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quarta-feira, 31 de março de 2021

Páscoa, lições da páscoa, serviço, isolamento, medo

O mundo cristão ocidental celebra a Semana Santa, quando faz recordação dos eventos últimos da vida de Jesus, sua morte e ressurreição. Há nos eventos uma velocidade porque, no domingo de Ramos, ele entra em Jerusalém aclamado como rei. Dias depois ele está celebrando a Páscoa com seus discípulos, logo em seguida vai ao Getsêmani e ali sofre todo os sofrimentos ao ponto de suar sangue. Na mesma noite de sexta é preso por causa da traição de um dos seus. É apresentado a Pilatos e Herodes. Os mesmos que o aclamaram estavam agora a pedir sua crucificação.

Da glória à extrema humilhação em poucos dias. Paradigma da vida humana, pois também já tivemos experiências de sair de uma situação de conforto e nos vermos atirados à sarjeta. Muitas lições já foram tiradas destes eventos e trazer alguma novidade sobre ele é tarefa inglória. No entanto quero ressaltar alguns aspectos desta trajetória do Mestre nestes seus momentos derradeiros.

A primeiro é que ele foi traído por um deles. O traidor tinha recebido um voto de confiança do grupo e foi nomeado o tesoureiro. O texto joanino afirma que “era ladrão e, tendo a bolsa, tirava o que nela se lançava” Jo 12:6). A experiência de ser trapaceado por um amigo próximo ou parente é algo tão antigo quanto comum na história. Como diz o ditado “de onde menos se espera é que vem a decepção. Traição só existe quando há entre os traídos e o traidor algum nível de relacionamento e confiança. Levar a rasteira de um amigo ou irmão é algo muito dolorido.

O segundo evento é o da mulher que ungiu os pés de Jesus com o vaso de perfume. Ela quebrou o frasco para ungir os pés do Senhor. Ela se colocou de joelhos à frente do Mestre para servi-lo, símbolo de quebrantamento, de contrição, de serviço e estes elementos são essenciais na vida cristã. Precisamos nos colocar aos pés do Mestre para sermos quebrantados, permitindo exalar o bom perfume de Cristo. É nos despojar-se de coisas em favor do outros, até mesmo as mais valiosas, que mostramos o amor concreto. E quando amamos o irmão ou irmã na concretude de suas necessidades, amamos ao próximo e a Deus. Assim ensina a primeira epístola de João.

O terceiro evento está relacionado à deturpação que havia sido cometida no Templo, onde os mais variados tipos de comércio se davam, cambistas exploravam e sacerdotes vendiam bençãos. Os tempos são outros e a coisa permanece. Templos atuais estão mais para shopping centers da fé, onde “agraciados com o dom de Deus”, vendem benção, cobram por exorcismo fantasiosos, ensinam barbaridades. São Templos ao deus prosperidade. Virou “show da fé”. E estes mercadores da palavra se arvoram em porta-vozes da Igreja e fazem as bajulações para que suas dívidas fiscais sejam perdoadas, como realmente foram.

O quarto evento se refere à atitude dos apóstolos logo depois da crucificação. Por medo, se isolaram e se trancaram dentro de casa. No que pese este comportamento, o Mestre foi até eles e os encontrou e soprou sobre eles o Espírito e disse: “Paz seja convosco”. Estamos em tempos de reclusão, de medo, de isolamento, mas mesmo nestes momentos recebemos a mensagem: “paz seja convosco”. Era o ressurreto. Precisamos de ressurreições nestes tempos que vivemos.

Mais do que nunca ansiamos por esta paz (o sentido de paz no hebraico também é saúde). Queremos a paz de Cristo e não o caos que o Pilatos moderno impõe sobre a população.

Marcos Inhauser

 

 

