Leia mais

Há outros artigos e livros de Marcos e Suely Inhauser à sua disposição no site www.pastoralia.com.br . Vá até lá e confira

Mostrando postagens com marcador Stefan Zweig. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Stefan Zweig. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 5 de maio de 2021

QUANDO É O FUTURO?

Nunca fui de ler romances ou contos. Li vários, mas sempre gostei mais de livros mais conceituais. Ainda no início da adolescência li, de Stefan Zweig, “Brasil, o país do futuro”. Fiquei encantado e o sonho do futuro embalou muita coisa na adolescência e juventude. Acreditava piamente que o Brasil era o país do futuro. Empolguei-me com o Juscelino e a construção de Brasília e pensava: “agora vai!”

A cada pouco ouvia algum político de renome repetir a frase ou a ideia e isto mexia com meus brios. Acreditei no Jânio Quadros com seu símbolo da vassourinha e o jingle “varre, varre vassourinha”. Era, para mim o futuro chegando. Estive, criança ainda, em um palanque em que ele discursava e tenho uma foto ao lado dele, em cima da carroceria de um caminhão.

No final de 1965 fui morar em El Salvador e me lembro de quantas vezes tive conversas e discussões acaloradas, dizendo aos colegas de escola que o Brasil era a potência dos anos 2000. Veio a ditadura. Tios e primos apoiavam os militares e eu ficava meio perdido. Lia dois jornais por dia, estudava em colégio com alguns críticos, lia o Pasquim assim que saía. Conseguia comprar escondido porque as bancas que o vendiam eram incendiadas. Acompanhei pari passu os eventos do Restaurante Calabouço, a morte do estudante, a revolução da UNE contra o acordo MEC-USAID. Achava que Guilherme Palmeira estava liderando a marcha para o futuro. Voltei de El Salvador no final de 1966 e vibrei com os festivais de música e meu hino passou a ser a canção de Vandré: “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”.

A ditadura demorava para acabar. Ficava sabendo dos horrores nos porões do DOI-CODI e tive um amigo preso que nunca mais soube dele. Parece que o combustível do sonho que havia em mim estava acabando. Entre o Brasil do futuro e o Brasil da realidade, a energia foi sendo exaurida. Comecei a ficar cético e algumas vezes irritado quando alguém afirmava Brasil-potência, país do futuro, o Brasil tem tudo para dar certo. Uma frase começou a aparecer na minha mente cada vez que ouvia isto: “ou acabamos com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil”. Ela estava em um pacote de veneno. Eu sabia onde estavam as saúvas, mas faltava o veneno.

Tive um lampejo de ânimo quando soltaram o plano Cruzado. Ingenuidade. A saúva acabou com a proposta. Não conseguia acreditar no Sarney (e ainda não consigo, pois o acho a saúva mor). O que veio depois foi acentuando minha desilusão quanto ao futuro. Comecei a questionar o sistema partidário, as eleições via marketing, o sistema bicameral, a capacidade de eleger gente nova para o sauveiro central. A cada dia que ouço os jornais, tanto no radio como na TV, que leio o jornalismo de opinião, que recebo as mensagens, as mais variadas, nos grupos de WhatsApp, mais me desencanto com o país do futuro.

A cada reunião do STF tomo uma injeção de depressão. Um desfile de narcisos que não me convencem da imparcialidade e impessoalidade que devem nortear seus julgamentos. Quando ouço o Lira ou o Pacheco, a vela com luz tênue leva um sopro e apaga. Nunca me lembro de ter ouvido tanta babaquice de expoentes da política nacional. Parece que recebem mídia training para falar non senses. Agora de manhã ouvi a entrevista do Ciro Nogueira acusando o Mandetta de ser show man e defendendo o Pazuello.

A pergunta vem forte à mente: quando é o futuro? Eu o espero há 60 anos e nada dele. Seria algo parecido ao romance “Esperando Godot”?

Ele azedou o meu dia!

Marcos Inhauser