Normalmente experimentamos sentimento de culpa quando reconhecemos que somos a causa do infortúnio de outra pessoa. A teoria intrapsíquica afirma que as regras e valores morais internos que aprendemos e introjetamos desde a infância, quando violados por nós, nos leva a um sentimento de culpa. A culpa, então, é o resultado emocional de um conflito entre nossas regras e valores e nossos comportamentos ou omissões. Nessa visão, a culpa diz respeito ao sentimento de ter desobedecido aos próprios valores morais internos, mesmo sem agir ou compartilhar o sentimento com os outros. Isso pode causar uma expectativa de punição, expiação ou pedido de desculpas. A pessoa que se sente culpada tem a sensação de ser uma “pessoa má”.
Percebe-se que o sentimento de culpa se dá em razão de ações
positivas cometidas, intencionais ou não, ou de ações omissivas, também
intencionais ou não. A pessoa se sente culpada pelo que fez ou deixou de fazer
e este sentimento o leva a várias opções possíveis, no sentido de amainar o
sentimento que passa a corroê-lo.
O primeiro deles é reconhecer que errou ao fazer ou deixar
de fazer e assumir este erro junto à pessoa afetada. Se isto já não mais é
possível, pelo falecimento ou impossibilidade de encontrá-la, tal
reconhecimento pode ser feito junto a terceiras pessoas, um confessor, por
exemplo.
O segundo comportamento é encontrar motivos para o seu ato
ou para a sua omissão. A pessoa buscará um sem-fim de razões para mostrar que o
erro não foi intencional ou que não teve a dimensão que se que dar. É um
mecanismo de fuga à responsabilidade.
O terceiro é culpar outros pelo seu erro positivo ou
omissivo. Ele não é culpado porque alguém o fez errar ou se omitir, alguém não
o informou, ou alguém fez algo que o impediu de agir corretamente. Santo
Agostinho, em seu livro “Confissões” tem esta atitude ao dizer que “foi forçado
a pecar”.
O quarto é quando a pessoa deixou de fazer ou fez algo e
outra pessoa assumiu o papel e fez o que ela deveria ter feito. Há nisto um
duplo sentimento: o do erro ao ter falhado e o da acusação sub-reptícia de
alguém que assumiu o seu lugar fazendo o que ele não fez. A dimensão da culpa
aliada ao sentimento de estar sendo acusado pela prontidão do outro em fazer o
que se esperava que ele fizesse, leva a pessoa a denegrir as competências ou
habilidades de quem o substituiu.
O mecanismo de achincalhar a pessoa que fez o que ele não
fez é cruel e perde o sentido da ética e ultrapassa os limites da civilidade.
Para não se sentir culpado e acusado, passa a acusar quem cobriu sua falha com
acusações não comprovadas, com tentativas de diminuição das capacidades,
habilidades e até mesmo desmerecendo os logros acadêmicos ou profissionais que
a pessoa que o substituiu tem. A culpa passa a ser agressiva, dirigida a quem
fez o que o agressor não fez.
Na teoria interpessoal, por sua vez, a culpa resulta da
consciência de ter causado um dano injustificável a alguém, não ter se comportado
de forma altruísta ou amorosa, resultando em comportamento egoísta, fruto da falta
de empatia e compaixão, mesmo se tratando de pessoa supostamente amada. Aqui, o
gatilho é a presença de uma pessoa em sofrimento ou necessidade, sendo
injustamente penalizada pelos seus atos, não ajudando, desprezando ou,
simplesmente, ignorando.
Aqui entra o auto-engano: a pessoa má não é quem deveria ser
e não amou, mas quem no seu lugar amou e cuidou!
Marcos Inhauser
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