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quarta-feira, 22 de agosto de 2018

MEMÓRIAS DE LITURGIAS LIBERTÁRIAS


... E o verbo se fez Liturgia e habitou entre nós, peregrinos, cheio de cantos, gestos, cores, cheiros, saberes e sabores...
E vimos, em momentos efêmeros e cheios de eternidade, a glória de QUEM tem um nome indizível, impronunciável...
Nesse “pleroma extático”, arriscamos fazer preces, divinamente humanizadas, através de nosso mantra ": Pai Nosso, de infinito carinho Maternal...”.   Propusemo-nos a inventar celebrações que nos trouxessem à terra o Deus da beleza celestial.  Fizemos coro com o Rubão: “Amo, na liturgia, tudo aquilo que saiu das mãos dos artistas. Mas quando ouço as explicações dos teólogos e mestres, o encanto quebra e eu desejo que eles tivessem falado em latim, para que eu não tivesse entendido (...) Deixe que Beleza, sem palavras ou catecismos, evangelize o mundo. Deus é beleza.”
Há uma história da liturgia contextualizada, (en)cantada sob a inspiração dos versos e os reversos da vida, desde a paixão de “Aleijadinho” até o trenzinho tupiniquim de Villa Lobos! Em toda a sua plenitude! Vivenciando Paixão, Morte e Ressurreição de um povo “maltrapilho e maltratado “!
Houve um tempo em que se celebrou esta liturgia libertária! Houve um santuário devocional! Não nos moldes dos soturnos templos, erguidos para tentar enclausurar o Criador. Palpitava na alma de irmãos e irmãs a oração atribuída a Spinoza: “Para de ir a esses templos lúgubres, obscuros e frios que tu mesmo construíste e que acreditas ser a minha casa. Minha casa está nas montanhas, nos bosques, nos rios, nos lagos, nas praias. Aí é onde Eu vivo e aí onde expresso meu amor por ti".
Alguém há de perguntar: quem eram, quem foram e quem são os peregrinos e peregrinas que para lá faziam suas santas romarias? Seremos todos nós que diremos: “São gente refugiada de comunidades regidas por Leis de Segurança Paroquial. Pastores, pastoras, seminaristas, leigos e leigas que procuravam alternativas devocionais diante daqueles manuais prescritos por técnicos da fé. São pretos, pobres e profissionais da vida que ali se identificavam com a presença da Grande Face Onipresente do Espírito!”
Ecos de Caetano Veloso:
“A tua presença envolve meu tronco, meus braços e minhas pernas
A tua presença é branca, verde, vermelha, azul e amarela
A tua presença é negra (...)
A tua presença transborda pelas portas e pelas janelas (...) “
A nossa Liturgia começava quando, como líderes paroquiais, esperávamos, ansiosamente, cada reunião deste Corpo Místico, macro-ecumênico, que se reunia em torno da mesa, da celebração e da liberdade. Nunca foi tão atual o credo wesleyano: “O mundo é nossa Paróquia“, ao qual poderíamos acrescentar: “O mundo é nossa Paróquia Litúrgica”!
Infere-se que essa expectativa “pré Reino de Deus”, verdadeiro e caipiríssimo, “aperitivo do Reino”, trazia-nos o cheiro primaveril de novos tempos. Expectativa que nos segredava a certeza de novos tempos.
Assimilamos no corpo e na alma, a festa de foliões latino-americanos, homenageando Atahualpa Yupanky, bem como os nossos da nossa estirpe “T”: Tião, Tom, Tonico e Tinoco. Aprendemos a gozar as delícias inspiradas num cancioneiro-de-vida cuja "Satisfação" era ter um Cristo com o rosto de povo, de amor radical, universal, incondicional!
Descartamos o cartesianismo eclesiástico e seus dogmas excludentes, para corajosa e graciosamente, incluir as razões de um “coração feito pele morena”.  E sob as arrebatadoras utopias apocalípticas, tivemos visões “do aqui e agora”. Revelações que nos livraram e ainda continuam livrando-nos, mesmo que temporariamente, de um cenário carregado e intoxicado pelas retas doutrinas de nossas paróquias, quase sempre neuróticas.
Libertamos liturgicamente, como bem “kerigmatizou e didatequetizou” o poeta, profeta e trovador ZÉ-das-palavras-LIMAdas, “ a pele, os pelos e os poros desta paixão". Em vez de continuarmos cantando as "Quatro Leis Espirituais", começamos a cantar a Espiritualidade de um Jesus nascido neste "chão-menino-chão-preto-chão-do-coração”.
Nesta virtual Catedral do Místico e Mesclado Corpo de Cristo redescobrimos novos sacramentos...
-          O sacramento da viola
-          O sacramento do pandeiro
-          O sacramento do chimarrão
-          O sacramento da saudosa maloca
E é sobre estas coisas sacrossantíssimas que na sequência, cantaremos, sempre sob a batuta do brincalhão Arcanjo Gabriel e seus Blue Caps...
Texto do meu amigo Carlos Alberto Rodrigues Alves, poeta, violeiro, teólogo e corajoso, que me deu a autorização para editar e aqui publicar.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

