Percebo que
há interrogações na cabeça de muita gente, inclusive na minha. Elas dizem
respeito ao judiciário e aos processos tramitados e julgados. A primeira e mais
comum é: a justiça precisa ser tão lenta para ser justa, ou a lentidão pode se
transformar em injustiça? Parece que há certo consenso de que a justiça célere
corre o risco de julgar mal. Os processos sumários estão aí para provar a
porcentagem de erros que foram cometidos quando não se deu devido tempo de
“decantação”. Processos acelerados tem cheiro de injustiça ou de impunidade. Se
há certa sabedoria em trâmites mais pausados, o mesmo não se pode dizer dos que
demoram décadas para serem concluídos. Há inúmeros casos que exemplificam que a
demora na proclamação da sentença gera injustiças, com gente que faleceu sem
nunca ter se beneficiado da causa pleiteada e finalmente ganha. Há outros, criminosos
notórios que se beneficiaram da prescrição da pena, muitas vezes pelo uso das
chicanas protelatórias. Crimes cometidos que tiveram a borracha do apagão, por
causa da demora na proclamação da sentença. Isto é injustiça.
Outra área
que percebo inquietação e perguntas é referente à conceituação da gravidade do
crime. Uma pessoa pega em flagrante roubando um frango em um supermercado é
preso. Um deputado ou secretário de governo, seja municipal, estadual ou
federal, que desviou milhões da merenda escolar, por não ser pego em flagrante,
responde em liberdade. Não seria a gravidade do crime proporcional ao número de
pessoas prejudicadas com os desvios ou crimes cometidos? Um ladrão de galinha
ofende o proprietário dela. Um corrupto que desvia verbas da saúde, educação ou
dos fundos de previdência deveria ter seu crime amplificado na proporção das
pessoas prejudicadas pelos seus atos. Se um assassino da namorada é julgado por
feminicídio, por que o que rouba da saúde, condenando inúmeras pessoas à morte
por falta de recursos no sistema de saúde, não tem sua pena classificada como
genocídio? O primeiro matou uma pessoa. A segunda matou dezenas, talvez
centenas ou milhares.
Causa
inquietação também a facilidade com que, notórias personalidades públicas,
acusadas de desvio, corrupção, peculato, seja lá o que for, tem seus processos
sumariamente encerrados por “falta de provas”. Neste quesito entram os Habeas
Corpus concedidos a granel, mesmo para gente notoriamente corrupta, criminosa, lavadores
de dinheiro, ao ponto de um ministro dizer, ironicamente, que há gabinete no
STF que dá senha para atender aos pedidos.
É justa a
progressão da pena para todos os tipos de crimes? Um pedófilo contumaz deve ter
o mesmo benefício de alguém preso por não pagar a pensão do filho por estar
desempregado? Uma pessoa esclarecida e ciente da gravidade do crime que comete
deveria ter a mesma regalia de alguém que cumpre pena por crime menor?
Se roubou,
desviou recursos públicos, fraudou a previdência de funcionários crédulos
quanto à idoneidade dos gestores, não se deve tirar deles até o último centavo?
Como pode um sujeito que tinha mais de dez milhões de dólares na Suiça, fazer
delação premiada, ser solto e ficar gozando na casa de praia as benesses que o
dinheiro desviado propicia? É pena ter prisão domiciliar em casa comprada e
sustentada com dinheiro do crime? É castigo poder sair o dia todo e só ter que
voltar para casa às 22:00 horas? É castigo ter que usar uma tornozeleira que
pode ser camuflada?
Tenho para
comigo que a justiça brasileira nem sempre é cega e imparcial. Acho mesmo que
muitos juízes e ministros julgam atentando para a capa dos autos, onde aparece
o nome do réu. Muitas vezes fico com a impressão de que, no Brasil, o crime
compensa.
Marcos Inhauser