Transpiração e inspiração são irmãs gêmeas
do processo criativo. Uma descoberta, para ter impacto, deve responder à
algumas condicionantes históricas. Newton, Thomas Edison, Pascal e outros, fizeram
descobertas que não eram totalmente novidade, mas tinham antecedentes nas
pesquisas, descobertas e pensamentos anteriores.
No campo da Reforma religiosa do século
XVI, Lutero também não pode ser apontado como alguém que teve todas as idéias
que o motivaram a posicionar-se da forma como o fez, mas Wycliffe, os
Valdenses, Albingenses, os Cátaros, John Huss, Savanarola são comumente citados
como antecessores da Reforma.
Mais que isto, a “descoberta” de Lutero que
a justificação do pecador se dá pela fé e esta é obra da graça de Deus, só foi
possível porque teve acesso a pensamentos divergentes da teologia oficial e
porque esta descoberta teve ambiente histórico, econômico e político para ser
aceita larga e amplamente como resposta esperada pela população, tendo em
vistas as opressões que sofriam do senhor feudal e da própria igreja através de
suas autoridades. Não fossem dadas estas circunstâncias históricas, Lutero,
Calvino, Zwínglio e outros talvez não teriam sido quem foram.
Estranha-me que, quando se fala em Reforma,
os assim autodenominados reformados, ser esquecem de mencionar uma importante
ala da Reforma, que fez com que ela avançasse para além dos limites que Lutero,
Calvino e Zwínglio avançaram; a Reforma Radical promovida pelos Anabatistas. A
separação da Igreja do Estado, a liberdade de culto e consciência, a opção
livre e espontânea para a escolha da fé, foram feitos que os Anabatistas
trouxeram. Estes postulados hoje são conditio
sine qua non para a vida religiosa, mas há muitos que se esquecem que devem
isto aos radicais.
Entender esta dimensão histórica e as
condicionantes políticas e econômicas do contexto em que tal se deu, é
fundamental. Talvez seja por isto que há quem, hoje em dia, não entendendo
estas implicações, querem reproduzir a Reforma do século XVI em pleno século
21.
Tendo isto em mente se deve entender a
expressão reformada que se tornou bandeira, ainda que na prática quase nada tem
acontecido: Igreja Reformada sempre reformando.
Neste 31 de outubro a igreja reformada e
protestante estará celebrando os 500 anos da Reforma, uma pergunta deve estar
na mente: o que mudou na igreja reformada nestes anos? Não são as igrejas
reformadas réplicas de práticas seculares e, portanto, defasadas no tempo e
inócuas nas respostas aos cidadãos do século 21?
Aqui, me parece, reside uma das questões
que as igrejas reformadas (e também a católica) devem analisar quando avaliam
os problemas pelos quais estão passando, que se traduz na perda de membros e frequência,
na falta de vitalidade e no pouco envolvimento de seus membros: está a igreja
respondendo às questões das pessoas que vivem no mundo atual? Ou está a igreja
repetindo respostas de centenas de anos, que se foram próprias naquele momento,
hoje nada dizem?
Há os que pedem uma nova Reforma. Estariam
eles dispostos a uma ruptura radical com o atual modelo? Não são muitos destes,
pessoas que pedem reforma, mas a querem para reforçar o que já fazem há
séculos?
Marcos Inhauser