Diz a
mitologia grega que as sereias eram três filhas de Aqueló e Calíope: Parténope,
Leucósia e Lígea, nomes com a ideia de candura, brancura e harmonia. Com o rapto
de Prosérpina, elas foram à terra de Apolo, pediram aos deuses que lhes dessem
asas para que fossem procurar a jovem por toda a terra. Passaram a habitar os rochedos
sobre as margens do mar, entre a ilha de Capri e a costa de Itália. Elas
viveriam enquanto pudessem deter os navegantes na sua viagem, presos ao encanto
dos seus cantos. Marinheiros que se detivessem por causa dos seus cantos se
chocariam contra as pedras. A costa estava branca com os ossos daqueles que
haviam sucumbido.
Ulisses,
em viagem adiante do ponto em que as sereias estavam, foi advertido por Circe.
Tapou com cera os ouvidos, bem assim o de todos os seus marinheiros, e se amarrou
a um mastro. Também proibiu que o soltassem por causa do canto das sereias.
Quando o ouviu, deu ordem para que o soltassem, o que não fizeram. As sereias,
não podendo deter Ulisses, precipitaram-se no mar.
O
mito é atual e serve para entender porque muitas igrejas, sérias ou
aventureiras, vivem se encantando com os cantos das sereias dos modismos
religiosos. Já tenho alguns quilômetros na estrada e vi as mais variadas coisas
que “encantaram e fascinaram” pastores e líderes incautos, assim como também vi
muitos deles se esborracharem nas pedras, enchendo as costas de projetos
malfadados.
Lá
nos “pratrazmente” houve o modismo do batismo do Espírito Santo e a
glossolalia. Fórmulas, métodos e regras haviam para os mais variados gostos,
com ou sem jejum, dando a certeza do batismo e do dom de línguas. Vi muito mais
mistificação que realidade. Conheço diversos exemplos de navios naufragados ou
rompidos ao meio, com a tripulação de cada qual se acusando de falta de
espiritualidade.
Quanta
“igreja” abriu embalada por sonhos mirabolantes e fechou! Há poucos dias soube
de um que pediu ajuda a uma senhora para alugar um salão enorme para abrir uma
igreja. Ele mal sabe cuidar da sua vida e da suas finanças, mas estava embalado
pelo sonho do gigantismo.
Depois
veio a oração no monte, o jejum no monte, o graveto incandescente, o dente de
ouro, o cuspe santo, a benção do riso, o G12, os grupos familiares, os grupos
caseiros, os grupos por afinidade, a igreja em células, as vigílias de 24
horas, as maratonas de leitura bíblica, a teologia da prosperidade, da
libertação, o puritanismo, o neo-calvinismo, a neo-ortodoxia, as bênçãos de
Melquisedec, Arão, Abrão, etc.
Vejo
estas coisas como ondas que encantam aos surfistas religiosos: pegam cada uma
delas e buscam fazer o máximo de manobras e piruetas para ter o aplauso da
plateia.
Falta-lhes
o conselho de Circe a Ulisses: amarre-se ao mastro e não se deixe encantar pelo
canto destas sereias que prometem o milagre da quantidade de gente nos cultos,
do aumento da arrecadação, do programa na rádio ou televisão, da fama.
O
mastro para se amarrar já existe há séculos. Não só a Bíblia, mas a
interpretação dela feita por reconhecidos e sérios estudiosos, que contam com o
respaldo de milhares de pessoas e igrejas sérias ao redor do mundo. Não são as
novidades ou os achismos que vão dar nova vida às igrejas. Não são os modelos e
métodos de gente que, agora, acha que descobriu a Pedra do Santo Graal e que
vão colocar mais gente nos templos. São cantos de sereia! Coisa que fascina e
que leva à tragédia.
Marcos
Inhauser