Há coisas que, em função das circunstâncias, o indivíduo não pode deixar de fazer. A impossibilidade de não fazer decorre da própria natureza humana que, por sua herança arquetípica, por mais que tenha a volição direcionada em outro sentido, se vê compelido a fazê-lo.
Assim é o ato
de sobrevivência. Diante da iminência da morte, o ser humano se dispõe a matar
para se safar. Diante da fome, rouba o que lhe é necessário para viver. Em
ambos os casos há consenso quase universal de que o praticante de tais atos não
deve ser penalizado, uma vez que foram atos necessários.
Por outro
lado, o ser humano, histórico e historicamente condicionado que é, opera no
campo dos acontecimentos naturais e nos fatos históricos. Não existe diferença
entre um e outro, uma vez que os atos naturais, ao receber a ação concomitante
do ser humano, se torna histórico, porque é na relação entre fatos naturais e
ação humana que se dá a história.
Neste
sentido, há no histórico uma tensão entre o ontem que vai se esvaziando, mas
querendo permanecer e o amanhã que quer se tornar, vir-a-ser. É na dimensão
entre o ontem e o hoje que se dá a pregação e a profecia (no sentido de
"falar da parte de" e "nunca no sentido de predizer", a
pré-fecia). A pré-fecia tem um quê de mítico, na medida em que quer garantir o
vir-a-ser pela enunciação da palavra. Como, na quase totalidade das vezes, os
pré-fetas anunciam o futuro garantindo a ação de Deus, assumem uma versão
mitológica na sua prédica, porque o vir-a-ser é ação dos deuses na história,
elemento característico dos mitos.
Esta
característica da pré-fecia deve ser "demitizada", porque tende a ser
a-histórica. Antes, ao invés de massificar e alienar consciências, a profecia
deve formar a consciência coletiva para a ação história significativa no
momento chamado hoje. Para tanto há que se ter uma visão mais universal e não
provincial ou pequena dos atos de Deus, tão característico das pré-fecias. O
profeta fala de uma história global, não de coisas particulares e individuais.
Há ainda que
lembrar-se que, no processo histórico, os vencedores de sistemas iníquos e
exploradores, por terem agido histórica e conscienciosamente, lograram êxito
nas suas empreitadas. Mas esta mesma história nos ensina que, ao galgar o poder,
acabam reproduzindo as técnicas e injustiças do regime que combateram. Tanto no
antigo como no novo regime, a história, entendida como falar e ter respostas,
chamar e ser ouvido, não existe porque os gritos do povo são abafados. O
profeta vem então fazer recordar, engajar o povo criando consciência e sempre
lutando para que o status quo seja mudado.
Assim é o que
vivemos. Tanto o PT como o atual governo, tiveram e tem no seu discurso o
combate à corrupção, se apresentaram e apresentam e como voz do povo. Galgados
ao poder, se transformaram e esquivam-se de dar respostas às questões importantes
e interessantes e fizeram ou fazem coisas inexplicáveis em função do prometido
em suas campanhas. Parece que o Diploma Eleitoral muda o DNA do candidato,
agora diplomado. Isto aconteceu com a legião de deputados e senadores de
primeira eleição. Se esperava que fossem mudar as coisas no Congresso e o que
se vê é a continuidade daquilo que todos abominamos.
Marcos
Inhauser
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