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quarta-feira, 9 de setembro de 2015

CRISTÃOS POLÍTICOS OU POLUÍTICOS?

Há alguns cristãos que se envolvem com a política e confundem as luzes que vêm das Escrituras e da igreja como sendo as do programa de um partido político e acabam transformando sua militância como igual à sua vida cristã. Eles se esquecem que Deus não está em competição com a natureza, mas que Deus e somente Deus pode ser Jesus Cristo, perfeitamente humano e divino, não se confundindo com as coisas criadas como se estas fossem extensões do Seu ser, concepção ao gosto dos panteístas. Nenhum governo, programa de governo, partido ou programa partidário pode ser tão divino ao ponto de ser tomado como sendo manifestações do Reino de Deus. Este foi o grande problema dos adeptos da teologia do Destino Manifesto, que confundiram o American Way of Life como sendo o próprio Reino de Deus.
Os que se envolvem com a política partidária precisam se lembrar constantemente que Deus não fez e age no mundo via manipulação, violência, chantagem ou injustiça, tal como muitos dos mitos e deuses pagãos fazem. Porque Deus criou as coisas do nada (creatio ex nihilo), a criação foi um ato da mais pura generosidade e graça. Se os religiosos-políticos não entenderem isto (a generosidade e graça divinas na criação), eles se sentirão compelidos e autorizados a praticarem atos injustos, iníquos e corruptos.
É o amor e a qualidade dele, exercido por Deus na criação e na manutenção das coisas criadas, que define e determina a maneira como devemos viver em comunidade e que deve ser a vida em comunhão. A liberdade separada do amor só pode se tornar em licenciosidade, forma deturpada de amor e mera busca da felicidade. Assim procedendo, os programas terceirizam o amor, mas ao mesmo o privatizam como sendo atos de governo (vide Bolsa Família e outros programas sociais). Adicionam a este cardápio a departamentalização da comunhão: nós e eles, governo e oposição, eleitos e golpistas.
A igreja de Jesus Cristo e seus fieis não devem buscar o poder político como projeto eclesiástico. A igreja que se identifica com um partido ou o utiliza para ter mecanismos de pressão pela eleição de deputados via manipulação dos fieis para votar nos pastores e bispos da Igreja, deixou de ser igreja e passou a ser ente político. Deixou de servir para servir-se do poder.
Cristãos que se envolvem com a política devem ter consciência de que devem ser exemplo de integridade, serviço e amor ao próximo. Não podem estar associados ao serviço retributivo ao próximo, esperando recompensa em votos de possíveis favorecidos ou fazendo advocacia de porta de cadeia, nem podem ser forjadores de documentos falsos, mesmo que lhe emprestem certa legalidade, ainda que fajuta. Devem ser exemplo de trabalho em comunhão e nunca se enquadrar no que Pedro escreveu: “como dominadores sobre os que vos foram confiados” (1 Pedro 5:2,3). Devem dar o exemplo do serviço e nunca chantagear o rebanho com a “retirada da proteção espiritual que o pastor oferece”.
Como pode ser um cristão político, exercendo cargo no executivo ou legislativo se não deu exemplo no trato das questões de obediência aos princípios da Palavra (como não mentir, não roubar, não prestar falso juramento, não ameaçar, não chantagear, não se colocar como absoluto)? Terá ele mais ética no trato da coisa pública do que teve na relação com o próximo e com Deus? Como esperar que obedeça à Constituição se não obedeceu ao Estatuto e Regimento Interno de sua comunidade? Que usa da Igreja para lavar dinheiro de propina? Que recebe salário sem trabalhar? Que usa o nome da Igreja para legitimar seu trabalho solitário de angariar votos?
Há gente que se diz especialista em leis, não para cumpri-las, mas para burlá-las, para manipular juízes. Nisto está a diferença que um dia um estrangeiro me mostrou: “na Europa, quando se promulga uma lei, o povo busca como cumpri-la; no Brasil, diante da nova lei, busca-se como burlá-la”.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

CRER É PENSAR?

