Leia mais

Há outros artigos e livros de Marcos e Suely Inhauser à sua disposição no site www.pastoralia.com.br . Vá até lá e confira

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

DEPOIS DE QUINHENTOS ANOS

É significativo que as duas maiores transformações da sociedade ocidental tenham suas origens em acontecimentos religiosos cristãos: o nascimento de Cristo e a reforma religiosa do séc. XVI que neste 31 de outubro completa quinhentos anos.
Uma visão simplista deste segundo evento o considera como sendo de conotação espiritual, um agir do Espírito para a retomada dos valores do cristianismo dos quais a igreja havia se desviado, algo que aconteceu porque o monge Lutero recebeu uma iluminação especial.
Isto é verdade, mas não toda a verdade. A Reforma não teria sido o que foi se tivesse se limitado aos pensadores (sacerdotes e filósofos) e à nobreza. Ela teve impacto porque teve apoio popular.
Este apoio se deu mais por razões políticas que por convicções religiosas. A sociedade europeia do séc. XVI era feudal (baseada na iníqua equação de direitos da nobreza e deveres da plebe), onde os pobres tinham chances quase nulas de reverter sua situação pela obtenção de salários mais justos, pagamento de menos impostos ou acesso à propriedade.
Lutero, ao atacar o poder papal de decretar indulgências (perdão de pecados que eram vendidos para financiar a pompa papal e a construção da catedral de São Pedro), atacou também o poder de excomunhão, que era o instrumento político usado pelo Vaticano para submeter a população e a nobreza, mantendo assim o estado feudal que tanto lhe interessava. Desde cedo o povo percebeu que as teses de Lutero eram revolucionárias porque podiam reverter o quadro social, político e econômico em que viviam.
A análise mais atenta da Reforma mostra que este engajamento popular permitiu que se reformasse não só a religião vigente, mas a sociedade. Assim, a Reforma só foi um evento significativo porque mexeu também com as estruturas sociais.
As propostas de reforma social partiram não de formulações filosóficas ou econômicas, mas do compromisso em obedecer ao princípio reformado de “Sola Scriptura”.
Ao fazerem mudanças na ordem política e econômica, o fizeram a partir da visão teológica sobre a injustiça e o pecado. Calvino, em Genebra, criou a assistência semi-estatal para os inválidos, doentes e velhos, promoveu a luta contra a imoralidade, fiscalizou os preços, regulamentou o trabalho, estabeleceu feriados e a guarda do domingo, promoveu a educação (André Bielér. O Pensamento Econômico e Social de Calvino. S. P.: Casa Editora Presbiteriana, 1990, p. 102).
O mesmo se pode dizer dos reformadores radicais, os anabatistas. A partir da convicção de que as questões de fé são de foro íntimo e que ninguém pode decidir o que o outro deve crer, defenderam o batismo de adultos como forma de se respeitar o princípio e negaram o poder estatal de decidir qual a religião que os súditos deveriam ter. Como consequência disto, nascem os conceitos de liberdade de consciência e a separação da Igreja e do Estado. Na sua vertente mais radical, Tomas Muntzer promove a guerra dos camponeses para que estes tivessem acesso à terra.
Vivemos uma situação social de excludência da maioria, atirada à pobreza por mecanismos econômicos injustos, onde verbas sociais são cortadas para financiar bancos falidos, o perdão dos pecados é vendido juntamente com as bênçãos da prosperidade.
Mais do que nunca é necessário que a igreja olhe para sua história que ensina o erro de se vender a benção (seja perdão de pecados, cura, libertação ou prosperidade), de crer em revelações extra-bíblicas trazidas pelos iluminados de plantão autointitulados de profetas e profetisas, deve combater com o compromisso da “Sola Scriptura”, da “Sola Gratia”, “Sola Fide”, “Soli Deo glori” e “Solus Christus”.

Marcos Inhauser

Nenhum comentário:

Postar um comentário