Nunca fui de ler romances ou contos. Li vários, mas sempre gostei mais de livros mais conceituais. Ainda no início da adolescência li, de Stefan Zweig, “Brasil, o país do futuro”. Fiquei encantado e o sonho do futuro embalou muita coisa na adolescência e juventude. Acreditava piamente que o Brasil era o país do futuro. Empolguei-me com o Juscelino e a construção de Brasília e pensava: “agora vai!”
A cada
pouco ouvia algum político de renome repetir a frase ou a ideia e isto mexia
com meus brios. Acreditei no Jânio Quadros com seu símbolo da vassourinha e o
jingle “varre, varre vassourinha”. Era, para mim o futuro chegando. Estive,
criança ainda, em um palanque em que ele discursava e tenho uma foto ao lado
dele, em cima da carroceria de um caminhão.
No final de
1965 fui morar em El Salvador e me lembro de quantas vezes tive conversas e
discussões acaloradas, dizendo aos colegas de escola que o Brasil era a
potência dos anos 2000. Veio a ditadura. Tios e primos apoiavam os militares e
eu ficava meio perdido. Lia dois jornais por dia, estudava em colégio com
alguns críticos, lia o Pasquim assim que saía. Conseguia comprar escondido
porque as bancas que o vendiam eram incendiadas. Acompanhei pari passu
os eventos do Restaurante Calabouço, a morte do estudante, a revolução da UNE
contra o acordo MEC-USAID. Achava que Guilherme Palmeira estava liderando a
marcha para o futuro. Voltei de El Salvador no final de 1966 e vibrei com os
festivais de música e meu hino passou a ser a canção de Vandré: “quem sabe faz
a hora, não espera acontecer”.
A ditadura
demorava para acabar. Ficava sabendo dos horrores nos porões do DOI-CODI e tive
um amigo preso que nunca mais soube dele. Parece que o combustível do sonho que
havia em mim estava acabando. Entre o Brasil do futuro e o Brasil da realidade,
a energia foi sendo exaurida. Comecei a ficar cético e algumas vezes irritado
quando alguém afirmava Brasil-potência, país do futuro, o Brasil tem tudo para
dar certo. Uma frase começou a aparecer na minha mente cada vez que ouvia isto:
“ou acabamos com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil”. Ela estava em um
pacote de veneno. Eu sabia onde estavam as saúvas, mas faltava o veneno.
Tive um
lampejo de ânimo quando soltaram o plano Cruzado. Ingenuidade. A saúva acabou
com a proposta. Não conseguia acreditar no Sarney (e ainda não consigo, pois o
acho a saúva mor). O que veio depois foi acentuando minha desilusão quanto ao
futuro. Comecei a questionar o sistema partidário, as eleições via marketing, o
sistema bicameral, a capacidade de eleger gente nova para o sauveiro central. A
cada dia que ouço os jornais, tanto no radio como na TV, que leio o jornalismo
de opinião, que recebo as mensagens, as mais variadas, nos grupos de WhatsApp,
mais me desencanto com o país do futuro.
A cada
reunião do STF tomo uma injeção de depressão. Um desfile de narcisos que não me
convencem da imparcialidade e impessoalidade que devem nortear seus
julgamentos. Quando ouço o Lira ou o Pacheco, a vela com luz tênue leva um
sopro e apaga. Nunca me lembro de ter ouvido tanta babaquice de expoentes da
política nacional. Parece que recebem mídia training para falar non senses.
Agora de manhã ouvi a entrevista do Ciro Nogueira acusando o Mandetta de ser show
man e defendendo o Pazuello.
A pergunta
vem forte à mente: quando é o futuro? Eu o espero há 60 anos e nada dele. Seria
algo parecido ao romance “Esperando Godot”?
Ele azedou
o meu dia!
Marcos
Inhauser