Na cultura grega ser considerado sábio era o ápice. Tal
reconhecimento não era fruto de autoproclamação, auto reconhecimento ou
petulância de quem assim se arvorasse. Ser sábio era o fruto de longa caminhada
no saber e no discernimento das coisas. O sujeito inteligente, ou o que muito
sabe, não, necessariamente, era sábio. Por outro lado, o sábio, não
necessariamente, precisava ser dotado de acúmulo de saber, mas de percepção
clara das coisas, dos fatos, das pessoas.
Trazendo para nossos dias, o sábio não é quem tem um PhD em
algo, ou um título de Livre Docência, que tenha escrito muita coisa ou livros.
O sábio pode ser alguém que, não tendo caminhado as trilhas do saber acadêmico,
entende das coisas, normalmente as comezinhas. Não é um autodidata (que se
caracterizam pela arrogância), mas alguém que aprendeu no convívio social, nas
interações humanas e nas comunicações ecléticas. No dizer de Gramsci, acho, é o
intelectual orgânico.
Na cultura hebraica e na semita, o ápice era ser profeta, no
sentido de ser uma pessoa inserida na comunidade e que se compromete com a
história. Tanto no sentido hebraico como no grego, a palavra que fala do
profeta, não é a do vidente. Ainda que possa haver textos onde a conotação
aparece, considerada no seu strictu sensu o profeta é o “que fala da
parte de”, é o mensageiro, a pessoa dos recados. Daí porque ocorre com
frequência a expressão “veio a mim a palavra do Senhor dizendo”, “vai e dize ao
meu povo”, “assim disse o Senhor”
No ambiente hebraico, o profeta era alguém da comunidade,
que vivia os dilemas sociais e econômicos dela, e se comprometia com a denúncia
dos erros e pecados, especialmente dos dirigentes e governantes. O profeta
tinha um compromisso radical com os pobres, viúvas, órfãos, estrangeiros,
sujeitos prediletos dos exploradores e governantes injustos. Daí porque, no
mais das vezes, a palavra profética é a da denúncia, do juízo sobre esta casta
exploradora, sempre em favor dos menos favorecidos. A pregação profética da
esperança futura não tem nada de visão, antecipação ou premonição, mas é o
desejo genuíno de que haja mudanças na situação. Mais que uma revelação
antecipatória é uma aspiração sublimatória do momento presente pela esperança
futura.
Colocadas e explicitadas estas coisas, não preciso de muito
espaço para afirmar que a relação profeta/reis/governantes/pseudo sacerdotes é
espúria. O profeta não se assenta com os escarnecedores, com os exploradores,
com os que praticam injustiças. Ele fica de fora destes círculos, dos palácios
e só se dirige a eles para denunciar seus pecados e injustiças. Ele também se
dirige aos explorados para dizer: vai haver troco, vai haver novos tempos,
aguenta que Deus vai virar o jogo! O casamento do profeta com o governante é
adultério e promiscuidade. Pior que isto é o governante se apropriar dos
símbolos e discursos da religião, para passar a imagem de que seu governo é
ungido e que ele faz a vontade de Deus. Quer parecer sábio ao dizer quem é
terrivelmente evangélico.
Devemos lembrar que algumas das piores ditaduras que a
humanidade conhece e viveu foram ditaduras religiosas, seja em nome de Javé, de
Alá, ou outro deus qualquer. O presidente que se acha messias é um risco aos
governados. Assim foram Pinochet, Hitler, para citar dois dos mais recentes. O
messianismo que acreditavam e sustentavam validava as coisas que faziam. Uma
coisa é ter metas no governo, outra é ver isto como missão com tempero religioso
e discurso pseudoteológico.
Também acintoso é o governante que vai aos templos e se
arvora pregador e recebe benção de sacerdotes que estão sub judice.
Marcos Inhauser
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