado, é sintomático da dificuldade em conviver com o diferente. Se pudessem interfeririam na escolha feita por Jesus de apóstolos tão diferentes. O certo seria ter um grupo coeso, unido, marchando ao passo marcado pelos princípios bíblicos.
A ortodoxia deve ser buscada, entendida como todos afirmando as mesmas coisas e se reunindo nos mesmos horários e nos mesmos locais. Para o diferente, o inferno!
Marcos Inhauser

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

A PAZ E AS DIFERENÇAS

O profeta Zacarias disse certa feita que “Alegra-te muito, ó filha de Sião; exulta, ó filha de Jerusalém: eis aí te vem o teu Rei, justo e salvador, humilde, montado em jumento, num jumentinho, cria de jumenta. Destruirei os carros de Efraim e os cavalos de Jerusalém, e o arco de guerra será destruído. Ele anunciará paz às nações; o seu domínio se estenderá de mar a mar e desde o Eufrates até às extremidades da terra.” (9:9,10)
A entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, montado em um jumento, deve ser vista como a diferença de sua visão. Ele não veio montado em cavalo, animal usado pelos soldados guerreiros. Veio no jumento, porque sua mensagem não era a do arco e espada, mas a da paz, da verdade e do amor. Veio não da forma esperada, mas quebrando paradigmas.
Para se entender o conceito cristão de paz é preciso quebrar os paradigmas que nos levam a pensar que a paz reina quando não há guerra, não há conflito. No entanto, esta é uma visão reducionista da paz cristã. Tomando por base a concepção antiga do shalom, a paz cristã tem a ver com saúde, harmonia, ausência de violência em todos os seus níveis (físico, emocional e psicológico), com moradia segura, alimentação necessária, com descanso regular, com reconciliação e outras coisas mais.
Sem a reconciliação não há paz. Sem o perdão não há paz. Sem a tolerância não há paz. Em uma sociedade onde reina a intolerância, onde torcedores de uma equipe agridem a matam os de outra equipe, onde o diferente é pisoteado, o homossexual é execrado pública e privativamente, onde o negro é desprezado por ter uma cor diferente, onde o gordo é visto como glutão ou sem autocontrole, a paz é um imperativo iniludível e uma prática impostergável.
Mas o evangelho da paz não é o anúncio de uma vida fácil e cômoda. A fidelidade a Deus e a Seu Filho, que implicam em práticas de paz, implicam em perseverança. As dificuldades não nos devem assombrar, antes fortalecer, uma vez que fomos alertados: “neste mundo tereis aflição, tende bom ânimo, eu venci o mundo”. Não devemos esperar melhores tempos que os profetas e Jesus tiveram. Todos eles, na sua proclamação e prática da paz, padeceram e não poucos morreram por ela.
Isto é paradoxal. Ao proclamarmos e praticarmos a paz seremos alvos da violência dos que ganham com a exploração do próximo, dos que são corruptos, ladrões. Evitar a perseguição por meios desonestos é desonestidade igual à praticada por quem persegue. Há um preço a se pagar pela paz.
Saliente-se que Jesus iniciou seu ministério pregando o arrependimento e a chegada do Reino de Deus, um reino de paz. Isto se daria não pela reforma das instituições políticas e econômicas existentes, mas pela vivência de uma nova comunidade, alicerçada em um novo paradigma: amor ao próximo como a si mesmo. Se se ama o outro na mesma intensidade com que se amo a si mesmo, não há lugar para depreciar, mesmo que seja ou pense diferente. A diferença não será motivo para separação e exclusão, mas para conhecimento, enriquecimento com o conhecimento e vivência da diferença: isto é paz.
Aceitar o outro na sua condição, com suas ideias e comportamento é amor. Discriminar, acusar, vilipendiar porque é diferente é ser prepotente, arrogante e assassino do outro. Nesta atitude não se promove a paz.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