Há muita gente que entende haver antagonismo entre a fé e a racionalidade e as veem como excludentes: quem tem fé não pode pensar e quem pensa perde a fé. Para muitos, a ida dos jovens à faculdade ou universidade é de alto risco para a fé, porque muitos “se perdem”.
Há que considerar-se que o ser humano precisa pensar e é impossível viver sem fazê-lo. Conhecer fatos e entendê-los faz parte da essência da vida. Ainda que haja graus de interesse no descobrir das causas e desenvolvimento das coisas, todos têm um grau de interesse em saber das coisas. O pensamento é a ferramenta que promove a ação. Assim, o pensamento no contexto da ação é o que se manifesta no início e término do ato de reflexão sobre um fato ou situação dada. É a novidade do fato ou do evento que leva à necessidade de conhecer e agir diante dele e isto só se dá porque houve o pensamento. Coloca-se em ordem o pensamento, compreende e diante da compreensão decide o que fazer diante da novidade. Não há decisão e nem ação sem o pensamento, fruto da reflexão.
Conclui-se, então, que o pensamento não é estático, uma coleção de conteúdos guardados no fichário da mente e recuperado incólume a cada vez que dele se necessita. Ele é um jogo de operações vivas, atuantes, transformados pela nova experiência, interpretação e contexto.
Se pensar é entender o fato, o evento ou a novidade, nada mais lógico que a fé envolve o pensar. Se se crê em um Deus todo poderoso que nos surpreende a cada momento com a novidade de Suas ações, que pede que se cante cânticos novos a Ele todos os dias, que a cada dia pinta no amanhecer e no pôr-do-sol uma nova pintura, que a cada pouco nos maravilha com Sua graça, como ter fé “congelada”? A fé baseada em conceitos que vão para o freezer da memória e lá ficam inalterados até o dia da morte, não pode ser chamada de fé.
Um Deus que se mostra em novidade a cada dia e em cada situação, não pode ser adorado, servido e entendido com afirmações rígidas, inflexíveis, dogmáticas, sistemáticas. Por isto afirmo, e o faço no temor, que o conservador não entende de Deus. Deus não cabe nas afirmações dogmáticas, sistemáticas, nas teologias enlatadas e nas jaulas de templos onde impera a arrogância da ignorância. Ele pode dizer o que Deus fez no passado, mas nunca vai entender o que Ele está fazendo hoje e agora. Ele usa métodos arqueológicos para explicar Deus. Arqueólogos não podem ser criativos, mas devem ser interpretativos, com alto grau de “chutabilidade”. Tremo (de raiva) quando ouço frases como; “ a vontade de Deus nesta situação é...”; “o que Deus quer de você é...”; “Deus está usando isto para te ensinar a ...”; “tenho uma palavra de Deus para você...”, etc.
Os conservadores, e ainda mais os fundamentalistas, falam de um Deus do passado, mas não conseguem ver este Deus no caminhar junto aos seus no dia-a-dia. Creem no totaliter aliter, mas não acreditam no Emanuel (o Deus conosco, ao lado, passando comigo os perrengues da vida). O texto de Hebreus que afirma que “Ele em tudo foi igual a nós” é esquecido.
Creio no Deus que anda comigo no jardim do Éden que é a criação que Ele me deu para desfrutar e que me fala no sussurro da brisa, no barulho do gotejar da chuva, no canto dos pássaros e na palavra dos profetas, que me revela quem sou na Sua Palavra!