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

O MEDO E A FÉ


Segue texto enviado por Maria Luiza Rücket, autora do livro "Capelania hospitalar e ética do cuidado", amiga, que me autorizou a fazer pequenas edições no exto para que o mesmo coubesse no espaço desta coluna.
“Um dos chefes da sinagoga, chamado Jairo, prostrou-se aos pés de Jesus, pois sua filha estava à beira da morte. Com insistência, suplicou que Jesus impusesse as mãos sobre a menina, para que ela fosse salva e continuasse viva. Jesus o acompanhou, mas enquanto caminhavam veio a notícia de que a menina havia morrido. Jesus então falou ao pai: “Não temas, crê somente” (Marcos 5,36).
Jesus contrapõe a fé ao temor: o medo deve ser vencido pela fé.
O medo é uma força atuante. O médico francês Frederic Leboyer, que se notabilizou com o livro Nascer sorrindo, constatou que o medo nos acompanha do nascimento à morte. Reflexões já foram elaboradas a respeito de medo, temor, angústia, ansiedade, preocupação. Essas emoções negativas causam malefícios à saúde e às relações interpessoais.
Até uma determinada intensidade, o medo pode nos ajudar a evitar certos perigos. Ele se torna em profilaxia para não nos expormos a riscos desnecessários. Mas, nós não temos o controle sobre essa dosagem do medo e ele se torna uma força muito poderosa e prejudicial em nossa vida.
Nos dias atuais despontou mais um tipo de temor: é o medo do anonimato. Para se diferenciarem das demais, as pessoas recorrem cada vez mais às tatuagens e às técnicas de modelar o corpo. Mesmo sabendo dos riscos, muitas pessoas recorrem ao implante de silicone industrial. Recorre-se a uma enormidade de recursos para se tornar diferenciado. O risco é grande, mas o medo do anonimato fala mais alto.
É desse temor nocivo e até patológico que Deus quer nos libertar. A exortação de não temer perpassa a Bíblia toda – desde Gênesis 15,1 até Apocalipse 1,17.
Em nossa existência, nos defrontamos com duas forças poderosas: o medo e a fé. O medo tem dominado muitas vidas, causando infelicidade e desgraça. Mas a fé é mais forte do que o medo. E somente a fé pode vencer o medo. A declaração de Jesus mostra isso.
Como devemos proceder para substituir o medo pela fé?
Para o salmista, fé é sinônimo de confiança. O salmista confiava na intervenção de Deus, capaz de socorrer em meio às angústias e perigos. Também Jesus interpelava as pessoas apontando para a confiança. Para acontecer a cura, a pessoa precisa se posicionar. Portanto, a confiança em Deus é uma força mais poderosa do que o temor – diante de doenças, do anonimato, da calúnia, da desonra, da morte.
Precisamos sempre, de novo, redimensionar a nossa fé. Muitas pessoas entendem a fé como sendo a adesão a um conjunto de doutrinas. E a fé torna-se sinônimo de “acreditar”. Esforçam-se para acreditar, mesmo percebendo que a realidade não cabe dentro dessa doutrina. Mas, com essa insistência, continuam com medo, muito medo. Inclusive com o medo de que a doutrina venha a ser ameaçada pelo ateísmo.
A confiança é diferente, pois ela resulta do reconhecimento de que nós não temos o controle dos acontecimentos. Portanto, só nos resta entregar a nossa existência ao poder que controla toda a realidade. Confiança é entrega. Ela precisa ser exercitada diante de cada circunstância que se apresenta.

quarta-feira, 2 de março de 2016

MAIS MEDO QUE ESPERANÇA



Sabe-se que o medo é a mola propulsora da criatividade e que esta também é fruto da necessidade. Por outro lado, também é paralisante porque, diante dele, muitos paralisam e se deixam vencer pelo medo. O problema é a atitude assumida.
A esperança, por sua vez, é a mola motora para o futuro. Ela é a que provoca o dinamismo. Sem esperança morremos.
Estamos vivendo momentos em que o medo se mostra mais presente que a esperança. Penso na infinidade de pessoas que saem todos os dias para o trabalho com o medo estampado na face de que podem perder o emprego. Ontem, em um banco, um jovem à minha frente comentou que estava entrando em período de férias coletivas, ao que o outro disse: isto é pre-demissão. Foi a instalação do medo no outro.
Ainda agora falava com uma pessoa de RH que ficou um mês em casa, de férias, e deve voltar amanhã. Está sem dormir achando que vai perder o emprego e se o perder, não terá como pagar as contas.
No Brasil de hoje estamos com medo do desemprego, das contas, do zica, da dengue, da chikungunya, da impunidade, da corrupção, etc. Há também o medo dos investigados pela PF e Justiça. Há quem desça da van mascando chiclete, como para dizer que está tranquila, há o que desce dela sorrindo e há os que cobrem a cabeça para não serem vistos. Há os que se negam a fazer qualquer declaração e os que, a cada coisa que dizem, se enrolam ainda mais. É o medo a trapacear a verdade que acaba se manifestando nos atos falhos e nas meias verdades. Esperança de que, ao dizer meias verdades, se livre do que sobre os ombros lhe pesa. É o medo que faz apresentar novas versões a cada depoimento, que muda depoimentos e nega o que disse. Esperança de um habeas corpus que não se concretiza no STF.
A esperança anda meio anêmica. Parece que, se há luz no fim do túnel, o que se tem lá é uma vela e está ventando. A cada dia as novas notícias parecem ser dose de veneno para a esperança. Haja visto a troca do ministro da Justiça, na tentativa de aplacar as investidas da PF. Parece que a esperança tem sucumbido à maciça dose de medo, passada pelos prognósticos pessimistas dos economistas (os reis do chute), pelos desdobramentos da Lava Jato que a cada dia nos mostra que o câncer é maior. Parece uma cirurgia em que o médico abre a pessoa para ver o que tem lá dentro e descobre que o corpo todo foi tomado pelo câncer. Sobra alguém?
Mas se o medo é a mãe da criatividade e a esperança a mola propulsora para o amanhã, devemos ser criativos diante do medo e propor o amanhã da esperança. Não uma luta por causa dos R$ 0,30 na passagem do ônibus e nem pelo passe livre, mas pensar o amanhã, diferente dos ontens que tivemos. Este é o desafio da sociedade brasileira. Um amanhã cheio de justiça, com mecanismos reguladores que funcionam, com políticos que busquem o bem público e não a propina própria, que a diferença entre ricos e pobres seja diminuída, que a comida seja farta, que a mesa seja cheia, que se gaste mais com comida que com farmácia, etc.
No dizer de Isaías, o profeta: que as armas sejam transformadas em arados.
Marcos Inhauser