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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

SOMOS QUANTIDADE OU QUALIDADE?



Há anos venho me interessando e me inquietando com a divinização da quantidade, que recebe nomes variados dependendo do contexto ao qual se aplique. Ora chamam de produtividade, ora de eficiência, ora de maximização. No campo das igrejas chamam de crescimento, megaigrejas ou sucesso.
No início dos anos 80, tendo participado com uma conferência com Peter Wagner (o divulgador do crescimento exponencial das igrejas via aplicação de fórmulas “descobertas” pelo movimento do Church Growth), escrevi um artigo atacando as suas posições e dizendo tratar-se de um pragmatismo maquiavélico: tudo o que funciona é moralmente válido. Se a igreja cresce, não importa o que se faça, está validado pelo resultado. No campo empresarial a mesma regra se tem aplicado. Troca-se o funcionário experiente pelo aprendiz, porque este custa bem menos. Reduz-se o número de empregados e se sobrecarrega os que ficam, para que a produtividade per capita seja incrementada. Tudo vale, até contratar prostitutas para um treinamento de desinibição, como ocorreu com uma cervejaria brasileira, devidamente penalizada por tal prática.
Há, no entanto, um esporte favorito neste universo: acusar os líderes e as corporações de serem desumanas. Ocorre que o operário e o religioso médios não querem pensar. O trabalhador médio quer um trabalho no qual não quer gastar muita energia e, de preferência, que seja repetitivo para que não precise pensar. O religioso médio quer um padre, pastor, bispo ou apóstolo que diga sempre as mesmas coisas, porque o que já se sabe não obriga a pensar.
Pensar dói!
Dói porque obriga a rever o que se sabe, a reformular conceitos, aventurar-se no desconhecido, assumir riscos, acertar e errar. Pensar leva a trocar as antigas certezas por novas suspeitas (copiei o Zé Lima aqui). E porque não pensam, ouvem absurdos e batem palmas. A cada pouco recebo vídeos de “consultores” e “pregadores”, onde, tal como os vídeos de jogadores que só tem jogadas boas, trazem suas “melhores contribuições”. Exceções à parte, é um amontoado de abobrinhas. São “abobrinhas virais” porque se esparramam pelas redes sociais qual praga da zika, embotando cérebros e produzindo microcéfalos.
Há os especialistas em fazer rir. Acham que contar piadas instruem. Há os palestrantes de motivação que são como carreira de cocaína: dão uma animada temporária e depois o down. Se se pergunta alguns dias depois a quem participa destes eventos, eles vão se recordar da piada, mas nada do conceito e sua aplicabilidade.
Nisto, estranha-me que as igrejas, notadamente as evangélicas, insistam em um modelo falido: a centralidade na pregação. Por mais de uma vez já fiz isto e desafio os que me leem a também fazer: pergunte, depois de alguns dias, aos frequentadores de cultos ou missas, aos participantes destes treinamentos pasteurizados, o que foi que se ensinou na oportunidade tal. Receber-se-á afirmações genéricas e muitos dirão que não se lembram. E não se lembram porque não lhes afetou, não houve a participação do ouvinte na elaboração ou na construção do saber. Como diria Paulo Freire, é uma educação bancária: faz-se um depósito de X palavras no cérebro alheio, cuja retirada é raramente feita. O conhecimento recebido sem a participação do receptor é potencialmente menor no seu poder de mudança que o conhecimento produzido em equipe.
Logo, não considero relevante quantos me leem ou me ouvem, mas a qualidade de transformações que provoco.
Marcos Inhauser

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