Michel Foucault, em uma de suas últimas aulas (01/08/94),
fez comentários sobre o exercício da retórica e a parresia (que é o falar a verdade, sem esconder nada). Para ele,
“na retórica não há vínculo entre aquele que fala e o que ele diz, mas a
retórica tem por efeito estabelecer um vínculo obrigatório entre a coisa dita e
aquele ou aqueles a quem ela é endereçada ... está no exato oposto da parresia”.
A parresia, por
sua vez” estabelece entre aquele que fala e o que diz um vínculo forte,
necessário, constitutivo, ... (que) se abre sob a forma de risco ... entre
aquele que fala e aquele a quem ele se endereça. ... aquele a quem ele se
endereça sempre pode não acolher o que lhe é dito. Ele pode (sentir-se)
ofendido, pode rejeitar o que lhe dizem e pode, finalmente, punir ou vingar-se
daquele que lhe disse a verdade”. É o falar sem dissimular.
Voltei a ler estes textos do Foucault em função de coisas
acontecidas no passado recente e no presente da política brasileira. Não posso
esperar de Foucault uma digressão sobre o significado e as consequências das
Fake News, mesmo porque, nada data em deu suas últimas aulas, tal conceito
ainda não havia sido elaborado. No que pese a isto, não posso desconsiderar que
o termo é mais novo, mas o uso de meias verdade ou mentiras propositais sempre
fizeram parte da política. Parece-me que a palavra “demagogia” está muito
próxima ao conceito de retórica de Foucault, e é irmã gêmea de Fake News.
No anedotário político brasileiro há inúmeros exemplos de
demagogia. Conta-se que Ademar de Barros subia ao palanque e, antes de começar
a falar, tirava do bolso um sanduíche de mortadela, para que as pessoas o
considerassem uma pessoa do povo. Também se conta que, quando suava em seus
discursos, tirava do bolso um lenço e, propositalmente, caía um terço que ele o
apanhava no chão e, com toda a reverência, o beijava e o recolocava no bolso.
Assim fazia para mostrar que era católico fervoroso. Jânio Quadros afirmava que
a Coca-Cola era um veneno e que iria fechar a fábrica e proibir o comercio do
refrigerante. Nunca o fez e se sabia que era bravata eleitoreira.
A onda de Fake News, propiciada pela proliferação das redes
sociais, onde pessoas reais, perfis falsos e robôs disseminam notícias e
inverdades, é algo que está entre o demagógico e a retórica no sentido proposto
por Foucault: sem nenhuma relação entre o que “envia as mensagens” e o que
“recebe as mensagens”, sem conexão com a verdade dos fatos. Um paradoxo da
problemática é que quem condena as Fake News, se vale delas para conseguir seus
propósitos, haja visto os recentes episódios, tanto na política brasileira como
na estado-unidense.
Exemplo claro desta retórica dissimuladora são os discursos
do autocrata Maduro, diagnosticando como ataque do imperialismo ianque o que se
sabe é incompetência do falastrão.
Tenho para comigo que os falastrões e Instagramers
poliativos (para usar um neologismo para me referir às novas formas de
falastrões midiáticos) são mais tendentes a ser retóricos e demagógicos, quando
não fabricantes e disseminadores de inverdades ou meia verdades. Exemplo disto
foi a controvérsia com o Bebiano, se falou ou não com o pai, quando este estava
no hospital e mais recentemente a da jornalista do Estadão.
A parresia tem um
preço e parece que os políticos não têm disposição de pagar. Quem paga o pato é
o povo que engole meias verdade como verdade final.
Marcos Inhauser
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