REPETICIOSO

Há uma coisa que tem me irritado e que não entendo como, estudantes da Bíblia, cometem o mesmo erro dia após dia. Há uma recomendação de Jesus no sentido de não usar de “vãs repetições ... porque pensam que pelo seu muito falar serão ouvidos” (Mateus 6:7).
Tenho notado o exercício da repetição nos cânticos (os chamados “corinhos”), especialmente os de louvor, onde frases de senso comum e jargões são repetidos à exaustão. “Eu te louvo, Oh! Deus”, “glorificado seja o teu nome”, “Tu és grande”, “Tu és digno de ser louvado”, “Tu és eterno”, “Tu és santo”, etc. Poderia citar uma quantidade enorme de exemplos destas “pérolas”.
Ocorre que elas não estão só nas letras dos cânticos, boa parte deles de pobreza ímpar no conteúdo. Os cantores e líderes de louvor se sentem na liberdade/obrigatoriedade de rechear os intervalos entre um cântico e outro com sermonetes que nada mais são do que a repetição da mesmice acima descrita. Na prática, a liturgia, ramo de estudos e prática ligados ao culto, foram depauperados e, em muitos lugares, totalmente desprezados ou ridicularizados.
A escolha dos cânticos se dá, não por critério de mensagem e unidade temática, mas pelo nível de entusiasmo e empolgação que a música e seu ritmo provocam. O que vale é a animação e não a mensagem. Sendo assim, não estranha que a mesmice não aborreça, como a mim o faz.
O problema é que se fossem só os cânticos, talvez se perdoasse porque os músicos e cantores não estudaram Bíblia e teologia com profundidade. O que também me molesta são os sermões que repetem a mesmice. Há um certo rebuscamento nas frases, nas ilustrações, mas a essência é sempre a mesma. Mudam o texto, mudam as histórias, mas o ensino se resume a uns poucos conceitos, repetidos em outras palavras, sermão após sermão. Variações do mesmo tema.
Outra mesmice são os vídeos que circulam a granel na internet e que entopem nossos celulares. São os que transferem as prédicas e os púlpitos para uma tela. Pregam a mesmice, com a diferença de que o fazem no vídeo e buscam alcançar o maior número de pessoas. Recebo destas mensagens aos montes e, quando tenho paciência de escutar, percebo a dificuldade em encontrar gente falando seus próprios pensamentos, algo que seja fruto da sua experiência. Falam banalidades e repetem o que outros disseram. Já ouvi a mesma história contado por quatro pregadores diferentes, cada qual com o ar de que estava contando uma novidade.
Posso parecer pedante ao dizer estas coisas, passando a impressão de que sou diferente. Nada disto. Quantas vezes eu me peguei no círculo vicioso da mesmice, quantas vezes fiquei com vergonha de um sermão, aula ou algo que escrevi. Não tenho o dom de trazer a novidade todas as vezes que falo, prego, ensino ou escrevo. Tenho consciência disto. Eu me policio, e busco novas fontes de informação. Nos últimos anos tenho lido coisas fora do mundo bíblico e teológico, buscando refletir sobre o diálogo que pode existir entre os mundos, às vezes díspares. O problema não é repetir algo algumas vezes. O problema é não perceber que está falando a mesmice e achado que descobriu a quadratura do círculo.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

