Ela tinha certa capacidade
financeira. Dona de um próspero negócio e metida a madame, frequentava uma das
igrejas que pastoreei. Cada vez que tínhamos algum evento na igreja, fosse ele
hospedando alguma reunião ou congresso, ou mesmo para angariar fundos para
alguma instituição social, as mulheres e homens da igreja se cotizavam para ajudar.
Uma vez era um churrasco beneficente, outra um jantar para angariar fundos, ou
uma simples confraternização entre membros da igreja. Todos se cotizavam e se
dispunham, menos a madame. Ela vinha para mim e dizia: arruma alguém para fazer
em meu lugar que eu pago.
Um dia eu estava meio
atravessado e disse a ela que não queria gente que pagasse a outros para amar
no lugar dela. Ou ela viria ou então não precisávamos do seu amor terceirizado.
Ela nunca mais apareceu na igreja.
No tempo em que estive indo
quase diariamente à casa de repouso para visitar meu sogro e depois meu pai,
revi esta cena muitas vezes. Vi nestas casas gente que ali foi colocada pelos
filhos que nunca voltaram para fazer uma visita ao pai ou mãe. Era gente que
acreditava que pagando a mensalidade já cumpriam com sua missão. Ouvia história
de um homem que foi colocado, pagaram três meses adiantados e nunca mais deram
o ar da graça, nem para pagar o restante, nem para levar o pai a outro local.
Um deles me contou que tinha seis “tranqueiras na família” e que só uma
sobrinha era quem tinha algum cuidado com ele.
É mais fácil terceirizar que
sentar-se ao lado e ouvir a mesma história quatro ou cinco vezes em uma hora de
convivência. É mais fácil saber que há alguém para cuidar e que se paga para
fazer isto.
É verdade que há situações
em que a situação de saúde da pessoa exige cuidados especiais e locais
apropriados. No entanto, isto não exime os familiares de visitar, se fazer
presente, ouvir as histórias.
Há gente que não demonstra
amor nas relações pessoais, mas contribui com organizações que representam
causas nobres, e estas então amam por elas e assim se sentem isentas de culpa.
Apesar de ser nosso dever
contribuir para estas organizações que se propõem a aliviar miséria e
sofrimentos humanos, estamos cometendo grave erro se acreditamos que estas
contribuições nos livram de nossas responsabilidades pessoais de demonstrar
amor ao próximo.
Um filho ou filha, que
recebeu dos pais os cuidados na infância, que noites mal dormidas por eles
foram por causa do cuidado que deram em momentos de enfermidade, não tem o
direito de se ausentar ou mesmo de pagar para que outros amem no seu lugar.
O mesmo se pode dizer de
pais que contratam babás para amar em seus lugares, ou mandam para a escolinhas
para que lá sejam abraçadas e reconhecidas.
O amor ao próximo é
intransferível. Não há como passar procuração. É uma responsabilidade
individual, intransferível, inalienável. Amar é altamente recompensador e tem a
capacidade de dar significado à vida.
Marcos Inhauser
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