UM MANTRA CONDENATÓRIO
Nestes tempos de Lava Jato virou mantra as declarações de
gente envolvida com as “ofertas” das empreiteiras para financiar campanhas
políticas. Sem exceção, a frase repetida ad
nausean é: “as contribuições foram devidamente declaradas à Justiça
Eleitoral, que as aprovou”.
Confesso que meus miolos dão um chilique quando são
bombardeados com tais declarações que, diga-se, não é exclusiva do partido mais
enrolado (até aqui) com as revelações.
Ainda que meu raciocínio possa ser questionado em um ponto ou
outro, creio que ele se aplica. Imagine-se que o traficante José dos Anzóis coloca
em sua Declaração Anual de Imposto de Renda os ganhos obtidos com sua atividade
e paga o absurdo do imposto que se cobra. Mais tarde se descobre que os ganhos
que teve não foi produto de atividade ilícita, o narcotráfico. Ao ser
questionado, solta uma nota pública afirmando categoricamente que os
rendimentos foram declarados à Receita Federal e que os devidos impostos foram
pagos. Estaria o indigitado inocente por ter declarado e pago os impostos?
Imagine-se que os ladrões de bancos declarassem os
rendimentos oriundos dos caixas eletrônicos arrombados e pagassem o devido
imposto. Estariam imunes do crime por terem sido “honestos” em declarar a
receita ao Fisco?
Imagine-se que, ao invés de serem os meliantes os declarantes
dos rendimentos, terceirizam tal prática a um laranja ou a uma empresa, por
exemplo Motel, Hotel, Restaurante, fazenda de gado ou coisa que o valha. Como é
difícil a verificação da ocupação dos motéis e hotéis, a quantidade de
refeições servidas ou a quantidade de crias que o rebanho teve, poderia
perfeitamente atribuir um ganho excepcional. Isto foi feito por um senador
conhecido que alegou que sua riqueza era fruto da fertilidade do seu rebanho
(dado que deveria entrar para o Guiness como sendo o mais fértil do mundo!).
Mais tarde se descobre que a origem de tal riqueza foi fruto de atividades
outras. Mas o suspeito vem a público afirmar que declarou ao Fisco seus ganhos.
Se a Justiça Eleitoral aceitou as declarações e aprovou as
contas, e depois se descobre que a origem das verbas era ilícita, as ações de
declaração e aprovação não eximem do crime, antes, a bem da verdade, a justiça
deve reexaminar o caso e mudar a sentença aprobatória à luz dos novos fatos.
Mas, confesso, estranha-me que os auditores do Tribunal de
Justiça nunca se tivessem perguntado como é que tão poucos (as construtoras)
contribuíam tão generosamente. Será que nunca lhes passou pela cabeça que
estavam deixando passar uma boiada ao aprovar um boi? Se se soma o quanto estas
construtoras deram aos partidos e políticos, chega-se a números de chamar a
atenção. E onde estavam o COAF, o Fisco, os auditores do TSE? Foi preciso haver
delação para haver conscientização? Ou a delação trouxe à tona a omissão dos
que deveriam fiscalizar? Ou os que deveriam fiscalizar não o faziam porque
deviam seus empregos aos beneficiados pelo propinoduto das contribuições
eleitorais, eufemisticamente chamados de “bônus eleitoral”?
Contrariamente à madame presidente, eu creio em delatores,
ainda que faça distinção entre eles. Há delatores que entregam outros que são
companheiros de lutas. Há delatores que entregam suas confissões criminais. Os
primeiros o fazem por fraqueza. Os segundos por confissão e espírito cívico. Os
primeiros por covardia. Os segundos por coragem cívica. Os dois o fazem para se
livrar de penas maiores.
Quem mentiu descaradamente à nação para conseguir a
reeleição, não pode vir a público passar lição de moral em quem fala a verdade!
Marcos Inhauser