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quinta-feira, 22 de junho de 2017

INVESTIGAÇÕES, MANTRAS E CONDENAÇÕES

Muitos já disseram que, em nenhuma outra época da história do Brasil, houve tanta investigação policial como o que se tem feito nos últimos três anos. Desde o início da Lava Jato muita gente foi investigada, muita coisa foi descoberta, nunca se teve tanta gente contando o que sabe em troca de redução das penas, nunca se devolveu tanto dinheiro roubado aos verdadeiros donos como tem acontecido nestes tempos.
Por outro lado, não se pode deixar de reconhecer o sentimento de “quase-impunidade” que reina entre os delatores. Basta delatar e entregar as provas que os crimes mais escabrosos são abençoados com uma punição simbólica. Isto quando a coisa não é o perdão completo pelos crimes cometidos.
Os delatados, investigados e réus têm mantras que repetem incessantemente, como se a repetição deles exorcizasse a pena merecida: “todas as contribuições foram feitas segundo a legislação”; “as contas foram aprovadas pela Justiça eleitoral”; “provarei minha inocência nos autos”; “minha vida sempre foi ética, transparente e conhecida de todos”; etc. Este é o mantra da auto-absolvição!
Outro mantra repetido por um e que ganha alguns adeptos é “não vi, não sei, não pedi, não autorizei, não tenho, não sou, aquilo é tralha, etc.”. É o mantra da negação.
Há ainda o mantra da terceirização: “nunca perguntei para ele de onde vinha o dinheiro”, “ele me deu o presente e eu o recebi”, “achei que era afruto do seu trabalho”, “era o pagamento da pensão que eu tinha direito”, “as despesas da campanha foram de responsabilidade do Beltrano”, etc.
Outro ainda é o mantra da vitimização: “isto é intriga da oposição”, “perseguição política contra minha pessoa”, “é a oligarquia querendo acabar com as conquistas dos pobres”, “querem me atribuir um crime que só existe na cabeça do meu acusador”, “foi um empréstimo de um amigo para me ajudar em uma situação difícil”, etc.
Diante dos investigadores e juiz há outros mantras: “reservo-me no direito de permanecer em silêncio”, “nada a declarar”, “só responderei às perguntas feitas pelos advogados de defesa”, “não respondo perguntas capciosas”, “eu não sei onde vossa excelência quer chegar com estas perguntas”, “o que este juízo quer é encontrar algo para provar o que, a priori, já definiram como sendo a verdade”.
Já tivemos alguns julgamentos simbólicos e históricos nestes últimos tempos. Talvez o mais exemplar foi o do TSE que, fazendo-se de cego e surdo, rejeitou provas legalmente colhidas e que incriminavam a chapa Dilma-Temer. O (ex?) senador Aécio está sendo julgado no momento em que escrevo estas linhas. O Temer será denunciado e será também julgado pelo Senado e, se não conseguir se safar com os 172 votos, será também julgado pelo STF. Mas e o Renan, Collor, Padilha, Moreira Franco, Rodrigo Maia, Eunício, Guido Mantega, Palocci, Eduardo Cunha, Funaro, Sarney, e tantos outros? Quando serão julgados? Vão recitar os mesmos mantras ou vão assumir o discurso da delação, entregando o que sabem fizeram e ganharam?
Ou, para tentar escapar de vez, vão tramar nos corredores a anistia ao “caixa dois”, o “abuso de autoridade”, a impossibilidade de se investigar porque fere a privacidade dos criminosos, a acusação aos investigadores como torturadores emocionais de pobres vítimas, a recuperação de recursos ilícitos como sendo o abuso contra a propriedade privada?
Marcos Inhauser

quarta-feira, 15 de julho de 2015

POLITEIA

Os nomes dados às operações da Polícia Federal indicam que há gente que lê e estuda dentro da corporação. Os mais variados nomes já foram usados e a mais recente, deflagrada ontem, Politeia, remete ao texto de Platão, a República, onde o filósofo tece comentários negativos à democracia. Dizem os entendidos que, influenciado por uma postura intelectualista de Sócrates, Platão a incorpora em seu pensamento, dando-lhe amplitude política. Em a República demonstra que não é possível pensar a política como prática qualquer e corriqueira, destituída de orientação cognitiva e de pressupostos epistemológicos.  Assim, toda ação política correta depende da visão dada por um saber relacionado à organização da cidade.
Para ele, a pólis é um organismo moral e uma comunidade ética, cuja finalidade é a realização da justiça e da virtude e não somente a conquista de objetivos como a segurança,  bem-estar,  produção de riquezas etc. Para isto, é necessário se fundar a pólis com uma elite intelectual, a qual, possuindo a sabedoria, norteará o funcionamento da vida política.
Se o que temos no Brasil é uma democracia, certamente não o é nos termos mencionados por Platão. O que temos está mais para corruptocracia. Vale citar SHAPIRO (Os fundamentos morais da política. Trad. de Fernando Santos. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 245): “Como existe o predomínio da democracia no mundo contemporâneo, qualquer investigação dos fundamentos morais da política tem, ... , que estar atenta ao papel desta na legitimação dos regimes políticos. O fato de que governos das mais diversas colorações ideológicas, ... , tentem se cobrir com o manto da democracia é uma prova a mais ... de que o compromisso com a democracia é um componente indispensável da legitimidade política [...] No mundo contemporâneo, ... , a aprovação à ideia de democracia é ... inegociável.”
Em outras palavras, há a necessidade inegociável de se chamar democracia aquilo que é corruptocracia.
Os eleitos não são os mais qualificados intelectualmente (os apedeutas eleitos nos mais variados níveis são prova disto), nem os mais bem preparados para a vida pública. Elegem-se os que têm visibilidade midiática, os que têm apelido jocoso, são filhos de políticos ou são conhecidos por atividade que nada ou pouco tem a ver com as habilidades para a vida política.
No sistema eleitoral brasileiro, onde a eleição é ganha com tempo de televisão e assessoria marqueteira, aliada ao fato de que os detentores de cargos eletivos dispõem de um caminhão de assessores ou contratados como comissionados, regiamente pagos com o erário, a renovação dos eternos políticos é tarefa hercúlea.
O financiamento das milionárias campanhas, se feitos com recursos próprios, só permite que ricos sejam eleitos. Se financiados pelo setor privado, o preço será cobrado, assim como se cobrará também o que foi gasto com recursos próprios.
Fala-se em reforma eleitoral e a Câmara está às voltas com ela. Do que se pode depreender naquilo que já foi votado e do que está por vir, as mudanças são cosméticas. Atacam-se alguns efeitos, mas não a causa: o custo das campanhas e a rigorosa fiscalização dos gastos e financiamentos. Pelo andar da carruagem, tudo indica que o poder fiscalizador da Justiça Eleitoral (que já era tênue e e-lento-ral) será ainda mais engessado pela redução dos prazos de investigação e sentenciamento. Acrescente-se a isto o fato de que há gente querendo que a destituição de prefeitos, vice, governadores, etc. só possa ser feito por órgão colegiado e não mais por sentença monocrática.
Ao que parece, ainda demoraremos algumas décadas para que a corruptocracia seja substituída pela democracia, pela eleição de agentes com sabedoria e não apelido, com conhecimento e não presença midiática, gente que não se orgulhe de não ter estudado e nem que afirme que ler dá sono.
Marcos Inhauser