Com algumas exceções, por que elas sempre existem, houve certo
consenso em recriminar mensagens, postagens, memes, teorias de conspiração e
manifestações animosas quando da enfermidade da sra. Marisa Letícia. Causou
indignação e muita gente de bem, independentemente da predileção ou partido
político que tivesse censurou as manifestações. Também vi manifestações de
religiosos condenando tais postagens e afirmando tratar-se de comportamento
execrável.
Nos mesmos dias em que isto se dava, por uma prática que
adotamos na Igreja da Irmandade de estudar um livro da Bíblia em sequência e
lermos os Salmos também em sua sequência numérica, estive lendo alguns salmos
entre o 40 e o 48 e fiquei pasmo com algumas afirmações neles constante.
Pesquisei um pouco mais e cito aqui alguns trechos dos salmos: “Sobrevenha-lhes
inesperadamente a destruição, e prenda-os o laço que ocultaram; caiam eles
nessa mesma destruição”” (35:8); “Os ímpios
têm puxado da espada e têm entesado o arco, para derrubarem o poder e
necessitado, e para matarem os que são retos no seu caminho. Mas a sua
espada lhes entrará no coração, e os seus arcos quebrados. Mais vale o pouco
que o justo tem, do que as riquezas de muitos ímpios. Pois os braços dos ímpios
serão quebrados” (37:14-17); “Deus meu! pois tu feres no queixo todos os
meus inimigos;
quebras os dentes aos ímpios”. (3:7); “Deus afiará
a sua espada; armado e teso está o seu arco; já preparou armas mortíferas,
fazendo suas setas inflamadas. Eis que o mau está com dores de perversidade;
concedeu a malvadez, e dará à luz a falsidade. Abre uma cova, aprofundando-a, e
cai na cova que fez. A sua malvadez recairá sobre a sua cabeça, e a sua
violência descerá sobre o seu crânio.” (7:12-16); “Ah! filha
de Babilônia, devastadora; feliz aquele que te retribuir consoante nos fizeste
a nós; feliz aquele que pegar em teus pequeninos e der com eles nas pedra” (137:8-9); “Ó Deus, quebra-lhes os dentes na sua boca;
arranca, Senhor, os caninos aos filhos dos leões. Sumam-se como águas que se
escoam; sejam pisados e murcham como a relva macia. Sejam como a lesma que
se derrete e se vai; como o aborto de mulher, que nunca viu o sol. Que ele
arrebate os espinheiros antes que cheguem a aquecer as vossas panelas, assim os
verdes, como os que estão ardendo. O justo se alegrará quando vir a vingança;
lavará os seus pés no sangue do ímpio”. (58:6-7)
Diante destes textos fico com a
pergunta: é justo regozijar-se com a desgraça do inimigo ou daqueles que nos
causaram problemas? Quando vejo pessoas que defendem a ferro e fogo e
inerrância e infalibilidade das Escrituras e que tudo nela é Palavra de Deus, e
ao mesmo recriminam o que foi dito da Marisa Letícia, acho que há profunda
incoerência, pois o salmista nos ensina a fazê-lo. Se os Salmos são Palavra de
Deus e regra de fé e prática, quem ironizou, zombou ou fez chacota da
enfermidade da Marisa Letícia, teve comportamento bíblico. Ou seriam estes
textos exemplos de comportamentos humanos e que se tornaram clássicos porque
muita gente se vê neles e no desejo de ver a ruína do malfeitor? Não faz parte
do DNA humano se alegrar com a desgraça do inimigo?
No que pese o fato de ser isto
algo muito humano, não significa que é aceitável, nem mesmo nos salmistas.
Devemos condenar suas palavras e desejos, da mesma forma como criticamos quem
postou as mensagens. E acima de tudo, devemos condenar em nós mesmos os desejos
de vingança e prazer na desgraça alheia.
Marcos Inhauser