Marcos Inhauser

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

PASTOR, OVELHAS, LOBOS E TIGRES

Recebi este texto do Rev. Marcos Kopeska, amigo e colega de ministério, que edito para que caiba neste espaço.
“O profeta Jeremias, lá pelos idos do ano 600 a.C., alimentava uma esperança que reflete nosso anseio hoje: "...e dar-vos-ei pastores segundo o meu coração que vos apascentem com sabedoria e conhecimento." (Jr 3:15). Conta-se a fábula de um pastor que gostava muito de suas ovelhas. Elas não tinham presas, garras e nem chifres. Eram indefesas e o pastor prometeu defendê-las sempre. Jamais mataria uma ovelha para comer, por isso vivia de frutas e legumes e, se necessário fosse, passaria fome. Em razão da sua dieta era muito magro, por vezes debilitado, não obstante feliz com sua vocação. Nas cercanias moravam lobos que apreciavam churrasco de ovelha, por isso a atenção do pastor era intensa e incansável. O gostar de ovelhas, sob a ótica do pastor, tinha a ver com a lã da ovelha, mas sob a ótica dos lobos tinha a ver com churrasco.
Todo líder alega gostar de seus liderados, mas sob qual ótica? Pois bem, a notícia de que havia ovelhas por ali se espalhou e logo vieram hienas e cães morar com os lobos. O pastor impotente, com apenas um cajado, muniu as ovelhas de couraças, chifres e dentes de aço. As ovelhas, sem saberem lidar com o equipamento tornaram-se mais frágeis ainda e os churrascos mais frequentes. O pastor teve então a brilhante ideia: “Vou contratar tigres para cuidar do rebanho, mas precisam ser tigres vegetarianos.” Encontrou-os, contratou-os mas aos poucos eles foram degustando os restos de ovelha deixados e concluíram que carne de ovelha era mais palatável do que frutas e vegetais.
Os tigres fizeram um acordo com os lobos e hienas de que de dia cuidariam do rebanho, mas de noite comeriam juntos o churrasco de ovelha, ocasionalmente morta por causas “que fugissem ao seu controle”.
O pastor observando que os tigres estavam relapsos no cuidado, chamou-os para uma repreensão, mas ao longo da repreensão um tigre, sem dar muita atenção às palavras do pastor, perguntou: “Qual seria o gosto da carne de um pastor?” Outro respondeu: “Só provando para sabermos.” Entre a fala dos tigres, o pastor notou que entre os dentes de um dos tigres havia vestígios de lã. O pastor interrompeu a conversa, entendendo o que acontecia e propôs: “Vamos fazer um acordo...” A assim viveram felizes, num bom acordo de paz: pastor, lobos, hienas, cães e tigres. Vez ou outra comemoravam os avanços da paz com um churrasco de ovelha.
O pior é que parece ser este o padrão da relação “Igreja & Estado” a que chegamos em nossa Pátria mãe gentil. Alguns pregam que o cristianismo deve ser apolítico, mas aí os churrascos de ovelha serão mais frequentes e descarados. Outros creem que a igreja deva ser politiqueira, fazendo parte dos acordos em troca de favores. Ela se torna lobo ou hiena, menos ovelha. Creio que devamos promover ambientes cristãos de esclarecimento – apartidários - sobre temas relevantes que envolvam os próximos debates políticos da nação. Criar espaços onde as comunidades reflitam sobre corrupção, violência, modelo de família, assistencialismo, aborto, educação, ... Espaços onde nossos adolescentes conheçam uma nova consciência cidadã cristã. Espaços que levem o povo cristão às urnas, livres dos sutis enganos e das viciosas seduções da política partidária.  Ambiência de conscientização e reflexão, não de acordos.
Que Deus nos ajude a ter uma nação com pastores e ovelhas, mas sem churrascos após cada eleição.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

A COBIÇA DO PODER

Há no imaginário popular a ideia de um grande juízo no fim dos tempos, quando todos deverão responder pelos seus atos, toda a verdade se estabelecerá e a justiça prevalecerá. Nesta corrente vem o ditado popular: “a justiça dos homens falha, mas a de Deus prevalecerá”.
Este conteúdo escatológico que se dá à plenificação da justiça se deve ao fato de que, como humanos, cometemos injustiças e ao assim proceder, atentamos para a concretude da paz, porque não há paz sem justiça.
Na análise do comportamento humano (e isto já foi feito uma infinidade de vezes), há os que reduzem as mazelas comportamentais e a causa das injustiças, atribuindo à cobiça, por entender ser ela a causa mater de todos os pecados. Ela está elencada no Decálogo Mosaico e pode-se resumir nela todos os demais pecados. A cobiça do poder, a cobiça da mulher alheia, a cobiça dos bens alheios.
O relato da criação e queda do ser humano relatado pela Bíblia coloca o pecado primeiro na categoria da cobiça de poder: seriam iguais a Deus. O projeto de se tornarem mais do que eram os levou a tropeçar e perder o paraíso.
No mundo moderno a cobiça pelo poder ainda vige livremente. Os super-heróis das revistas em quadrinhos e mais modernamente dos filmes de ação, são pessoas dotadas de poderes ilimitados para combater os que querem assumir o poder sobre todos. Poder foi o que satanás ofereceu a Jesus durante a tentação.
Nesta tentação caíram muitos. Desde a antiguidade até os dias modernos há uma sucessão de pessoas que quiseram ser ultra-poderosos: os Faraós, os reis persas, babilônicos, Salomão, Alexandre, Napoleão, Hitler, os Bush (pai e filho). Temos hoje o norte-coreano Kim Jong-Un que não pensa duas vezes para eliminar quem não se conforma totalmente aos seus desejos totalitários.
Há partidos que cobiçam o poder e estabelecem planos para ficar X anos no poder. Lá chegando, aumentam o sonho e se locupletam para que a permanência possa ser indefinida. Fazem esquemas, montam lavanderias, compram fidelidades para assegurar a reeleição, compram o silêncio dos cúmplices, contratam advogados a peso de ouro, compram a maioria no congresso, buscam a própria estabilidade econômico-financeira.
Nesta cobiça do poder e da perpetuação nele, não se envergonham de fazer coisas condenáveis e, quando flagrados, saem com a cara-de-pau afirmando que sempre se fez assim, que não são os únicos, que a PF deveria se preocupar com questões mais importantes. Para a mídia, fazem declarações de inocência absoluta. Mesmo diante de extratos bancários comprobatórios, negam, de pés juntos, que o dinheiro que está na conta em seu nome e que tem a sua assinatura, não é dele e nem a conta lhe pertence.
Por ser o poder algo tão tentador e aderente, se assemelha a uma tatuagem: marca e se remove só parcial e cirurgicamente. Daí porque, na história da humanidade, as renúncias são mínimas e aconteceram em situações limítrofes: saúde abalada ou credibilidade zero, que gera um desgoverno.
Estamos em uma situação quase-limítrofe: pode piorar ainda mais. Os que propugnam a renúncia o fazem por candura, sem a concreta esperança de que ela se dê. O Nixon renunciou porque não tinha alternativas. O Collor tentou renunciar diante da iminência da cassação. O Blatter fez uma renúncia branca. Tem gente que prefere morrer a renunciar: Vargas e Allende.
A eleição é tão constitucional quanto a renúncia ou o impeachment. O que não é constitucional é o uso da mentira para se eleger ou reeleger.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