LITURGIA

Liturgia é o nome dado desde os tempos apostólicos para o ato de tomar parte de uma solenidade cúltica, pública e corporativa. Tem o sentido original de “serviço público”. Percebe-se aqui três dimensões. A primeira é que é um ato solene, o que implica em algo especial, consciente, feito com a devida reverência. A segunda é que é um ato público, pois dele devem participar todos os que queiram e dele devem tomar conhecimento, nada sendo feito na obscuridade. A terceira é que é um ato que se realiza com a presença de pessoas e não é individual.
No Cristianismo, este culto público e solene é prestado pelo corpo de fieis, também reconhecidos e considerados como sacerdotes, naquilo que se conhece como sacerdócio universal. Todos os participantes são credenciados pois formam a nação sacerdotal (aqui presentes o corporativo e o solene). Sendo assim, a liturgia é o culto feito pelos membros de uma comunidade, que, como igreja, solenemente louvam, oram e intercedem a Deus uns pelos outros.
Ocorre que, nos seminários, no mais das vezes, o que se ensina como liturgia é a prática dos ritos religiosos, combinado com o emprego de símbolos, cerimônias e ornamentos. O ensino da liturgia se preocupa em responder à questão: como se cultua? E o que se faz é ensinar as regras para um culto bem celebrado, segundo as regras e cânones.
Ocorre que, na quase totalidade dos cultos liturgicamente celebrados (e mesmo nos que não obedecem tais regras por não conhecê-las ou por criticá-las), o culto público e corporativo é um culto individual, onde o pastor, sacerdote ou o líder da liturgia, o presta sem o concurso dos presentes. Quando se dá a participação pública é para recitar frases, cantar alguns cânticos ou fazer uma breve oração. É ele quem decide a ordem, quem faz o que, o que vai ser cantado, quem vai orar. Acaba se transformando em ação individual onde um-só-faz-por-todos. Isto sem contar aquele que canta, ora, faz solo, prega, dá a benção e fica à porta para ouvir os elogios. No dizer futebolístico “bate o escanteio e corre para cabecear a bola”.
Neste sentido causou-me estranheza quando, em uma viagem de ônibus, escutei uma senhora no banco de trás, dizendo que o pastor a havia convidado para “dar o culto” no domingo Ela ia cultuar. Eu pensei: e a igreja? Não é para menos que a maioria dos cristãos falam em “assistir” ao culto ou à missa e nunca falam em “participar”. A liturgia acaba sendo o show de um.
Se o culto deve promover e incentivar a intimidade com Deus, no “culto-de-um-só” a intimidade do pastor ou sacerdote é que é promovida. O culto é lugar de encontro das diferenças e deve ser espaço para conhecer o outro que comigo participa, saber da sua fé e experiências. É o lugar para perceber a diferença e para entender e aceitar que não são as diferenças que nos unem no culto, mas a humanidade comum que temos e a nossa necessidade de Deus. Na oração conjunta, onde oro e recebo as orações de outros que, tanto quanto eu, também estão ansiosos. Nisto sou aliviado e curado.
O culto e a missa, por serem celebrações públicas, são espaços para tornar cada um dos participantes visíveis e públicos. Não pode ser espaço para o anonimato, para segregação. É o espaço para tornar pública minha oração individual e privada. Onde é que, nos cultos e missas, o adorador/cultuador tem a chance e oportunidade de orar em voz alta o que lhe vai no coração?

