Não é a
primeira vez que ouço sermão ou leio textos que trabalham sobre o tema do amor
na Bíblia e que o mesmo tipo de má interpretação acontece. Refiro-me ao
clássico texto do “amarás ao Senhor teu Deus sobre todas as coisas e ao teu próximo
como a ti mesmo”. O erro está no fato, costumeiramente praticado, de ver no
texto três mandamentos: amar a Deus, ao próximo e a mim mesmo, como se fossem
três coisas distintas e que se pode observar por parcela ou na integralidade
segundo uma escala de valores.
Há não
muito tempo estive em uma igreja como visitante e outra vez ouvi o descalabro
desta erromenêutica. Afirmou o “pregador” que Jesus nos ensinou três coisas
essenciais à vida cristã e que as três devem ser observadas em ordem. Primeiro,
disse ele, temos que amar a Deus. Se não O amamos antes de tudo e sobre tudo,
não estamos habilitados a amar a nós mesmos e ao próximo. Só depois de cumprido
este mandamento estaremos aptos a passar para o cumprimento do segundo
mandamento. Afirmou ainda que é possível amar a Deus sobre todas as coisas e
não amar ao próximo e a mim mesmo. Seria uma obediência parcial, mas válida.
Neste
momento, em mais uma prática da erromenêutica e da má fé, inverteu a ordem do
texto e disse que, em segundo lugar, devemos amar a nós mesmos. Como condição
para isto, devemos estar conscientes de que Deus nos fez como somos, devemos
amá-lo sobre todas as coisas e entender que, criaturas de Deus feitos à sua
imagem e semelhança, devemos nos amar.
Quando
cumprimos a primeira e segunda partes do tríplice mandamento, podemos e estamos
habilitados para amar ao próximo. Não podemos amar ao outro se não nos amamos e
não conseguimos nos amar se não amamos a Deus.
Não
preciso dizer que a esta altura eu já estava na ponta dos pés para sair dali.
Mas aguentei firme e ouvi a pérola: “amar ao próximo é o último dos mandamentos
essenciais da vida cristã. É possível ser verdadeiro cristão cumprindo os dois
primeiros”.
Pasma-me
a negligência teológica e prática das igrejas no amor ao próximo. Se no Antigo
Testamento os dízimos trazidos à Casa do Senhor eram para que mantimento
houvesse para suprir aos necessitados, hoje a ênfase é na compra dos
equipamentos de som, no ar condicionado, no pagamrntos das horas de televisão
ou rádio, na reforma, na suntuosidade e pouco ou nada se faz pelo necessitado.
Algumas montam uma cesta básica por mês e acham que já fizeram a sua parte
social.
O
mandamento é único e indivisível. Não há como amar a Deus sem me amar e ao
mesmo tempo amar ao próximo. Se amo ao próximo e por ele faço o que precisa ser
feito, passa a amar-me e amo a Deus que o fez a mim também. Como posso amar a
Deus a quem não vejo se não amo meu irmão a quem vejo, pergunta o escrito da
carta joanina. Colocar uma hierarquia na obediência do mandamento, fazer do
único mandamento um picadinho de mandamentos, estabelecer prioridades no amor,
é erromenêutica, coisa de analfabeto bíblico e teológico.
Marcos
Inhauser
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