Com certeza você já ouviu ou pronunciou a frase: “estamos
realizando um marco histórico”. Pode também ser uma frase assemelhada a esta.
Fico estarrecido com a facilidade com que as pessoas acham que o que fazem se
tornará fato histórico.
No final do ano um jovem me pressionava para que eu me
posicionasse quanto ao então futuro governo do Bolsonaro e a indicação do Moro
para o Ministério da Justiça. Eu dizia que não se podia fazer avaliações a
priori e que os fatos relacionados à vida política se inserem no campo da
história e que estes devem ser avaliados com algum tempo passado. Não se avalia
fatos em cima dos atos, mas só o tempo pode dar uma dimensão mais clara da sua
importância.
Sem querer atropelar este meu entendimento (que, diga-se de
passagem, não é meu, mas o aprendi com outros), quero chamar a atenção para
alguns fatos recentes e que poderão e deverão ser objeto de análises futuras
porque tem o condão de serem marcos históricos na política brasileira.
Refiro-me à eleição no Senado da República. O Senado sói ser
uma casa mais moderada, sem grandes arroubos, mesmo porque formada por gente
mais velha e experimentada na vida e na política. Há quem diga que é um poder
moderador. No entanto, o que se viu nas duas sessões para a eleição do
presidente foi o teatro do horror, com direito a coisas impensadas para a casa
senatorial.
A começar pela disputa sobre quem tinha o direito de
presidir a sessão. O que estava em jogo eram as pretensões políticas de um
raposa da política e com extensa ficha de denúncias de corrupção. Do outro
lado, um do baixo clero, sem brilho próprio no tempo em que no Senado está,
que, sabe-se lá por que e como, estava candidato, apoiado pelo Ministro da Casa
Civil. Havia nesta postulação interesses vários e temo que nem todos republicanos,
tal como também se dava com o outro lado da disputa.
A atuação histriônica e infantil da senadora Kátia Abreu é
algo digno de nota e que também merecerá avaliação futura, quando os
historiadores se debruçarem para avaliar os fatos. Quais os interesses
motivaram a ex-ministra do PT a se atirar sofregamente sobre os papeis da
presidência?
Neste caldo de fatos inusitados, merecerá também a atenção o
papel do ministro do STF, Toffoli, que, mesmo tendo afirmado em seu discurso de
início do ano judiciário que deveria ser respeitada a autonomia dos poderes,
sem a ingerência de um sobre o outro, profere sentença monocraticamente anulando
a decisão plenária do Senado. Qual a motivação que ele tinha em se negar e
influir em decisão de outro poder? A história dirá.
Os historiadores também deverão se debruçar sobre a fraude
constatada com a presença de votos fora do envelope padrão e com um voto a mais
do esperado e regulamentar. Fraude em votação do Senado? Bem, não é a primeira
vez e há que se lembrar do problema do painel eletrônico, quando Jader Barbalho
e ACM estiveram envolvidos. Quem fez e porque fez, é assunto para
historiadores.
Mais estupefaciente foi a decisão do Renan de, iniciada a
votação e perceber que seria derrotado, retirou a candidatura porque não queria
ter no seu currículo uma derrota acachapante. É o caso do menino dono da bola
que, porque não gostou do gol marcado contra a sua equipe, vai embora e leva a
bola.
Acho que não preciso esperar para dar meu veredicto (ainda
que temerário): há grande chance de termos nos livrado deste câncer da política
fisiológica.
Marcos Inhauser