O autodidata tem dois fundamentos sobre as quais constrói
seu universo cognitivo: a própria competência e a infalibilidade do
conhecimento adquirido pelo esforço próprio. Para que isto se consolide, ele
afirma outros dois fundamentos derivados: transpiração e dedicação. O seu
saber, fruto da atividade solitária, por não ser confrontado com outros
saberes, tem o DNA de arrogância.
O que “sabe” só ele sabe. Acredita com unhas e dentes que
seu saber é único, que seus posicionamentos são apropriados e que vão resolver
os problemas do mundo. A solidão no processo de incremento cognitivo os leva a
uma atitude de desqualificar todo e qualquer pensamento/saber que não se ajusta
aos seus códigos. Passam a ser “donos-da-verdade”, messias para equacionar e
resolver todos os problemas. Não admitem contestações, críticas ou senões ao
seu saber. Quando há quem os critique, não têm pudores em ser agressivos,
ofensivos e violentos.
Exigem obediência cega aos seus postulados e dogmas (o seu
saber é dogmático no sentido religioso de que é uma verdade auto explicável ou
que se aceita por fé). São messiânicos, pois acreditam que sua capacidade
intelectual de aprender sozinhos é dom de Deus, que sua compreensão do mundo é inspirada,
que suas soluções têm a chancela divina, ainda que se afirmem ateus.
Se duas pessoas interpretam um mesmo texto ou fato de duas
maneiras diferentes, uma delas, certamente, estará errada. Como é quase
impossível o autodidata reconhecer que a sua interpretação é a errada, fica
fácil perceber a anatematização do dissidente. O errado e burro sempre é o
outro!
Eles têm tem resposta para tudo. Por inferências, deduções
enviesadas e conclusões questionáveis, estes autodidatas insistem em encontrar
resposta para tudo, mesmo que tenham a profundidade de um pires e a
consistência de uma gelatina.
Como decorrência dos fundamentos, há a maniqueização da
humanidade: Eu e eles. Eu sou o bom. Eles são os burros, condenados, devassos,
promíscuos, corruptos etc. Por assim crer e agir, os autodidatas têm uma
característica comum: são arrogantes! Não conseguem manter um diálogo, antes
insistem em falar compulsivamente, como para impedir que uma visão diferente
possa aparecer e prevalecer. Diante de uma pergunta para a qual não têm
resposta, ao invés de dizer “não sei” preferem estigmatizar o perguntador como
herege. A ignorância deles é burrice de quem pergunta. Quase sempre terminam
uma tentativa de diálogo afirmando: ou você aceita o que lhe digo ou você vai se
ferrar.
Estamos à volta com um ex-astrólogo que ganhou ares de
oráculo para todas as coisas. Sabe e entende de tudo e se mete a falar de
cesariana a motor à explosão! Tem seus discípulos, tão arrogantes quanto o mestre
das babquices. No caso específico, é verdade, tem uma coletânea de conhecimento
que, sim, são válidos. Podem ajudar a não nos tornar idiotas, ainda que, ao
divinizá-lo, os seguidores se tornam robotizados, repetindo as máximas do guru.
A obediência deve ser cega. Se foi nomeado a algum posto por influência ou
indicação do autodenominado filósofo, a autonomia de ação é zero. Haja vista o
demitido ministro da Educação e as sandices do ministro de Relações Exteriores.
A terra é plana, o mundo foi criado por Deus em sete dias e
há não mais de 6000 anos, os militares representam o atraso, o mundo deve ser
dividido entre nós e eles, o Trump é o maior e melhor presidente que os EUA já
tiveram, o Moro é um gênio, a base de cálculos para a reforma da Previdência
deve ser secreta, não houve ditadura no Brasil, nem mesmo tortura, quem morreu
devia morrer por causa da opção que fez, etc. E salve os gênios autodidatas!
Não conheço um autodidata humilde. Se você conhecer, me
avise.
Marcos Inhauser