MOISÉS E EDUARDO CUNHA

O legislativo entrou na pauta das preocupações e atenções do povo brasileiro. No mandato do Eduardo Cunha, um ex-membro da Igreja Sara Nossa Terra e atualmente vinculado à Assembleia de Deus, tem traços que me fazem lembrar o Moisés bíblico.
O Moisés viveu no fausto do palácio do Faraó. O Cunha participou do governo Collor e por ele indicado foi para a presidência da Telerj onde reduziu os investimentos da empresa para se ajustar ao projeto collorido de privatizar as estatais. Para tanto, criou uma comissão de licitação vinculada a seu gabinete. O TCU constatou irregularidades na contratação de servidores, que deu tratamento privilegiado a alguns fornecedores e falhou na licitação para a edição de catálogos telefônicos. À época, foi acusado de superfaturamento ao ter assinado aditivo de US$ 92 milhões em contrato da Telerj. Viveu nos palácios colloridos!
Moisés teve um delito em sua vida passada, antes de assumir a condição de salvador da nação: ele matou o soldado egípcio e por causa disto teve que fugir. O Cunha tem muitas coisas a explicar relativas ao seu passado.
O Moisés se apresentou ao Faraó e ao povo como salvador da nação escravizada. O Cunha também o fez, apresentando-se como candidato que traria a independência a um legislativo submisso à maioria governista. Dez pragas foram necessárias para que conseguisse realizar sua obra. O Cunha, com sua pauta-bomba, já semeou algumas pragas na economia brasileira.
O Moisés teve a perseguição do Faraó que queria prendê-lo. O Cunha tem a Procuradoria Geral da República e a Polícia Federal atrás dele. O Moisés teve o Mar Vermelho à frente, o Cunha tem o STF e um ministro de cara avermelhada pelos traços étnicos. O Moisés passou incólume, o Cunha tem fé de que também passará.
O Moisés subiu ao monte Sinai e de lá voltou com as leis para o povo. Não houve a participação popular e desceu com a chancela do divino nas tábuas que trouxe. O Cunha subiu na cadeira presidencial e do alto deste seu Sinai, anda legislando a seu bel-prazer, mais para infernizar a situação que para beneficiar o povo. Há nele um messianismo achando que salvará a nação. Só ele se sente chamado.
Quando o legislador se afasta do povo para legislar, o povo padece com as leis promulgadas. Ainda que os Dez Mandamentos tenham valores até hoje aceitos, a jurisprudência feita pelos sacerdotes autorizou o matar a pedradas quem não guardasse o sábado, desobedecesse ao pai, a mulher que adulterasse. A lei pode até ser boa, mas os jurisconsultos a deturpam.
Não foi o caso de Jesus. Ao promulgar as bem-aventuranças (código relacional a vigir no ambiente da graça e do Reino, codificadas nas bem-aventuranças), Ele o fez com o povo à Sua volta. Subiu à montanha, mas não o fez no isolamento e sim na companhia de uma multidão. Não legislou em causa própria, mas rompeu com a lógica da justiça retributiva, muito usada pelo Cunha: fez, leva o troco.
O Moisés tem o testemunho que foi o homem mais manso que houve na face da terra. O Cunha tem o testemunho de ser violento, ameaçador e vingativo. O Moisés, ainda que tivesse sonhado com isto, não entrou na terra prometida. O Cunha, ainda que sonhe, não chegará à cadeira presidencial.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

JOVEM, CRISTÃO, XIITA!

