Uma das necessidades intrínsecas do ser humano é a da realização. Todos precisamos fazer algo para dizer que fomos nós que o fizemos. Em certa medida, somos avaliados pelo que fazemos, mais do que somos ou temos. A crise da meia-idade no homem fica mais acentuada se, ao olhar para trás, ele não fez nada do que possa orgulhar-se.
Esta necessidade é
irmã gêmea de outra, a do reconhecimento. Precisamos ser reconhecidos como
pessoas que somos, atuantes e fazedoras. Se alguém faz algo sem que ninguém
note o que ele está fazendo, deixará de fazê-lo depois de um tempo, salva se
for um louco totalmente desligado da realidade. O trabalhado invisível é um
mito. Todos, sem exceção (pelo menos na minha ótica) precisamos de alguém que
saiba do que fazemos. Isto leva a uma regra do trabalho: toda pessoa que faz
qualquer coisa sem ter que reportar a alguém, ou deixará de fazê-lo ou nunca o
fará com excelência.
Todos sonhamos em
fazer algo que nos perpetue na memória dos outros. Com facilidade incrível
dizemos que isto ou aquilo é um “marco histórico”, “algo que vai entrar para a
história”, porque necessitamos crer que nossos atos serão lembrados ad eternum.
Estas considerações
servem para introduzir minhas reflexões sobre a história da teologia e o seu
processo (e)(in)volutivo.
Este processo de
pensar o como a teologia foi feita e como ela se consolidou vem tomando minha
atenção há muitos anos. Se me lembro bem, ainda estudante de teologia, fiz um
curso de teologia patrística, tentando entender como os pais da igreja pensavam
a sua fé. Lembro-me que fiquei estupefato ao ler o “Pastor de Hermas” e a
“Didaque” e perceber como havia nestes escritos uma grande ênfase nas obras
como asseguradora da salvação. Mais do que isto, percebia, ainda que não sei se
corretamente, como certas colocações cheiravam à necessidade das obras para a
própria salvação.
Desta preocupação
nasceu o desejo de ler tudo quanto me foi possível sobre o período patrístico e
notadamente sobre as perseguições aos cristãos. Chamou-me a atenção as “Atas
dos mártires de Lião”, notadamente a descrição da morte de Blandina. Também a
carta enviada por Policarpo aos crentes de Roma, pedindo que não impedissem o
seu martírio, porque cria-se que a morte sacrificial por causa do testemunho da
fé cristã era forma infalível de garantir a salvação. Mais que tudo, queriam
ser lembrados como mártires, e o são.
Recordo que eu me
perguntava como o ensino da graça do evangelho de Jesus pode, em tão pouco
tempo ser desvirtuado para uma salvação sinérgica, onde trabalho humano e graça
divina atuam conjuntamente para a eficácia.
Este processo de
desvio se acentuou com as reflexões agostinianas que, ainda que calcada na
graça irresistível de Deus, acentuou a obra humana não para a salvação, mas
para a santificação. Sou salvo pela graça e isto me capacita para viver atuando
de forma a ter uma vida santa. Isto fica evidente no seu livro Confissões, onde
o tema do pecado sexual é levado ao paroxismo.
Trago isto à baila
porque vejo a quantidade de gente buscando holofotes, querendo ser visto,
conhecido e reconhecido, mas que nada vão deixam de se significativo. Não
souberam ser benção na vida dos outros, não construíram algo que fosse além de
suas vidas. Passaram pela vida em brancas nuvens, a ninguém abençoaram, e deles
se esqueceu.
Marcos Inhauser
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