Virou febre. Ao invés de escrever, de expressar sentimentos,
de pensar, refletir e se posicionar, busca-se memes para passar adiante algo com
o qual a pessoa concorda. Ele é uma unidade de informação que tem a habilidade
de se multiplicar, através das ideias e informações que se propagam de
indivíduo para indivíduo. Na internet, ele tem a capacidade de viralizar.
O termo foi cunhado por Richard Dawkins, em 1976, em seu
livro “O Gene Egoísta” e a palavra vem do grego mimeme que tem o sentido de imitação, e podem ser ideias, músicas,
sons, desenhos, modas, valores ou qualquer coisa que possa ser apreendida com
facilidade. É uma forma simplificada de informação, que não exige muito do
emissor e quase nada do receptor.
A narrativa bíblica coloca a comunicação como ato primeiro
do ser humano. Assim que Adão viu a Eva disse: é carne da minha carne, osso dos
meus ossos. O interessante é que, antes disto, de acordo com a segunda
narrativa da criação, o homem havia sido solicitado a dar nomes aos animais e,
ao final do processo, Deus afirma não haver entre eles quem estivesse à sua
altura. Isto se deu porque houve monólogo e não diálogo. Era um “eu” que falava
e não havia um “tu” para responder à altura. Com a criação da companheira, Eva,
se criou o diálogo, elemento fundante das relações e construção da sociedade.
Quando o diálogo se esvazia e cede a outras formas de
interação, paga-se alto preço social. É o diálogo que constrói a convivência,
que estabelece bases para a convivência na diversidade, que incrementa o
espírito da tolerância. O esvaziamento do diálogo é, em última análise, o empobrecimento
do ser humano. Ele foi feito para se comunicar, para pensar, refletir, trabalhar
conceitos, expressar sentimentos, negociar, buscar consenso, ver no outro a “carne
da sua carne e o osso dos seus ossos”. Ao empobrecer o diálogo, empobrece-se o
próximo e, por consequência, a si próprio.
Quando o diálogo cede espaço aos memes, quando a conversa se
resume em uma imagem ou símbolo (ainda que eles façam parte da comunicação), a
palavra é humilhada. Não se fala, se desenha. Não se expressa sentimentos,
manda-se emojis.
O diálogo pressupõe o falar e o ouvir na mesma intensidade e
qualidade. Quando alguém se comunica por memes e emojis, há emissão da
comunicação, há recepção da mensagem pelo outro, mas a coisa para aí ou, na
melhor das hipóteses, outro meme ou emoji é devolvido. É uma conversa de tartamudos!
O meme é a humilhação da palavra (tomo o termo emprestado do
Jacques Ellul). Ela é jogada fora como elemento essencial da comunicação. Seu
poder de articular ideias, de expressar sentimentos, de trocar conhecimento, de
ensinar, de cativar, de seduzir é trocado pela forma mais básica de
comunicação: desenhos. Esta era a forma primitiva de se comunicar via hieróglifos,
ideogramas, gravuras. É o retorno à era das cavernas.
Isto talvez explique o nível de violência que as redes
sociais têm revelado. Pessoas que não conseguem ouvir o diferente, que só sabem
usar meia dúzia de palavras ofensivas, que não sabem ouvir, têm dificuldades em
articular três ou mais frases encadeadas pela lógica. Não cultuaram o hábito de
ler e, por isto, não sabem escrever. Não lerão esta coluna até o fim, mas vão
me espinafrar com afirmações ridículas.
Marcos Inhauser