Quase analfabeto, tinha três habilidades que eu admirava. A
capacidade de ficar de cócoras, sentado sobre os pés, por longos períodos de
tempo. Era uma posição fetal, que ele gostava de ter. Acocorado, pegava um
pedaço de madeira e ficava a rabiscar coisas no chão de terra e a conversar. A
outra era seu vocabulário peculiar. Tinha dificuldade em pronunciar palavras
que tivessem uma consoante muda (objeto virava bejeto, opção virava opição,
psicologia era pronunciada como pissicologia, etc.). Admirava também sua
capacidade em fazer diagnósticos, quase sempre simplistas e reducionistas, mas
pronunciado com a certeza dos deuses.
Quando ouvia algo que lhe parecia estranho ou fora da
normalidade, lá vinha a sentença: “isto é um beçurdo”.
Lembrei dele na quarta-feira, quando do jogo no Pacaembú,
com os portões fechados. Se ele tivesse ouvido ou visto a coisa, teria
proferido a sentença. E no que pese a sua incapacidade de aprofundar na análise
dos fatos, devo dizer que eu concordaria com ele.
É um beçurdo que o Corinthians e sua torcida tenham sido
penalizados por algo que, no frigir dos ovos, também é culpa do time de Oruru e
da polícia boliviana, que não teve condições de garantir a segurança no
estádio.
É um beçurdo que, mesmo tendo identificado dois autores
(outro beçurdo, porque se sabe que só um é o responsável pelo sinalizador),
toda uma torcida que não esteve no estádio de Oruru tenha sido penalizada.
É um beçurdo que, mesmo com a confissão de um adolescente
(que pode vir a se comprovar ser outro beçurdo para livrar a cara dos reais
culpados), um prejuízo de mais de dois milhões tenha sido importo ao time
brasileiro.
É um beçurdo que uma instituição não brasileira tenha o
poder de cercear a liberdade de assistir a um jogo, com ingressos vendidos e
jogo realizado em solo nacional.
É um beçurdo que os quatro que entraram na justiça e
ganharam o direito de entrar, tenham sido aconselhados a não fazer valer seu
direito, porque isto poderia ser mal interpretado pela Conmebol e que
complicaria a vida do time brasileiro.
É um beçurdo que a Conmebol só agora tenha instituído uma
comissão para analisar os atos de violência que ocorrem na Libertadores, onde
policiais com escudo devem proteger quem vai bater um escanteio, radio, pilhas
e outros “bejetos” sejam lançados em campo, sem que haja alguma punição.
É um beçurdo que não se possa tomar ações legais contra os
descalabros das entidades de futebol. Até hoje ninguém me explicou
convincentemente porque a Fifa vem ao Brasil e exige a mudança das regras aqui
vigentes e libera a bebida nos estádios durante a Copa, que um executivo da
instituição diga o que disse o sr. Volke, que exija coisas e condições como se
fosse um governo paralelo.
É um beçurdo que eu gaste duas semanas e duas colunas para
escrever sobre este assunto.
Espero que o leitor não considere um beçurdo ter lido isto.
Marcos Inhauser
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