Em conversa com alguns colegas pastores temos levantado e trabalhado a questão de uma geração que tem se mostrado conservadora e agressiva. As conversas iniciaram-se a partir da pergunta: como é que os grupos terroristas islâmicos conseguem arregimentar jovens, grande parte deles instruídos e vivendo em países com alto grau de desenvolvimento? A pergunta decorrente foi: como é que movimentos radicais, dentro do cristianismo, têm conseguido arregimentar jovens?
Esta pergunta, se bem me lembro nasceu com a notícia de que a Universal havia formado um pelotão de jovens denominado “Guardiões do Altar”, os quais, entre outros cânticos tem este: “Eu não temo a Batalha / Nem o contra ataque do mal / Eu não temo a tempestade / Fui selado para vencer / Eu já me armei com o escudo da fé / E o capacete da salvação / Não temerei vou enfrentar / Eu correrei pra conquistar/ E saltarei pra celebrar / Gritarei e as muralhas cairão”. O espírito beligerante é claro. O fundamentalismo extravasa pelos poros.
O jovem Dylann Storm Roof, de 21 anos, se achou no direito de entrar em uma igreja negra e matar nove pessoas que participavam de um culto em uma igreja em Charleston. Na sua justificativa, afirmou que queria uma guerra civil com tendências supremacistas dos brancos. Em seguida, várias igrejas negras foram incendiadas.
Há outro tipo de violência dos jovens que ocorre, com mais frequência na internet, em locais onde está aberta a troca de opiniões e se pode fazer comentários. Invariavelmente, as colocações feitas são de cunho agressivo, ofensivo, violento. Há enorme dificuldade em aceitar que alguém possa ter posição diferente, mesmo que seja superficial. Em um destes sites “evangélicos” li comentários dignos de briga entre torcedores de times rivais, inclusive com o uso de palavrões. Alguns amigos me confidenciaram que tinham a ideia romântica de que poderiam fazer alguma diferença postando algumas observações críticas ou ponderações sobre o que outros haviam escrito. Desistiram. Um deles, de tradição ortodoxa, o que mais levou foi pedrada de outros ortodoxos.
Guga Chacra, que escreve para vários jornais e revistas e comenta temas internacionais na Globo, em seu blog no Estado afirma: “Comentários islamofóbicos, antisemitas e antiárabes ou que coloquem um povo ou uma religião como superiores não serão publicados. Tampouco ataques entre leitores ou contra o blogueiro. Pessoas que insistirem em ataques pessoais não terão mais seus comentários publicados. ... O blog está aberto a discussões educadas e com pontos de vista diferentes.” Pelo visto ele também já foi vítima de muitas pedradas.
A recente turbulência na Câmara Municipal de Campinas sobre a questão do ensino sobre gêneros nas escolas é prova desta virulência. Todos queriam falar, ninguém estava disposto a ouvir. Ofensas mil, acordo nenhum. Não houve diálogo, mas diátribe.
Dia destes um amigo teólogo, com doutorado na área, me perguntou se eu estava acompanhando os ataques dos fundamentalistas à “ingênua teologia da missão integral”. Disse que não. Ele me informou que os fundamentalistas estão atacando o conceito de missão integral (o evangelho todo para o homem todo) como tergiversação dos ensinos bíblicos. Preferem esquartejar o ser humano em “corpo, alma e espírito. Talvez façam isto pela falta de outro inimigo, porque a teologia da libertação já não vige como antes e a teologia relacional muito pouco adentrou no Brasil.
Assustadoramente, em pleno século XXI, estamos vendo o ressurgir de ideias de supremacia racial, de discriminação religiosa, de violência assassina contra a diferença.
Marcos Inhauser



