A política se faz no parlamento, local onde se “parla” (se
fala). Logo, o exercício da política está visceralmente relacionado ao uso da
palavra, seja para os discursos, seja para as negociações. A fala política
acontece no plenário, usando-se a tribuna ou o microfone aberto. Enquanto o
orador fala, no mais das vezes, os que deveriam ouvir estão envolvidos em outro
tipo de fala: ao pé do ouvido, aos sussurros.
Tem-se assim a fala política em duas dimensões: a pública e
a privada. Na primeira, o orador, no mais das vezes, fala o que, entende, seus
ouvintes querem ouvir, especialmente na fala em busca de votos ou na
preservação dos obtidos, como garantia da reeleição. Não são raras as vezes em
que esta fala é cínica, hipócrita, mentirosa, tergiversante. Tenho para mim que
a política efetiva se faz nos corredores, nas salas fechadas, na conversa ao pé
de ouvido, porque ali os filtros éticos são menores e, portanto, onde as
maracutaias acontecem.
Mas há outra fala que vem me chamando a atenção: a de
derrubar provas via gogó. Não sou perito em história política brasileira, mas
acho que foi o Carlos Lacerda quem institucionalizou o discurso verborrágico
para fazer prevalecer a sua verdade. Jânio Quadros fazia prevalecer a sua
verdade no gogó e pressionado para explicar sua renúncia, sempre se saia com a
explicação genérica de que foram as forças ocultas.
Mais recentemente temos outros exemplos de gente que quer
fazer prevalecer a sua versão no gogó: Eduardo Cunha, Collor, Rui Falcão,
Renan, Lula, e outros mais. No que pese as provas recolhidas nas investigações,
ao invés de apresentarem o contraditório, elencando explicações específicas
para cada item apontado, preferem usar o gogó para atacar as investigações, as
instituições, o judiciário, os juízes e a polícia. Acham que suas falas
destroem provas, extratos bancário, notas fiscais e outras evidências. Ao invés
de se defenderem nos autos, preferem os alto-falantes!
As arengas são, em essência, as mesmas: motivação política,
o grupo que lhe faz oposição montou esquema para incriminá-lo, é coisa
requentada, dorme tranquilo, tem a consciência limpa, o que tem foi fruto do
trabalho honesto, não pode se responsabilizar pelo que os assessores fizeram,
não sabia, não viu, não conheço, nunca me reuni com ele, esta assinatura não é
minha, forjaram provas, todas as contribuições foram declaradas, as contas
foram aprovadas, apareceu um dinheiro na minha conta e não sei do que se trata,
etc.
Ocorre que este tipo de comportamento se dá fora do círculo
da política. Mesmo no campo religioso ele ocorre. Basta uma pesquisa na
internet para ver a quantidade de vídeos de “pastores” usando o gogó para se
dar bem ou para atacar quem os acusa de manipulação, apropriação de
contribuições, manipulação dos membros, constrangimento moral, etc.
Por outro lado, há os que, bons de gogó, quando pilhados nas
suas falcatruas, mesmo sendo oferecida a oportunidade de se explicar, preferem
o mantra: “reservo-me no direito de permanecer calado” ou simplesmente ignoram
como se nada fosse com eles. Bons de gogó, preferem o mutismo. Para estes a
explicação de que o gogó é o pomo de Adão, explicação tergiversada de que se
trata de pedaço da maçã que Adão comeu e que ficou entalada na garganta ocorre
ao inverso: entalada, a voz não sai!
Entalada está na garganta a indignação popular com o gogó
dos gerentes de falcatruas, dos pagadores de propina, dos pregadores de falsos
milagres e prosperidade, dos hóspedes recorrentes nos palácios, dos comensais
dos restaurantes da moda, pagos com o dinheiro do povo, seja via impostos ou
ofertas de crentes.
Marcos Inhauser