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terça-feira, 26 de maio de 2009

COMIPÇÃO

Nos últimos meses tive a oportunidade de conversar com algumas pessoas que tem ou tiveram relações estreitas com os corredores do poder, tanto em nível federal, estadual, como municipal. Nas conversas, como é óbvio, não poderia deixar de tocar o tema da corrupção e os casos que vieram à tona, notadamente os relacionados ao Senado e a farra das passagens aéreas.

Nas considerações que ouvi, houve uma unanimidade: o que veio à tona é só a ponta do iceberg, só uma pequena ponta de tudo o que ocorre nos descaminhos do poder. Cheguei à conclusão de que se cobra comipção (neologismo formado de comissão e corrupção) até na compra de palito de dente.

Segundo estes, há muita coisa, como favores prestados a deputados e senadores que traficam influência, viciam licitações para que sejam vencidas por quem “financiou” suas campanhas, aceitam sobrepreços, pagamentos de pilares inexistentes em túneis e pontes, metragens descumpridas em estradas, capa asfáltica 50% menos espessa e largura de estradas mais estreitas do que está no contrato, o que dá ganhos exorbitantes às empreiteiras. Há os “pedágios” mensais em base a um porcentual sobre a arrecadação nos serviços “privatizados”.

Um deles me contou de uma farra financiada há mais de uma década por um empresário que levou de passeio a Mônaco mais de dez deputados e senadores e alugou um iate ao custo de US$ 120.000,00 dólares/dia.

O outro me perguntou se eu acreditava que a farra dos pedágios e o jardineiro fantasma eram os casos mais cabeludos da Câmara de Campinas. Ele me disse que a celeuma em cima da identificação dos carros usados pelo poder municipal é quase nada diante de outras coisas. Ele me pediu que prestasse mais atenção às mudanças nas leis de zoneamento, contratos sem licitação feitos em regime de urgência, custo do aluguel dos carros, a forma como certos “empregados” são pagos por agências de publicidade e locadores de veículos, como forma de camuflar gastos.

Na segunda-feira houve uma manifestação dos donos de postos de gasolina, vendendo o produto sem os impostos para que a população se conscientize do quanto há embutido no preço. Houve onde se vendeu o produto a R$ 1,27. Se remédio genérico paga 37% de imposto, se vacina para animal é isento, se escola paga mais tributo que lotérica, dá um mal estar danado. É um dinheiro que vai pelo ralo, falcatruas de ilustres “otoridades”.

Quando pergunto a estas pessoas se há esperança eles me afirmam que não vêem luz no final do túnel, que a cultura da comipção é arraigada no Brasil, que a população tem um comportamento bovino de passividade. De minha parte, não voto mais em ninguém que tenha mandato. É meu não à reeleição.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

A BENÇÃO DA DIFERENÇA

Se os seres humanos foram criados por Deus, concluimos que Ele nos fez diferentes por uma de duas razões: por capricho de Deus ou porque há um propósito. Quando Deus percebeu que não era bom o homem estar só, criou a companhia, que diferia em gênero: uma mulher. Para ser auxiliadora tinha que ser diferente. A ajuda vem da diferença. Quando duas pessoas iguais estão juntas, não podem se ajudar porque iguais.
O mesmo se aplica à espiritualidade. Somos ajudados no crescimento espiritual quando convivemos com a diferença. Não é o cercar-se de gente igual que dá a certeza de estar certo. Há mais probabilidade de incorrer em erro quando cercado de gente igual do que quando de gente diferente.
Os iguais bajulam, porque dizem o que se gosta de ouvir, não criticam porque seria criticar-se, uma vez que pensam e agem igual. Quando se cerca de gente igual, ao invés de crescer, para-se no tempo e fica se deliciando com as verdades que se cre e recusa as novas, porque envolvem o risco.
Por outro lado, se se cerca de gente com capacidade e a liberdade de questionar, perguntar, duvidar do que se crê, afirmar coisas diferentes, a convivência será caracterizada pela constante reflexão, análise e reposicionamento. Quando se revê pensamentos, os avalia criticamente à luz de posições divergentes, há amadurecimento. A maturidade não está na certeza e na repetição ad infinitum das verdades. Ser um poço de certezas é ser inseguro e de imaturo. O ignorante é o que mais sabe e Sócrates dizia que uma coisa sabia: que nada sabia.
Estas reflexões me levam ao ecumênico. Tenho visto gente na defensiva e no ataque ao ecumênico. Acusam-no de tudo pelo fato de colocar pessoas que pensam diferente para conversar e encontrar caminhos comuns. O ecumenismo é uma proposta para gente madura, sem medo do diferente, do novo, de avaliar-se e até reconhecer que está errado. O ecumênico é um risco para os donos da verdade, porque podem ser falsas. Os inseguros se lançam ao ataque difamatório. Donos da verdade e ditadores em suas comunidades, não tem maturidade para o diálogo, porque treinados no arbítrio. Pregam como verdade o que creem, sem dar chances de serem questionados ou criticados.
Estes se esquecem que Paulo diz que nos últimos tempos cercar-se-iam de mestres segundo as suas cobiças e que estariam rodeados de gente igual. Nada mais tentador e arriscado para a fé que cercar-se de iguais. No antigo Israel a diferença foi feita pelos profetas, que anunciavam o diferente, que quebravam o discurso dogmático e questionavam os sacerdotes e reis.
Quando se celebra nestes dias Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, é hora de aceitarmos que o propósito de Deus é a vida com a diferença.