quarta-feira, 29 de julho de 2015

FAMÍLIA EM XEQUE

Recebi do meu amigo Marcos Kopeska o artigo da Dra. Edilene Nassar de Rossi, Psicóloga, que o publico aqui, por apresentar uma visão interessante da família:
“No jogo de xadrez, o termo “xeque” é o que se diz ao oponente quando este está sob ameaça de perder o rei, mas ainda com a possibilidade de evitar o fim, corrigindo e reposicionando as peças.
Neste contexto, analiso a família sob o prisma do tabuleiro para desafiar nossa atitude positiva diante das crises e ameaças, lançando mão de jogadas inteligentes, que nos levam ao sucesso familiar.
Portanto, falo a todas as peças desse jogo: do rei aos peões. Quando se fala de jogo e família, todos estão envolvidos e devem cumprir seus papéis com excelência para alcançar a vitória. A família entra em xeque, ameaçada, quando no decorrer do jogo da vida, relaxa sua guarda e, sem percepção das emboscadas sutis do dia a dia, perde peças importantes, capturadas pelo adversário. Estas perdas, ainda que sejam apenas peões, seriam capazes de evitar o xeque-mate, que é a captura do rei e o fim do jogo. Isso acontece quando não nos protegemos, vivemos de forma individualista, cega, insensível e egoísta, sem perceber o que se passa em nosso reino.
Assim, uma pequena dificuldade não percebida, se transforma em problema; este problema sem a devida atenção se transforma em crise (xeque); a crise sem sabedoria e correção, conduz ao caos – e então, xeque mate! Mas ainda estamos falando da situação de xeque! Ainda existe esperança, saída, solução!  Xeque é crise, e, crise é oportunidade! Oportunidade de retomarmos o controle do jogo e evitarmos o fim. Xeque exige atitude, portanto não é hora de desistir.
Aliás, as crises são necessárias e podemos usá-las a nosso favor. Basta nos deslocarmos da estagnação, analisarmos as possíveis jogadas que se desenham no tabuleiro, observarmos com cuidado as peças que estão em risco, descobrirmos as possibilidades de avanço do oponente, movermo-nos a novas posturas, vislumbrarmos o jogo por outros ângulos, e finalmente, respeitarmos e enxergarmos como o outro vê e sente. É na crise que se escolhe a melhor peça, o movimento mais inteligente e a tática adequada a adotar, gerando mudanças e resultados relevantes para o todo e não somente coroando ganhos pessoais.
Há batalhas que exigem a humilde habilidade do peão, isso quando nos vemos pequenos diante do conflito. Outras reclamam a agilidade do cavalo pulando os obstáculos ao invés de confrontar barreiras. Há jogadas que requerem o fortalecimento das torres de proteção, isso nos momentos de perigo iminente. Há pugnas que demandam a habilidade e criatividade do bispo recorrendo a caminhos alternativos. Outras, clamam pela versatilidade da dama, flexível em seus movimentos adaptando-se às necessidades. Por fim, recorremos a atitude nobre e prudente do rei, agindo com cautela e sabedoria, dando um passo de cada vez, agindo com cuidado, pois conhece a importância e valor do que tem em suas mãos.
Da mesma forma, no xadrez da vida o vencedor não é quem evita pequenos confrontos, mas quem enfrenta a batalha, admite os erros e os corrige. Sim, para ganhar o pódio devemos respeitar o desafio do xeque e fazê-lo valer a pena.

Marcos Inhauser

quarta-feira, 22 de julho de 2015

POLÍTICA: A ARTE DO FINGIMENTO

Todo mundo sabe que a palavra hipocrisia significa fingimento, falsidade. Ocorre que a origem da palavra vem de outro contexto e sentido. Vem do grego hypocrites, que na Grécia antiga, designava os atores de teatro, os quais, durante as apresentações, fingiam ser outras pessoas. O palco era uma "hipocrisia" pois os que ali atuavam fingiam ser quem não eram.
Assim, o hipócrita oculta a realidade através de uma máscara, de uma aparência do que ele realmente é. O hipócrita finge possuir boas qualidades para ocultar seus defeitos, sendo também conhecido como pessoa dissimulada.
Nestes tempos de mensalão e Lava Jato, o cenário político se transformou em um grande palco teatral, com atores fingindo ser o que não são. Os mais variados discursos têm parecido, todos encenações de uma ópera bufa. Há uma constância nas falas dos atores: negam o que se lhes acusa com a veemência dos indignados. O conteúdo das falas pode mudar na argumentação. Uns alegam perseguição política (talvez a mais comum), outros dizem que as acusações são infundadas, levianas, irresponsáveis, feitas por criminosos confessos, etc.
A prática de negar é a primeira alternativa para os que são flagrados com a mão na botija. Outros preferem a perseguição política (tal como o fez Eduardo Cunha), sem, contudo, dar uma explicação sequer para esclarecer as coisas. Outros negam até a assinatura aposta em documento de banco, que comprova serem seus os milhões em depósitos em paraíso fiscal (Maluf). Outro se transforma no maior pecuarista do mundo em termos de fertilidade do rebanho (Renan Calheiros). Outro apela para tias e parentes mortos que teriam deixado herança milionária, sem que isto tivesse sido declarado à receita, um mero lapso cometido pelo contador.
Há quem, sendo confiscado de seu patrimônio (Lamborghini, Masserati e  BMW 760), apela para a o TCU investigar as contas da PGR, em clara retaliação. Aqui impera a lógica de que, se se flagra algo errado na PGR, as minhas falcatruas estão legalizadas, porque quem me acusa, tem também suas mazelas.
Há quem acuse o juiz de se achar o dono do Brasil, o Procurado da República de ser pau-mandado do PT, a PF de ser aparelho do Partido. Esquecem-se de dizer que há gente do partido nas investigações, que o ex-guru-mor do partido está sendo investigado por consultorias que nunca prestou, que o tesoureiro está enroscado até o pescoço e que a coisa anda sobrando pelos lados do Palácio, com dois ministros citados.
O grupo encarregado de explicar/justificar as “pedaladas fiscais” também está enveredando por este caminho, tentando mostrar que outros também o fazem e que a prática consagra a ética.
A crer-se nos discursos inflamados dos “indignados e perseguidos”, o Congresso Nacional seria um convento de monjas virgens, cuja santidade é comprovada pela face angelical que possuem. Conventos também seria as Assembleias Legislativas e as Câmaras de Vereadores. Pelo que se sabe, nenhum destes conventos é santo. Muitos se prostituíram nas lambanças e baladas das propinas.
De minha parte fica o orgulho de ver que ainda há algo que funciona neste país: a Justiça Federal no Paraná. Não que não haja outros exemplos, mas por agora, cito este. Ouvir a sentença dos primeiros donos de empreiteiras (fato que eu não cria ser possível há menos de um ano) e ver a prorrogação da prisão preventiva do diretor da maior empreiteira por prática reiterada de crimes, mesmo depois de deflagrada a operação e estar preso, é algo que me dá esperança de que algo está acontecendo.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 15 de julho de 2015