TOLERÂNCIA NÃO É CONCORDÂNCIA

Ser intolerante é discordar e desaprovar. Não há como ser intolerante sem se posicionar contra o pensamento alheio, contra a diferença. A recíproca (tolerância = concordância) não é verdadeira.
Se sou intolerante eu tenho opinião formada sobre algo e não aceito que alguém possa ter opinião diferente. Isto se aplica à superioridade racial, religiosa, comportamental, sexual, etc. Por ser intolerante, quero que todos pensem igual a mim e só me alio aos iguais.
Por outro lado, se aceito que pode haver quem pense, aja, decida, seja diferente de mim, isto não implica, necessariamente, que concordo com a posição que o outro tem. Posso discordar respeitosamente, sem impor meu ponto de vista ao outro.
Olhando no retrovisor da minha vida, dou graças a Deus porque Ele me deu a chance de conviver com a diferença. Durante nove anos tivemos a Vera morando e trabalhando conosco. Ela era surda e muda. Tivemos o seu Pedro morando mais de um ano em nossa casa e ele era portador de hanseníase. Tivemos uma mulher indígena que trabalhou em nossa casa no Equador e ela tinha seus costumes bem diferentes dos nossos. Temos a Daisy morando conosco há quinze anos e ela é esquizofrênica.
Eu entendia e entendo a deficiência deles e nunca precisei ser tolerante com eles. Aprendi a lidar com as deficiências de cada um, da mesma forma como aprendi a lidar com as características de meus três filhos e da minha esposa e, com eles, também tive que “ser tolerante”.
Quando me relaciono com negros não preciso ser tolerante. Entendo, aceito e vivo a igualdade. A cor da pele não me obriga a ser tolerante. Eu aceito.
Há outras coisas que respeito, cultivo a tolerância, mas que não concordo. Entendo as diferenças religiosas, mas isto não significa que concordo com as doutrinas espíritas, budistas, islamitas ou judaicas. Respeito o direito de crerem diferentemente de mim, posso conversar, trabalhar junto, mas isto não quer dizer que concordo com o que creem ou pregam. Em muitos casos sou co-beligerante, mas não aliado.
Entendo a opção/orientação sexual, respeito, mas isto não quer dizer que concordo com o homossexualismo. Posso ter amigos e até pessoas que frequentam minha casa ou a igreja que se assumem homossexuais. Não tenho o direito de expulsá-los, de ofendê-los, de menosprezá-los, mas não posso por isto ser acusado de ser pró homossexual. Na minha vida já tive muitos homossexuais que vieram à igreja. Meu estudo de caso para o Doutorado foi com uma comunidade gay a qual pesquisei por quatro anos e fui expulso por eles quando eu disse que estava ali para estudar um caso e não para concordar.
Por outro lado, não concordar com algo não significa ser intolerante. Torna-se intolerância quando ofendo, agrido, busco constranger a ser igual a mim, imponho meus posicionamentos, uso de algum desequilíbrio de poder para forçar o outro a pensar como eu.
O fato de criticar coisas, governo, partido, igrejas, gurus evangélicos, estrelas do mundo gospel, políticos não é intolerância. É discordância. É usar da minha liberdade de pensamento e expressão. Ao expressá-la posso conseguir quem concorde comigo e quem discorde educadamente e isto é tolerância.

A agressão, a ofensa, a mentira são formas de intolerância!
Marcos Inhauser

quarta-feira, 20 de maio de 2009

A BENÇÃO DA DIFERENÇA

Se os seres humanos foram criados por Deus, concluimos que Ele nos fez diferentes por uma de duas razões: por capricho de Deus ou porque há um propósito. Quando Deus percebeu que não era bom o homem estar só, criou a companhia, que diferia em gênero: uma mulher. Para ser auxiliadora tinha que ser diferente. A ajuda vem da diferença. Quando duas pessoas iguais estão juntas, não podem se ajudar porque iguais.
O mesmo se aplica à espiritualidade. Somos ajudados no crescimento espiritual quando convivemos com a diferença. Não é o cercar-se de gente igual que dá a certeza de estar certo. Há mais probabilidade de incorrer em erro quando cercado de gente igual do que quando de gente diferente.
Os iguais bajulam, porque dizem o que se gosta de ouvir, não criticam porque seria criticar-se, uma vez que pensam e agem igual. Quando se cerca de gente igual, ao invés de crescer, para-se no tempo e fica se deliciando com as verdades que se cre e recusa as novas, porque envolvem o risco.
Por outro lado, se se cerca de gente com capacidade e a liberdade de questionar, perguntar, duvidar do que se crê, afirmar coisas diferentes, a convivência será caracterizada pela constante reflexão, análise e reposicionamento. Quando se revê pensamentos, os avalia criticamente à luz de posições divergentes, há amadurecimento. A maturidade não está na certeza e na repetição ad infinitum das verdades. Ser um poço de certezas é ser inseguro e de imaturo. O ignorante é o que mais sabe e Sócrates dizia que uma coisa sabia: que nada sabia.
Estas reflexões me levam ao ecumênico. Tenho visto gente na defensiva e no ataque ao ecumênico. Acusam-no de tudo pelo fato de colocar pessoas que pensam diferente para conversar e encontrar caminhos comuns. O ecumenismo é uma proposta para gente madura, sem medo do diferente, do novo, de avaliar-se e até reconhecer que está errado. O ecumênico é um risco para os donos da verdade, porque podem ser falsas. Os inseguros se lançam ao ataque difamatório. Donos da verdade e ditadores em suas comunidades, não tem maturidade para o diálogo, porque treinados no arbítrio. Pregam como verdade o que creem, sem dar chances de serem questionados ou criticados.
Estes se esquecem que Paulo diz que nos últimos tempos cercar-se-iam de mestres segundo as suas cobiças e que estariam rodeados de gente igual. Nada mais tentador e arriscado para a fé que cercar-se de iguais. No antigo Israel a diferença foi feita pelos profetas, que anunciavam o diferente, que quebravam o discurso dogmático e questionavam os sacerdotes e reis.
Quando se celebra nestes dias Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, é hora de aceitarmos que o propósito de Deus é a vida com a diferença.

Marcos Inhauser