Os nomes dados às
operações da Polícia Federal indicam que há gente que lê e estuda dentro da
corporação. Os mais variados nomes já foram usados e a mais recente, deflagrada
ontem, Politeia, remete ao texto de
Platão, a República, onde o filósofo tece comentários negativos à democracia.
Dizem os entendidos que, influenciado por uma postura intelectualista de
Sócrates, Platão a incorpora em seu pensamento, dando-lhe amplitude política.
Em a República demonstra que não é possível pensar a política como prática
qualquer e corriqueira, destituída de orientação cognitiva e de pressupostos
epistemológicos. Assim, toda ação política
correta depende da visão dada por um saber relacionado à organização da cidade.
Para ele, a pólis é um organismo moral e uma
comunidade ética, cuja finalidade é a realização da justiça e da virtude e não
somente a conquista de objetivos como a segurança, bem-estar,
produção de riquezas etc. Para isto, é necessário se fundar a pólis com uma elite intelectual, a qual,
possuindo a sabedoria, norteará o funcionamento da vida política.
Se o que temos no
Brasil é uma democracia, certamente não o é nos termos mencionados por Platão. O
que temos está mais para corruptocracia. Vale citar SHAPIRO (Os fundamentos
morais da política. Trad. de Fernando Santos. São Paulo: Martins Fontes, 2006,
p. 245): “Como existe o predomínio da democracia no mundo contemporâneo,
qualquer investigação dos fundamentos morais da política tem, ... , que estar
atenta ao papel desta na legitimação dos regimes políticos. O fato de que
governos das mais diversas colorações ideológicas, ... , tentem se cobrir com o
manto da democracia é uma prova a mais ... de que o compromisso com a
democracia é um componente indispensável da legitimidade política [...] No
mundo contemporâneo, ... , a aprovação à ideia de democracia é ...
inegociável.”
Em outras
palavras, há a necessidade inegociável de se chamar democracia aquilo que é
corruptocracia.
Os eleitos não são
os mais qualificados intelectualmente (os apedeutas eleitos nos mais variados
níveis são prova disto), nem os mais bem preparados para a vida pública.
Elegem-se os que têm visibilidade midiática, os que têm apelido jocoso, são
filhos de políticos ou são conhecidos por atividade que nada ou pouco tem a ver
com as habilidades para a vida política.
No sistema
eleitoral brasileiro, onde a eleição é ganha com tempo de televisão e
assessoria marqueteira, aliada ao fato de que os detentores de cargos eletivos
dispõem de um caminhão de assessores ou contratados como comissionados, regiamente
pagos com o erário, a renovação dos eternos políticos é tarefa hercúlea.
O financiamento
das milionárias campanhas, se feitos com recursos próprios, só permite que
ricos sejam eleitos. Se financiados pelo setor privado, o preço será cobrado,
assim como se cobrará também o que foi gasto com recursos próprios.
Fala-se em reforma
eleitoral e a Câmara está às voltas com ela. Do que se pode depreender naquilo
que já foi votado e do que está por vir, as mudanças são cosméticas. Atacam-se
alguns efeitos, mas não a causa: o custo das campanhas e a rigorosa
fiscalização dos gastos e financiamentos. Pelo andar da carruagem, tudo indica
que o poder fiscalizador da Justiça Eleitoral (que já era tênue e e-lento-ral)
será ainda mais engessado pela redução dos prazos de investigação e
sentenciamento. Acrescente-se a isto o fato de que há gente querendo que a
destituição de prefeitos, vice, governadores, etc. só possa ser feito por órgão
colegiado e não mais por sentença monocrática.
Ao que parece,
ainda demoraremos algumas décadas para que a corruptocracia seja substituída
pela democracia, pela eleição de agentes com sabedoria e não apelido, com
conhecimento e não presença midiática, gente que não se orgulhe de não ter
estudado e nem que afirme que ler dá sono.
Marcos Inhauser
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