POLITEIA

Os nomes dados às operações da Polícia Federal indicam que há gente que lê e estuda dentro da corporação. Os mais variados nomes já foram usados e a mais recente, deflagrada ontem, Politeia, remete ao texto de Platão, a República, onde o filósofo tece comentários negativos à democracia. Dizem os entendidos que, influenciado por uma postura intelectualista de Sócrates, Platão a incorpora em seu pensamento, dando-lhe amplitude política. Em a República demonstra que não é possível pensar a política como prática qualquer e corriqueira, destituída de orientação cognitiva e de pressupostos epistemológicos.  Assim, toda ação política correta depende da visão dada por um saber relacionado à organização da cidade.
Para ele, a pólis é um organismo moral e uma comunidade ética, cuja finalidade é a realização da justiça e da virtude e não somente a conquista de objetivos como a segurança,  bem-estar,  produção de riquezas etc. Para isto, é necessário se fundar a pólis com uma elite intelectual, a qual, possuindo a sabedoria, norteará o funcionamento da vida política.
Se o que temos no Brasil é uma democracia, certamente não o é nos termos mencionados por Platão. O que temos está mais para corruptocracia. Vale citar SHAPIRO (Os fundamentos morais da política. Trad. de Fernando Santos. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 245): “Como existe o predomínio da democracia no mundo contemporâneo, qualquer investigação dos fundamentos morais da política tem, ... , que estar atenta ao papel desta na legitimação dos regimes políticos. O fato de que governos das mais diversas colorações ideológicas, ... , tentem se cobrir com o manto da democracia é uma prova a mais ... de que o compromisso com a democracia é um componente indispensável da legitimidade política [...] No mundo contemporâneo, ... , a aprovação à ideia de democracia é ... inegociável.”
Em outras palavras, há a necessidade inegociável de se chamar democracia aquilo que é corruptocracia.
Os eleitos não são os mais qualificados intelectualmente (os apedeutas eleitos nos mais variados níveis são prova disto), nem os mais bem preparados para a vida pública. Elegem-se os que têm visibilidade midiática, os que têm apelido jocoso, são filhos de políticos ou são conhecidos por atividade que nada ou pouco tem a ver com as habilidades para a vida política.
No sistema eleitoral brasileiro, onde a eleição é ganha com tempo de televisão e assessoria marqueteira, aliada ao fato de que os detentores de cargos eletivos dispõem de um caminhão de assessores ou contratados como comissionados, regiamente pagos com o erário, a renovação dos eternos políticos é tarefa hercúlea.
O financiamento das milionárias campanhas, se feitos com recursos próprios, só permite que ricos sejam eleitos. Se financiados pelo setor privado, o preço será cobrado, assim como se cobrará também o que foi gasto com recursos próprios.
Fala-se em reforma eleitoral e a Câmara está às voltas com ela. Do que se pode depreender naquilo que já foi votado e do que está por vir, as mudanças são cosméticas. Atacam-se alguns efeitos, mas não a causa: o custo das campanhas e a rigorosa fiscalização dos gastos e financiamentos. Pelo andar da carruagem, tudo indica que o poder fiscalizador da Justiça Eleitoral (que já era tênue e e-lento-ral) será ainda mais engessado pela redução dos prazos de investigação e sentenciamento. Acrescente-se a isto o fato de que há gente querendo que a destituição de prefeitos, vice, governadores, etc. só possa ser feito por órgão colegiado e não mais por sentença monocrática.
Ao que parece, ainda demoraremos algumas décadas para que a corruptocracia seja substituída pela democracia, pela eleição de agentes com sabedoria e não apelido, com conhecimento e não presença midiática, gente que não se orgulhe de não ter estudado e nem que afirme que ler dá sono.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 1 de julho de 2015

