Frase corriqueira, especialmente entre os da terceira idade,
é que hoje em dia coisas já não são tão boas como eram antigamente. Muitos há
que querem voltar ao passado, acreditando que nos idos tempos as coisas eram
mais simples, mais puras, mais honestas, mais isto, mais aquilo.
Ocorre que os defensores da superioridade do passado querem
o retorno sem abrir mão das facilidades do presente. Pergunte a um destes
saudosistas se abririam mão dos remédios que o tempo presente oferece
(especialmente os anestésicos), se deixariam de usar o fogão a gás, o chuveiro
elétrico, o micro-ondas ou a televisão a cores. Pergunte a eles se estariam
dispostos a abrir mão do carro, do telefone, do celular, dos e-mails, das cirurgias
laparoscópicas, do frango limpo, da geladeira, freezer e outros aparatos da
modernidade.
Lembro-me de uma senhora, membro da igreja que pastoreei,
que vivia criticando porque estávamos usando o microfone, sistema de som, retroprojetor,
piano, bateria e guitarras nos cultos. Ela encaminhou uma reclamação por
escrito para a Diretoria, que me pediu que fosse à sua residência para
conversar e negociar algumas coisas com ela. Ao chegar à sua casa ela começou a
desfilar o rosário dizendo que o “mundo estava entrando na igreja”, que eu,
como pastor, estava permitindo que as portas do inferno entrassem igreja
adentro. De onde eu estava sentado via parte de sua cozinha com fogão a gás,
micro-ondas, geladeira. Na sala havia um bom equipamento de som e uma televisão
que eu não tinha em minha casa. Perguntei a ela pela sua saúde e ela agradeceu
a Deus pelos médicos e remédios que eles tinham receitado. Assegurei-me que
eram de última geração. Ao final eu propus a ela: a senhora abre mão de todas
as modernidades que há na casa da senhora, volta a usar o fogão a lenha e eu
retiro da igreja o que a senhora achar que é modernidade.
Não preciso dizer qual foi a reação da senhora.
Outra constante tem sido os que querem recriar coisas do
passado. Estes dias vi um comercial de regravação das músicas da Jovem Guarda,
com a músicas que hoje soam cafona. Eu não compraria e acho que muitos também
não o fariam porque não é possível recriar o clima que produziu o movimento. Há
os que querem modelos gerenciais que não mais se coadunam com nossos dias.
Querem modelos educacionais baseados na decoreba, em um mundo caracterizado
pela experimentação e descoberta. Querem o banco de outrora, mas o querem com
os caixas eletrônicos e os extratos online.
O passado só é possível com as coisas do passado. Querer o
passado com as coisas do presente é anacronismo.
Marcos Inhauser