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quarta-feira, 2 de setembro de 2020

PRIVILEGIANDO NEGÓCIOS DE NEGROS

Não me lembro onde foi que li. Sei que era uma publicação em inglês e, provavelmente, de um grupo anabatista dos Estados Unidos. Historicamente os anabatistas têm tido posições e proposto movimentos semelhantes, trabalhando causas relacionadas à justiça e à paz.

A partir dos problemas de violências contra negros nos Estados Unidos, coisa que já ocorre há muito tempo em função do racismo estrutural, alavancado pelas violências contra o George Floyd e Jacob Blaker, a proposta era de que se privilegiasse a compra em negócios cujos donos fossem negros. Achei interessante e pensei: vou fazer isto.

Comecei a percorrer mentalmente os negócios onde tenho comprado as coisas: alimentos, remédios, pães, bolos, material de construção, papelaria, restaurantes, lanchonetes, serviços de conserto de eletrônicos, oficina mecânica, feira, etc.

Fiquei assustado! Não encontrei um só negócio que tenha um proprietário negro. Rodei as lembranças e não me lembrei de ter visto algo assim há muito tempo. Rodei a memória mais ampla: locais onde houvesse negros trabalhando. Nada! Ampliei o espectro para as cidades onde já morei e os negócios que costumava frequentar e usar. Nada!

Ao final de muitas lembranças e recorridos mentais, lembrei-me de duas farmácias que têm atendentes e caixa que são negras. Em uma delas, elas trabalham no período da madrugada! Não consegui me lembrar de um restaurante onde houvesse um garçom negro, uma lanchonete onde houvesse um atendente negro, uma padaria onde o padeiro fosse negro.

A coisa me intrigou e comecei a pensar se sou eu que não sei escolher os negócios que uso, ou é um problema estrutural. Perguntei a algumas pessoas conhecidas e a constatação foi a mesma: os negócios são brancos.

Já tive pedreiros e serventes negros trabalhando em minha casa. Já tive pintor, encanador, eletricista, e alguns deles eram negros. Serviços braçais. Rodei a memória e só me lembro de um professor negro que tive, nos Estados Unidos.

Há algo de errado. Quando morei nos Estados Unidos, tinha por costume ir com a família para as igrejas negras, por causa da música e dos corais. Sempre achei que os Estados Unidos é a nação mais racista do mundo e que o dia mais racista é o domingo de manhã quando as igrejas se reúnem: brancos e negros em igrejas separadas. Fui, certa vez, a convite de um colega de curso, pastor de uma igreja negra, assistir a Cantata da Páscoa. Depois da Cantata ele me convidou para ir ao púlpito com ele e dar uma saudação à igreja. Ele fez questão de dizer que, nos 35 anos daquela igreja, era a primeira vez que um branco subia ao púlpito e falava à igreja!

É verdade que não temos isto no Brasil, mas também é verdade que, nas igrejas protestantes e as chamadas históricas, os negros são raridade. Certa feita fui assistir uma Cantata de Natal em um templo que tinha umas duas mil pessoas. Nenhum negro ou negra no coral e não consegui achar um só no meio dos assistentes. Podia ter, mas não vi. É raridade.

Já escrevi aqui uma coluna “O Shopping é Branco”. Tenho que dizer: os negócios são brancos. As igrejas de classe média são brancas. O acesso ao pastorado nas igrejas protestantes e históricas tem degraus altos para que os negros possam subir. Os negros na Câmara Municipal, Assembleia Legislativa, Câmara e Senado, são poucos (há raríssimas exceções). Os ministros são brancos.

Falta cor nos espaços públicos do Brasil!

Marcos Inhauser