Marcos Inhauser

terça-feira, 12 de maio de 2009

SEM PODER FICAR, NEM SAIR

A cana é um dos produtos agrícolas mais fortes da República Dominicana e o governo tem grandes interesses na sua produção. Há algumas décadas, como forma de reduzir o custo da produção via mão-de-obra barata, o governo dominicano fez vista grossa (alguns dizem que estimulou) a vinda de haitianos ilegais para trabalhar na lavoura da cana. Eles vieram e foram formando pequenos povoados, alguns em terras do governo, conhecidos como batéis.
São vilas de extrema pobreza, sem água encanada ou esgoto, onde se vive sob constante tensão pelo medo das investidas policiais. Há alguns anos o governo dominicano decidiu privatizar várias usinas de açúcar e as menos rentáveis foram fechadas e os trabalhadores, na quase totalidade haitianos ilegais, ficaram à mercê da sorte, visto não terem nenhum direito trabalhista.
Não bastasse isto, há outra situação que raia a um drama kafkiano: a constituição dominicana assegura o direito à nacionalidade para aqueles que nascem em seu território, como acontece com quase todos os países. Por manobras interpretativas, este direito tem sido negado a quem nasce em território dominicano e não é filho de pais dominicanos, mesmo quando um deles o é, tal como ocorre com inúmeros casais haitianos.
Com isto, filhos de haitianos nascidos na República Dominicana não podem ter o direito à nacionalidade e lhe é negada a certidão de nascimento. Sem isto, eles não são aceitos nas escolas públicas e, por conseguinte, não podem estudar e aumentam a população miserável de haitianos.
O assunto tomou tal monta que o governo se viu pressionado a revisar esta conduta de negar a cidadania aos que nascem em seu território. Ao invés de rever a norma, por inconstitucional que é, está promovendo uma reforma na Constituição para assegurar que haitianos não possam ter cidadania dominicana. As discussões estavam acaloradas nos dias em lá estive e ainda não havia um veredicto final, mas as coisas se encaminhavam para a vitória governista e o impedimento à cidadania de filhos de não-dominicanos.
Cria-se assim uma situação de horror e surreal: eles não podem ficar em território dominicano porque não são aceitos como tais, mas não podem se mudar para outra parte porque não possuem documentos. É a velha história do “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”.
O que mais me chama a atenção neste episódio é que não vi em nenhum jornal, noticiário ou notícias na internet alguma alusão a este imbróglio. Talvez porque se trate de negros, haitianos, ilegais, pobres, e sem nacionalidade. Não são gente.
Depois querem me vender a idéia de que a mídia noticiosa é imparcial e que busca a justiça.

Marcos Inhauser

terça-feira, 5 de maio de 2009

ATOLADO NO ESGOTO

Recebi uma foto, destas que rodam a internet, que vinha em meio a uma série de outras que mostravam trabalho duro. Entre as muitas, havia uma de um trabalhador em limpeza de esgoto que estava com a boca-de-lobo aberta e tinha enfiado a cabeça no esgoto entupido e transbordante, ficando ajoelhado na parte de fora e assim “atolado” até a cintura para conseguir arrumar a coisa. Quando vi a foto, imediatamente pensei que ela era um retrato das nossas casas legislativas.
Os recentes escândalos da farra das passagens, da casa do Agaciel, do apartamento funcional dados aos filhos do diretor João Carlos Zoghbi, do laranjal que ele tem para camuflar empresas que prestam serviço à casa, da quantidade de diretores que o Senado sustentava, a quantidade de denúncias feitas pelo casal Zoghbi que agora se retira, das denúncias feitas por ex-assessor do Jereissati, vem reforçar que se trata de um esgoto a céu aberto e que deputados e senadores estão como aquele trabalhado da foto: enfiados de cabeça.
Não acredito que a coisa seja nova, haja visto o argumento mais usado pelos parlamentares para explicar suas condutas, qual seja, de que sempre se fez assim, que as coisas não estavam claras, que se entendia deste ou daquele jeito. O que é novo é a imprensa e segmentos da sociedade terem acesso a certos dados, depois de muita pressão e trabalho duro de investigação, e revelarem o que se faz nos corredores e subterrâneos das casas legislativas.
Outro elemento que acho que pesou para a revelação destes fatos é a sede da república sindicalista e dos “cumpanheros” agraciados com cargos na administração federal, de estatais e demais esferas da administração pública. Famintos de uma riqueza fácil e sendo liderados por um chefe que não sabe de nada, atacaram com voracidade, fazendo botins nas licitações, contratos e outros expedientes comissionáveis, que acabou gerando uma luta interna pela partição da parte do bolo que se corta debaixo da mesa. Descontentes e prejudicados se encarregaram de vazar para o público certas práticas da partilha.
Plagiando o guru-mór-sindicalista, nunca na história deste país se soube de tanta corrupção quanto agora. O estado está aparelhado para fazer a sucessora do Lula, ou, caso se agrave sua saúde, emplacar uma mudança constitucional que lhe permita a segunda reeleição.
Espero e sonho que tenhamos uma mobilização nacional, como nunca se viu na história neste país, que, com a coisa até o pescoço, dê um basta nos oligarcas do esgoto.

Marcos Inhauser

Marcos Inhauser