UM MANTRA CONDENATÓRIO
Nestes tempos de Lava Jato virou mantra as declarações de gente envolvida com as “ofertas” das empreiteiras para financiar campanhas políticas. Sem exceção, a frase repetida ad nausean é: “as contribuições foram devidamente declaradas à Justiça Eleitoral, que as aprovou”.
Confesso que meus miolos dão um chilique quando são bombardeados com tais declarações que, diga-se, não é exclusiva do partido mais enrolado (até aqui) com as revelações.
Ainda que meu raciocínio possa ser questionado em um ponto ou outro, creio que ele se aplica. Imagine-se que o traficante José dos Anzóis coloca em sua Declaração Anual de Imposto de Renda os ganhos obtidos com sua atividade e paga o absurdo do imposto que se cobra. Mais tarde se descobre que os ganhos que teve não foi produto de atividade ilícita, o narcotráfico. Ao ser questionado, solta uma nota pública afirmando categoricamente que os rendimentos foram declarados à Receita Federal e que os devidos impostos foram pagos. Estaria o indigitado inocente por ter declarado e pago os impostos?
Imagine-se que os ladrões de bancos declarassem os rendimentos oriundos dos caixas eletrônicos arrombados e pagassem o devido imposto. Estariam imunes do crime por terem sido “honestos” em declarar a receita ao Fisco?
Imagine-se que, ao invés de serem os meliantes os declarantes dos rendimentos, terceirizam tal prática a um laranja ou a uma empresa, por exemplo Motel, Hotel, Restaurante, fazenda de gado ou coisa que o valha. Como é difícil a verificação da ocupação dos motéis e hotéis, a quantidade de refeições servidas ou a quantidade de crias que o rebanho teve, poderia perfeitamente atribuir um ganho excepcional. Isto foi feito por um senador conhecido que alegou que sua riqueza era fruto da fertilidade do seu rebanho (dado que deveria entrar para o Guiness como sendo o mais fértil do mundo!). Mais tarde se descobre que a origem de tal riqueza foi fruto de atividades outras. Mas o suspeito vem a público afirmar que declarou ao Fisco seus ganhos.
Se a Justiça Eleitoral aceitou as declarações e aprovou as contas, e depois se descobre que a origem das verbas era ilícita, as ações de declaração e aprovação não eximem do crime, antes, a bem da verdade, a justiça deve reexaminar o caso e mudar a sentença aprobatória à luz dos novos fatos.
Mas, confesso, estranha-me que os auditores do Tribunal de Justiça nunca se tivessem perguntado como é que tão poucos (as construtoras) contribuíam tão generosamente. Será que nunca lhes passou pela cabeça que estavam deixando passar uma boiada ao aprovar um boi? Se se soma o quanto estas construtoras deram aos partidos e políticos, chega-se a números de chamar a atenção. E onde estavam o COAF, o Fisco, os auditores do TSE? Foi preciso haver delação para haver conscientização? Ou a delação trouxe à tona a omissão dos que deveriam fiscalizar? Ou os que deveriam fiscalizar não o faziam porque deviam seus empregos aos beneficiados pelo propinoduto das contribuições eleitorais, eufemisticamente chamados de “bônus eleitoral”?
Contrariamente à madame presidente, eu creio em delatores, ainda que faça distinção entre eles. Há delatores que entregam outros que são companheiros de lutas. Há delatores que entregam suas confissões criminais. Os primeiros o fazem por fraqueza. Os segundos por confissão e espírito cívico. Os primeiros por covardia. Os segundos por coragem cívica. Os dois o fazem para se livrar de penas maiores.
Quem mentiu descaradamente à nação para conseguir a reeleição, não pode vir a público passar lição de moral em quem fala a verdade!

Marcos Inhauser