Leia mais

Há outros artigos e livros de Marcos e Suely Inhauser à sua disposição no site www.pastoralia.com.br . Vá até lá e confira

Mostrando postagens com marcador memória. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador memória. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 10 de março de 2021

LEMBRADO PARA SEMPRE

Uma das necessidades intrínsecas do ser humano é a da realização. Todos precisamos fazer algo para dizer que fomos nós que o fizemos. Em certa medida, somos avaliados pelo que fazemos, mais do que somos ou temos. A crise da meia-idade no homem fica mais acentuada se, ao olhar para trás, ele não fez nada do que possa orgulhar-se.

Esta necessidade é irmã gêmea de outra, a do reconhecimento. Precisamos ser reconhecidos como pessoas que somos, atuantes e fazedoras. Se alguém faz algo sem que ninguém note o que ele está fazendo, deixará de fazê-lo depois de um tempo, salva se for um louco totalmente desligado da realidade. O trabalhado invisível é um mito. Todos, sem exceção (pelo menos na minha ótica) precisamos de alguém que saiba do que fazemos. Isto leva a uma regra do trabalho: toda pessoa que faz qualquer coisa sem ter que reportar a alguém, ou deixará de fazê-lo ou nunca o fará com excelência.

Todos sonhamos em fazer algo que nos perpetue na memória dos outros. Com facilidade incrível dizemos que isto ou aquilo é um “marco histórico”, “algo que vai entrar para a história”, porque necessitamos crer que nossos atos serão lembrados ad eternum.

Estas considerações servem para introduzir minhas reflexões sobre a história da teologia e o seu processo (e)(in)volutivo.

Este processo de pensar o como a teologia foi feita e como ela se consolidou vem tomando minha atenção há muitos anos. Se me lembro bem, ainda estudante de teologia, fiz um curso de teologia patrística, tentando entender como os pais da igreja pensavam a sua fé. Lembro-me que fiquei estupefato ao ler o “Pastor de Hermas” e a “Didaque” e perceber como havia nestes escritos uma grande ênfase nas obras como asseguradora da salvação. Mais do que isto, percebia, ainda que não sei se corretamente, como certas colocações cheiravam à necessidade das obras para a própria salvação.

Desta preocupação nasceu o desejo de ler tudo quanto me foi possível sobre o período patrístico e notadamente sobre as perseguições aos cristãos. Chamou-me a atenção as “Atas dos mártires de Lião”, notadamente a descrição da morte de Blandina. Também a carta enviada por Policarpo aos crentes de Roma, pedindo que não impedissem o seu martírio, porque cria-se que a morte sacrificial por causa do testemunho da fé cristã era forma infalível de garantir a salvação. Mais que tudo, queriam ser lembrados como mártires, e o são.

Recordo que eu me perguntava como o ensino da graça do evangelho de Jesus pode, em tão pouco tempo ser desvirtuado para uma salvação sinérgica, onde trabalho humano e graça divina atuam conjuntamente para a eficácia.

Este processo de desvio se acentuou com as reflexões agostinianas que, ainda que calcada na graça irresistível de Deus, acentuou a obra humana não para a salvação, mas para a santificação. Sou salvo pela graça e isto me capacita para viver atuando de forma a ter uma vida santa. Isto fica evidente no seu livro Confissões, onde o tema do pecado sexual é levado ao paroxismo.

Trago isto à baila porque vejo a quantidade de gente buscando holofotes, querendo ser visto, conhecido e reconhecido, mas que nada vão deixam de se significativo. Não souberam ser benção na vida dos outros, não construíram algo que fosse além de suas vidas. Passaram pela vida em brancas nuvens, a ninguém abençoaram, e deles se esqueceu.

Marcos Inhauser