Marcos Inhauser

segunda-feira, 16 de julho de 2012

ADORAÇÃO


Há tempos venho me preocupando com o empobrecimento da liturgia e culto. O que era algo pensado, elaborado, feito com unidade e sequência lógica, foi, gradativamente, sendo substituído pelo “louvor” (um amontoado de cânticos desconexos na mensagem, escolhidos mais pelo entusiasmo que geram que na mensagem que trazem), a mensagem elaborada, estudada e bem fundamentada foi substituída pelos testemunhos de qualidade duvidável, que produziram o neologismo “tristemunho”.
Unidade litúrgica é algo que se perdeu e se desconhece nos cultos modernos. Teologia é sinônimo de palavrão e a própria liturgia ou é desconhecida ou é rejeitada como sendo algo que restringe a liberdade do Espírito. Os que propugnam que o culto deve ser livre para que se dê o agir do Espírito, não percebem que repetem as mesmas fórmulas domingo após domingo. Confundem excitação com espiritualidade, empolgação com manifestação espiritual.
Parece que se perdeu o conhecimento e o entendimento do culto em Israel, tanto no tabernáculo como templo, onde havia uma família inteira dedicada exclusivamente a isto (a família dos levitas), o culto tinha seus regulamentos (há todo um livro dedicado a este ordenamento, o de Levíticos), os cânticos eram selecionados a dedo e formaram o Saltério. Até a roupa dos sacerdotes tinha seu regulamento!
Falar de liturgia hoje em dia é recuperar a riqueza que se tinha e foi se perdendo. Mostrar a relação entre o culto, a adoração e a cura é algo que, ainda que praticado em muitos templos, não tem sido feito com a devida fundamentação bíblica e teológica. Adoração é uma arte perdida! Muitos dos que se promovem como líderes de adoração não tem a mais mínima noção do que teológica e biblicamente isto significa: curvar-se em homenagem, atribuir valor à divindade. Adoração é falar com Deus e não falar de Deus. Nos cânticos, orações, litanias, confissões falamos a Deus de nossas vidas e vicissitudes. Na mensagem ouvimos a Deus falando e nos dando esperança.
Por que cultuamos? Qual o papel da música e do cântico no culto? Sempre houve instrumentos para ajudar no canto congregacional? A congregação sempre foi permitida a cantar durante os cultos? O que esperamos que aconteça quando as pessoas saem do templo e retornam às suas casas? Pode haver cura durante o culto? Qual o papel dos dons no culto?
Conhecer estes aspectos leva as pessoas a ter melhor clareza na hora de adorar. Perceberão que a adoração não é medida pelo barulho, pelas palmas, pelo volume do som, pela quantidade de lágrimas, pelo brilhantismo dos músicos ou seja lá o que for. A adoração é feita em espírito e em verdade. Ela é uma atitude pessoal de render-se, de inclinar-se diante de Deus, de exaltá-lo, de submeter-se a Ele. Não é tempo de exposição narcísica (tal como se dá em muitos púlpitos que se transformam em palcos de exibicionismo), mas de contrição e humildade.

Marcos Inhauser



terça-feira, 10 de agosto de 2010

COLCHA DE RETALHOS

Lá pelos anos setenta eu batia na tecla de que a música e os cânticos nas igrejas precisavam deixar de lado o ranço anglosaxônico e assumir o sabor dos ritmos brasileiros. Eu não estava só nesta empreitada, haja visto que muitos, como eu, batíamos nesta tecla. Algumas coisas começaram a surgir. Um xote aqui, um samba ali, um baião, etc. Paralelo a isto, havia um outro grupo que sustentava que os cânticos deviam ser os mais bíblicos possíveis, e muitos se dedicaram a musicalizar trechos inteiros dos salmos e outras partes bíblicas. Não há que negar que houve uma forte efervescência e renovação na hinódia. Nestes dias tenho prestado atenção aos cânticos que as igrejas estão cantando e há algumas coisas que me chamam a atenção. A primeira delas é a saturação de cânticos de louvor e adoração, em detrimento de outros temas como confissão, consagração, crescimento espiritual, etc. Um amigo liturgista que toma o Pai Nosso como modelo litúrgico afirma que os cânticos só ficam no “Pai Nosso que estás nos céus” e se esquecem das demais petições da oração dominical. Isto leva a uma religiosidade alienada e alienante. Outro que toma o texto de Isaías ¨, afirma idêntica coisa, dizendo que a parte do “Ai de mim! Pois estou perdido; porque sou um homem de lábios impuros, e habito no meio de um povo de impuros lábios” não entra mais na liturgia das igrejas. O segundo aspecto que me tem chamado a atenção é o uso e abuso de jargões, quase todos tirados de trechos das Escrituras, fazendo com que as letras dos cânticos se tornem em verdadeiras “colchas de retalho” de fragmentos bíblicos. Temos como o poder de Deus, a santidade de Deus, a onipotência, são repetidos ad nausean, sem que tais letras acrescentem absolutamente nada ao que já se tem. Com isto, estes cânticos não traduzem a reflexão de alguém, o teologizar. É como se juntassem frases soltas relacionadas a um mesmo tema e disto fazem a letra “inspirada” de um cântico. A terceira coisa é que o momento dos cânticos domina boa parte do tempo de culto, em detrimento do tempo de ensino da Palavra, com cantores/pregadores de sermonetes que são repetições dos mesmos jargões cantados nos hinos. Com isto o culto, na grande parte das igrejas empobreceu, para não dizer que faliu. Há quantidade de música e pobreza de teologia. Há ministração de louvor sem ministração da Palavra. Depois me perguntam porque muitos já não querem mais ir às igrejas. Marcos Inhauser