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quarta-feira, 25 de setembro de 2019

SOMOS UM POÇO QUASE TOTALMENTE ESCURO



Depois de vários anos morando fora do Brasil e muito mais tempo para morando fora da casa de meus pais, voltei para lá para ali estar por alguns dias. À noite, levantei-me para ir ao banheiro e, sem pensar ou tentar lembrar, eu sabia onde estava o interruptor e acendi a lâmpada sem problemas. Em seguida fui à cozinha e fui buscar o interruptor e não o encontrei. Eu sabia onde estava, mas, em função de uma reforma, havia mudado de lado. Eu fiquei perdido.
Por que eu sabia o do banheiro e não o da cozinha. Como eu “sabia” se eu não precisei pensar, rememorar ou tomar uma decisão a respeito? Eu simplesmente sabia pelo hábito de, durante anos, ir ao banheiro e saber onde estava o interruptor.
Lembrei-me disto nestes dias. Dirigindo na Califórnia, estava focado nas regras e sinalizações de trânsito. O “Pare” é “Pare”! Se não brecar o carro e olhar para entrar, é sinal de problemas se algum guarda estiver à espreita. No vermelho se pode dobrar à direita se não houver carros vindo. Vira e mexe eu me atrapalho com o “Pare” e só olho e mantenho a marcha se não houver nada que me impeça de fazê-lo. Por outro lado, no sinal vermelho, é minha tendência parar e esperar que o sinal abra para eu fazer a conversão à direita. Isto se deve a um hábito arraigado de dirigir no Brasil. Mesmo sabendo, não faço!
Dia destes, estava parado em um semáforo, meio absorto e dirigindo “no automático”. Eu esperava o sinal abrir para seguir em frente. Sem prestar atenção ao sinal, vi que os carros que estavam na mão oposta se movimentaram e eu arranquei. Não era a minha vez, mas o sinal autorizava para virar à esquerda. Quase uma trombada. Eu estava na força do hábito, uma vez que, no Brasil, são raríssimos os semáforos de três tempos que me permitem virar à esquerda. Eu “sabia” que assim é aqui, mas este conhecimento não valeu. O força do hábito foi maior. Para dirigir aqui, terei que praticar muitas vezes para que meu hábito arraigado nos “meus ossos” determine um comportamento diferente.
Outra coisa que me intrigou é como eu “sei” que devo falar em inglês com meus netos e o faço de forma automática. Quando estou com hispanos, “sei” que devo falar em espanhol e com os brasileiros em português. Não preciso “decidir”. Sai no automático.
Estas coisas se estendem a outras coisas menos importantes. Não preciso decidir comer de boca fechada, colocar a mão na frente da boca quando vou tossir ou espirrar, não fazer barulho “chupando” a sopa que está na colher, lavar as mãos depois de usar o banheiro, etc. Estes são saberes incorporados pela repetição desde a mais tenra infância, de tal forma que minha identidade é também formada por estes saberes inconscientes, mas que se tornam visíveis e notados quando a eles presto atenção. Mas também sou mais do que conheço a meu respeito e nem sempre sei dar razão a algumas coisas que faço automaticamente. Nem tudo sei explicar e o que explico sobre mim, nem sempre está correto. Sou um enigma para mim mesmo!
As terapias analíticas tentam me fazer descobrir este subsolo da minha (in)consciência. Podem fazer bom trabalho, mas arrancam uma ou duas camadas da escavação de um poço escuro que todos somos. Ainda é vigente o alerta do filósofo: conhece-te a ti mesmo!
Marcos Inhauser